Alguns comentários à volta da TAP e da Siderurgia Nacional, por José de Almeida Serra

 

Alguns comentários à volta da TAP e da Siderurgia Nacional

 por José de Almeida Serra

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Pego nestes dois casos por um revelar o que não se deve fazer, sobretudo de forma continuada, e o outro demonstrar exactamente o que pode e deve ser feito, mesmo em condições muito difíceis.

Um vem correndo mal e dando prejuízos elevadíssimos, agravando-se há décadas, não sendo honroso falar-se nas “porcarias” em que tem evoluído; o outro correu bem nos seus primórdios, quando tinha um comando diligente e inteligente, afundou-se no pós-25 de Abril e recuperou muito mais recentemente (até já pertence a espanhóis, como acontece com quase tudo o que tem valor e vai passando para a mão de estrangeiros).

Governo Provisório I (16 de Maio – 17 de Julho de 1974) Primeiro-Ministro Adelino da Palma Carlos Composição Independente; Partido Socialista (PS); Partido Popular Democrático (PPD); Partido Comunista Português (PCP); Movimento Democrático Português (MDP).

A TAP, que vergonha, inadmissível mesmo no país mais atrasado do planeta. Mentiras atrás de mentiras, ameaças de pugilado (que nem no Parque Mayer ou no Intendente), passar a outros responsabilidades intransmissíveis e outros actos da mesma índole, sucessiva e reiteradamente.

A D. Lucinda Duarte (mais tarde licenciada em História a partir daquela aldeia perdida nas serras, minha terra) – minha professora numa aldeia entretanto ardida no meio das Beiras – o que faria a miúdos que se portassem da maneira como GRANDÍSSIMOS POLÍTICOS se têm portado: chamava-os, dava seis reguadas a cada um e mandava-lhes que tivessem um pouco de juízo e vergonha no futuro, porque voltaria a reagir, mas em dose redobrada. Faltam-nos tantas Lucindas!

Pergunto: não têm estes senhores e estas senhoras vergonha de andar na rua? Dada a porcaria tão amplamente espalhada encontrariam emprego fora da política? Ou têm da política esta perspectiva: é onde se acolhe a porcaria (tenho de admitir que uma ou outra excepção sempre haverá).

Permitam-me que regresse ao IV Governo Provisório (26 de Março – 8 de Agosto de 1975) Primeiro-Ministro Vasco Gonçalves Composição Independente; Partido Socialista (PS); Partido Comunista Português (PCP); Partido Popular Democrático (PPD); Movimento Democrático Português (MDP).

Do V não falarei porque, como já expliquei, se tratou de uma simples ficção, ou facção.

Aqui não poderei deixar de referir nacionalizações e necessidade de regras sãs de gestão e de controlo sério das diferentes entidades: sejam públicas ou privadas.

Chame-se-lhe socialismo, comunismo, fascismo, o que quiserem. Mas há grandes princípios da humanidade e da solidariedade; e tem de se dar a possibilidade a várias áreas materiais e culturais; e oportunidades a todos; e evitar fenómenos – proibindo-os absolutamente – que prejudicam seres humanos (apetecia-me dizer: ar, animais – incluindo humanos – e flora, ou seja, ambiente). É admissível que 10% dos indivíduos do Planeta tenham a parcela de riqueza que possuem (há quem defenda 90%, mas os números variam segundo as fontes), enquanto todos os dias morrem à fome milhares e milhares de pessoas?

Que direitos têm os seres humanos sobre as riquezas não renováveis do Planeta? Sobre a transformação da Terra numa lixeira ou sobre a poluição geral, terrestre e marinha?

Não deve haver limites à riqueza extrema e à extrema pobreza? Isto não interessa à ONU – ou outro Órgão Internacional de Solidariedade (OIS) – nem aos múltiplos recolectores de dádivas para os pobres do mundo que, dizem-me, só cerca de 10% dos contributos chega ao destino?

Salvo raras excepções, os “políticos” portugueses são incompetentes, nocivos, interessados em negociatas e em arranjar “tachos” para eles e amigos. São do pior que alguma vez tivemos.

