CARTA DE BRAGA – “do caminho da decadência” por António Oliveira

Bem longe da vista dos votantes europeus, a política de externalização, é a responsável por dezenas de milhares de mortos, escravizados e torturados na teia das rotas de emigração africana’, o título de um grande jornal europeu, no passado 15 de Maio.

Referia maioritariamente os refugiados eritreus, apanhados e escravizados por traficantes na Líbia, a fim de forçar a família a pagar os resgates pela libertação, mas, se escaparem e chegarem ao Mediterrâneo, correm o risco de serem apanhados e mandados de volta para a Líbia ou morrerem no mar.

Esta situação é descrita pela professora Mirjam van Reisen, no livro ensaio saído naquela semana, ‘Human Trafficking Trajectories to Libya’. Durante o período do estudo que o motivou (2017-2021), estima-se que, pelo menos duzentos mil refugiados, homens, mulheres e crianças, foram vítimas de tráfico de seres humanos para obter tal resgate na Líbia.

Um pouco mais abaixo, no Sudão, escreve no dia 19, o jornalista internacional John Carlin, ‘Hoje mesmo, neste mesmo instante, as tropas têm a cidade rodeada. O ataque é eminente. Dos quase um milhão de pessoas, muitos são refugiados de lugares que as mesmas tropas já arrasaram. Os antecedentes indicam que milhares de civis –homens, mulheres e crianças– sofrerão mortes atrozes e indiscriminadas’.

Refere a cidade de El Fasher, no Darfur, sudoeste do Sudão, cidade onde, afirma ‘Vivem os seres humanos mais aterrorizados do mundo’. E acrescenta ainda que sabe muito bem que a maioria dos leitores, já ‘abalaram’ para outra secção do jornal, por serem, muito poucos os que se interessam por estas coisas e, ironicamente, ‘Hoje não ofereço sopa, nem carne, nem tarte de chocolate. Só tenho remédio, mas sabe tão mal que obriga a fechar os olhos e ficar com cara de nojo’.

Deixa ainda os números ali recolhidos pelas Nações Unidas, oito milhões de sudaneses abandonaram as suas casas, vinte milhões de crianças sem escola, um terço da população, cerca de dezoito milhões, passa fome, cerca de cinco milhões, estão nos limites dos meios de alimentação, e muitos competem com as cabras a comer apenas pasto. A causa desta tragédia é a luta entre os generais sudaneses Hemeti e al Burham, uma luta pessoal pelo poder, bem longe de qualquer razão ideológica ou proposta social.

E escrevendo agora de lugares mais ‘conhecidos’, ainda no dia 15, um outro jornal trazia, ‘Aproveitando o facto de o mundo estar a olhar horrorizado para Gaza, Israel avança silenciosamente na ocupação da Cisjordânia’. Em três meses legalizou sessenta colónias, e declarou ‘território estatal’ mais de mil hectares, o que vai permitir a construção de novos assentamentos judeus. Os colonos ultra-ortodoxos invocam um ‘direito à terra, inscrito na Bíblia’, para desalojar os palestinos.

E noutra área e outro jornal, o ‘El País’, depois de uma investigação conjunta com a ‘Lighthouse Reports’, revelou há poucos dias, como ‘Marrocos, Mauritânia e Tunísia, usam a financiação europeia para prender e mandar para o deserto, emigrantes e refugiados. As vítimas são, principalmente, pessoas negras, e o objectivo é evitar que cheguem à Europa’.

Mais perto e para escrever agora sobre outro tipo de ‘abates’ e humilhações, a BlackRock, a empresa multinacional de investimentos com sede em Nova Iorque, a maior operadora em gestão de activos e riscos, e o maior sistema banca/sombra do mundo, (de acordo com o dr. Google!), dando agora em atenção ao Wall Street Journal do fim de semana de 11/12 de Maio, pede urgência a Kiev. Um grupo de prestamistas urge o pagamento da dívida a começar em 2025, mais quinhentos milhões anuais só em juros.

E continuando a escrever sobre este tema, leio também, agora na primeira página do jornal nacional Diário de Notícias, do dia 17 da mesma semana, ‘Grandes bancos lucraram 560 mil euros por hora, em três meses’ a que acrescenta ‘Resultado líquido das cinco maiores instituições financeiras do país superou os 1,2 mil milhões no primeiro trimestre’.

A terminar também aqui deixo a questão que encontrei há umas semanas, num artigo anónimo, ‘Cui prodest? A quem beneficia?

António M. Oliveira

Não respeito as normas que o Acordo Ortográfico me quer impor

 

2 Comments

  1. “mas sabe tão mal que obriga a fechar os olhos e ficar com cara de nojo”… a terrível e dolorosa realidade a que fogem os que andam apenas preocupados em cuidar da sua “vidinha”. Texto que devia ser leitura obrigatória no secundário.

    1. Obrigado caro Francisco.
      É a sua fidelidade, mesmo sem comentários, assim como de outros “Franciscos” espalhados por este território, que me faz continuar.
      Um abraço
      A.O.

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