PROVOCAÇÃO: Comparem curriculum e obras dos ministros PS e PSD (onde ocorreram algumas excepções positivas, infelizmente muito poucas) que na generalidade foram verdadeiras catástrofes, com as dos ministros do Dr. Salazar e Prof. Marcelo (que eu sempre combati; tendo a última vez que fui a casa do general Delgado saído de lá às 11 da manhã do dia em que ele ao meio-dia se entregou na Embaixada do Brasil).

Não será que este caldo sociocultural não interessará também a alguns de nós (criticar para tudo ficar na mesma e aliviar a consciência)? Há um ditado português, muito velho, que diz: “bem prega frei Tomás, olha ao que ele diz e não ao que ele faz”.

É isto que eu sou e que eu defendo e chamem-lhe o que quiserem ou inventem um nome novo, que pode servir para Partido, por exemplo, FRATERNIDADE E SOLIDARIEDADE.

Quanto aos dinheiros de Bruxelas (e aqui tivemos um grande mestre com as riquezas do Brasil, o nosso D. João V) – é uma vergonha o que se passa com o novo Banco de Fomento, quando houve um antigo que funcionou a sério e não houve sequer a gentileza de perguntar-se a alguém deste como as coisas funcionavam “in illo tempore”. As vergonhas de nomear e depois não nomear, de indicar o nome deste e daquele, e nada funcionar devidamente, ou sequer passar a funcionar. E meses e meses que vão passando sem nada ou quase nada fazer, em algo que deveria estar a funcionar em menos de um mês; mas Bruxelas até pode ser benigna…

Para tudo se criam grupos de trabalho, normalmente de formados em grandes escolas e de grandes sábios, mas que não sabem como se guarda um rebanho de animais, se cava com uma enxada – seja sacho ou ancinho ou arado ou outro – se usa uma ceifeira ou roçadoura e o que significa roçar em Janeiro um molho de mato nos altos da Gardunha, para voltar a casa com as mãos congeladas e tremendo de frio.  Demagogia? Poderia continuar e dizer que foi isto que fez/construiu o mundo em que vivemos.

O actual ponto de partida – que espero possa manter-se – beneficia grandemente as actuais gerações. Será perdurável? Ou saberão os que não conhecem princípios elementares da vida reger o Planeta de forma consistente e altruísta (incluindo animais, vegetais e outras maravilhas naturais)?

E mais reafirmo: a situação dos escravos (como hoje a dos bois e éguas) era muito superior à dos desgraçados todos os anos importados para o Alentejo–Algarve. E toda a gente vê: será que a alma existirá em todos os seres humanos?

Que atroz ignorância de um mundo onde há escravatura (e digo, também aqui em Portugal); o que são os indivíduos que vêm do extremo oriente para apanhar fruta no Alentejo? E não há circuitos constituídos de gente bem e com cursos superiores que arranjam lá fora “bons empregos” para meninas lindas, que depois vão cair nos prostíbulos muçulmanos, turcos, asiáticos e, ao que parece, também na Europa?

E para quando mudamos o nome ao Mediterrâneo e passamos a chamar-lhe simplesmente cemitério?

Como todos e em todos os tempos fizemos muitas asneiras ao longo da história. Mas virem uns ignorantes dizer-nos que fomos esclavagistas (o que é verdade) e que até Camões tinha um escravo cuja missão era pedir para ele. Destruir monumentos de uma enorme densidade histórica? A resposta é simples: indecência, ignorância, estupidez.

Ninguém segue isto? Que autoridades são as nossas? Ainda há AUTORIDADE?

Grupos de trabalho e entidades do supra-sumo da ciência; mas estejam descansados, vamos ter muitas e doutas opiniões e muitos grupos de trabalho e muitos sábios a perorar.

Mas vamos continuar a ter incêndios novos (e onde já ardeu, passados 10 anos, voltará a arder).

E de todos os (ir)responsáveis nenhum se lembrou de se meter numa carripana e ir falar com uns “labregos” (desculpem, mas é assim que são encarados) da minha idade em algumas aldeias ainda não ardidas do interior?

E eles explicarão (não deixando de ser labregos, incompetentes e muitas vezes analfabetos) por que é que, no meu tempo de criança (anos 40 e 50), raramente havia incêndios, sendo imediatamente dominados localmente pela população. Eu também participei.

Bombeiros? Não havia. Tropas especializadas? Não havia. Outras sublimes profissões – técnicas ou administrativas – nem sequer existiam na mente das populações.

Já alguém fez o inventário da trupe (fandanga) que vai por esses ministérios e câmaras que existem, tão e somente, para nos esbulhar (ou para contemplar os incêndios que virão uns atrás de outros) e fazer longos relatórios explicativos.

Mas voltemos à “A história da TAP”, que vem de muito longe.

No 4º Governo Provisório eu era Secretário de Estado das Finanças (depois de ter sido vetado pelo PCP para o Tesouro; exigiam alguém com cartão); estupidamente, deram-me quase todo o poder do Ministério: empresas (com excepção de banca e seguros), dinheiros públicos, descolonização, IGF, nacionalizações, etc.

Havia um CM para os Assuntos Económicos às Quartas-Feiras, preparatório do CM pleno, às Quintas. O Ministro (Eng. José Joaquim Fragoso, homem absolutamente excepcional) delegou em mim a participação no dos Assuntos Económicos, que tinha lugar às Quartas-Feiras.

Como sabem, a Indústria (depois de seguros e banca) foi nacionalizada a correr, com mais uns apêndices (veja-se o DR).

No contexto da reforma agrária, desencadeada pela revolução, procedeu-se à nacionalização das terras que estavam incluídas no “Plano de Rega do Alentejo” (186 638 ha). A maioria das terras regadas pertencia aos concelhos de Alcácer do Sal, Ferreira do Alentejo, Coruche, Odemira, Santiago do Cacém e Idanha-a-Nova.

Ora, um dia, o Ministro dos Transportes (um indivíduo do PC, Veiga de Oliveira) aparece no Conselho das Quartas com a nacionalização de tudo o que era transportes em Portugal.

Expliquei ao Conselho – dois ou três secretários de Estado e o resto tudo Ministros – o absurdo da medida, dada a fragmentação existente no sector e condições de exploração. O Ministro dos Transportes (PC), muito incomodado, diz que também conhece muito bem o País, fez muitos anos de Douro, etc., etc., ia só averiguar a disposição dos presentes e retirou a proposta: publicamente e à frente de todos.

Era então figura grada no Partido, membro do seu Comité Central, e em franca ascensão. Anos mais tarde mudaria para o PS, onde as coisas não lhe terão corrido como esperaria.

Qual o meu espanto quando, no dia seguinte, a TAP é nacionalizada numa modalidade única: é pura e simplesmente integrada no Estado como qualquer Direcção-Geral (julgo que dos Ministros que tinham assistido à discussão da véspera nenhum teve intervenção).

Veja-se o Decreto-lei 205-E/75, de 16 de Abril – Diários da República -, no seu Art. 4.º – 1: “A universalidade dos bens, direitos e obrigações que integram o activo e o passivo da companhia dos Transportes Aéreos Portugueses, S. A. R. L., ou que se encontrem afectos à respectiva exploração são transferidos para o Estado, integrados no património autónomo da empresa resultante da nacionalização, ou a ele igualmente afectos”.

Ou seja, a TAP é nacionalizada num modelo único porque era totalmente integrada no Estado como se fosse uma Direcção-Geral, e, o Eng. Botequilha, telefona-me avisando que os americanos (Eximbank) estavam a pedir o pagamento de cerca de 40 milhões (julgo que de dólares) pelos Boeing 747, porque tinha deixado de haver empresa.

Lá tive que preparar um Decreto-Lei em catástrofe, e ir mais uma vez a CM explicar as consequências. O ministro Veiga – como já disse uma estrela ascendente no PC – dizia que por ali andava mãozinha e eu bichanei, mas para que se ouvisse, se não andaria também pezinho; o Dr. Cunhal – por quem sempre tive imenso respeito – rapou do caderninho de desenho e começou a desenhar. Silêncio geral e novo decreto-lei aprovado em consonância com o que se fizera na banca e indústria.

A TAP viria ainda a ser objecto de diversos decretos-lei, sendo que aquele que eu propusera e levara a Conselho de Ministros que o aprovara, afinal já estava fora de prazo para o Eximbank e não seria levado em mão aos USA, contrariamente ao que me fora especificamente enunciado pelos responsáveis da TAP. Simplesmente, precisava-se de um bode expiatório.

Agora vivemos a pouca-vergonha (estou a ser meigo) relativamente ao novo aeroporto. Eu, na minha ignorância, não consigo perceber quantos anos são necessários para fixar onde fazer um aeroporto, porque se criam comissões atrás de comissões e se inventam alternativas atrás de alternativas. Quantos milhões atrás de muitos outros? E tantos à espera de novos milhões e de fartas comissões!

Mas Beja está lá, foi construído e abandonado e era, há anos, o único na Europa com capacidade para aterragens de emergência do “space shuttle”. Não percebo tanta falta de espírito e menos ainda as contas globais que se fazem, se é que são feitas! E o que já fizeram de obra feita tantos estudiosos na matéria!

Mas como agora se aceitam alternativas, porque não pensar em Pescanseco (minha aldeia), na Pampilhosa da Serra, nas faldas da Gardunha–Lousã e com terrenos à borla porque ardeu tudo, mesmo as próprias aldeias?

Ponham os “estudantes” a estudar o centro–interior onde não há virtualmente nada nem ninguém!!! E uma auto–estrada Norte-Sul seguindo a fronteira portuguesa (como em grande extensão existe em Espanha) não teria real interesse e elevado potencial?

As regras dos concursos públicos são juridicamente uma amálgama incompreensível, sendo virtualmente impossíveis de cumprir, para felicidade de muita gente. Vão ao “google” procurar a legislação aplicável: aqui vos deixo a primeira de 6 páginas de legislação sobre a matéria.

Mas pergunto: quando se compram aviões (ou submarinos ou fragatas ou comboios ou todo esse tipo de material) não conhecemos os valores internacionalmente praticados? E não há informação sobre resultados de empresas bem geridas e altamente lucrativas? E há ou não há meia dúzia de rácios para as nossas empresas, e função pública, que poderiam validamente ser comparados com indicadores semelhantes de empresas e instituições bem geridas? Tive sempre determinadas perspectivas e exigências, o que me impossibilitou de continuar a ser professor do velho ISCEF, quando aquilo abandalhou e se chegou à auto-avaliação. Verificaria ser o único que se demitira devido à “bandalheira geral” a que se descera (1972).

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Passemos à Siderurgia Nacional, onde trabalhei vários anos, seguindo informação basicamente fornecida pelo Google, embora a mais relevante resulte da minha própria experiência. Achei que era altura, em vez de continuar a apreciar de outros para efeitos de financiamento, ir meter as mãos na massa e participar dos problemas reais.

Curiosidade prima: determinado dia em final de 1982, quatro dos cinco administradores fomos ao Seixal para uma visita de cortesia, às 12h00 a directores, e, outra, aos elementos da Comissão de Trabalhadores, às 12h30. Avisámos apenas da ida às 11h30, para evitar sequestros que, nessa altura, eram o pão de cada dia. Administradores sequestrados, ultimato para assinarem melhores condições e depois libertados (e muitos iriam muito longe posteriormente, nos partidos, no governo e até na banca, CGD incluída).

Lá fomos (faltava o 5º administrador porque não estava na empresa e não soube da ”excursão”). Mas às 12H30 estávamos sequestrados pela CT e trabalhadores e reduzidos à impotência, o que seria amplamente referido pela imprensa, designadamente no noticiário das 20h00 da RTP1. E lá fomos conversando ou desconversando, tendo ocorrido aspectos absolutamente anedóticos que poderei contar, mas aqui sem interesse. Fomos libertados depois das 2 da manhã por uma companhia da GNR. Não levaram nada, pela primeira vez, o que desincentivaria outras acções. Este era o ambiente de partida.

Não obstante as incertezas do PEPLS-Plano de Expansão de Produtos Longos do Seixal, cujo custo estimado era absolutamente faraónico, a opção do Conselho de Ministros era avançar (Primeiro Ministro, Francisco Balsemão; Ministro das Finanças, João Salgueiro) pela Siderurgia algo acima de 200 milhões de contos, mas que o comum dos analistas apontava mais para 300 milhões. Tratava-se de um projecto aliciante e que o Ministro das Finanças de então me disse não estar inteiramente convencido, mas essa – a de fazer – era a opinião do Conselho de Ministros. Fui chamado ao Ministro das Finanças, que me convidava para ir para a SN e, já à saída, referiu o Ministro que a TIR calculada pelo Banco Mundial era de 8% e a admitida pelo BDP (que para o efeito criara uma equipa interna) era de 8,5%, tendo-me perguntado se eu achava possível preparar uma síntese de referência que servisse de base para futuro: avaliações e decisões. Achei óbvio e prometi-lhe que em cerca de um mês teria isso.

Os menos conhecedores da simbologia da Economia perguntarão, mas o que é a TIR? A Taxa Interna de Retorno (TIR) –em inglês é conhecida como Internal Rate of Return (IRR)–, é uma taxa utilizada na avaliação de investimentos, comparando valores investidos com lucros obtidos durante o período previsto para os projectos, sendo o seu valor um indicador da valia do que se pretende investir. Quanto mais elevada for a taxa, mais interessante se torna um investimento (normalmente, procuram-se projectos com TIRs não inferiores a 10%), mas o valor usado depende de muitos outros factores, designadamente do interesse social e político atribuído aos projectos, sobretudo no sector público.

Nesse momento, o investimento previsto pelos respectivos defensores era de 200 milhões de contos, embora francamente subavaliado, como depois referi em publicação dos Cadernos de Economia.

Fiz o que deveria ser feito: pôr os directores a trabalhar, reuniões, papéis. Só que passados 15 dias não tinha nada de nada e tive que encarregar-me pessoalmente do estudo, escolhendo três técnicos “emprateleirados pelos respectivos directores” porque eram demasiado competentes. Com taxas de juro – anos 90 – à volta de 20%, optei por taxas constantes no longo prazo, embora com alguma variação relativa de preços, tendo estudado três hipóteses e três horizontes temporais. Conclusão: nas 9 hipóteses estudadas, as TIRs variavam entre -3% e +3%, situando-se a maior probabilidade à volta de zero (é o único estudo que ainda conservo da época do papel). E devo acrescentar que fora dos custos ficava um cais adequado no Seixal, uma fábrica de concentração de minério em Moncorvo e uma via férrea dedicada unindo Moncorvo ao Seixal. Sagrado projecto.

Percebi imediatamente que acabara de o “matar” pelo que a opção foi aceitar a contragosto a Secretaria de Estado da Marinha Mercante (ainda em 1982), tendo acabado com o sorvedouro de dinheiros da CTM e CNN e criado a Transinsular e Portline, de que nunca mais ninguém ouviu falar.

Nunca mais se falou do PEPLS e, acabado o Governo (para onde transitara após aquele decesso), voltei à Siderurgia, agora para um projecto de recuperação e modernização que viria a ser realizado:

  • Avaliado em 120 milhões de contos, realizado no prazo;

  • Alcançando e até ultrapassando objectivos;

  • E com custo final ou de 104 ou de 106 milhões (o número que memorizei foi de 105 mais ou menos 1).

Por isso, eu não percebo por que é que os projectos públicos têm de ser mais caros (muitas vezes chegando a 50%) do que o inicialmente previsto e autorizado e que o Primeiro Ministro nos venha dizer que por acontecimentos supervenientes tem de ser assim, sendo habitual que assim seja.

Relembro que o Sr. Champalimaud, excluindo o BPSM, tinha todos os escritórios na Rua Braamcamp – Siderurgia, cimenteiras, outros – e em mais um prédio na Mouzinho da Silveira, (encravado entre o BFN e o edifício público na Braamcamp), exclusivamente dedicado à informática (que de facto nada fazia, no meu tempo siderúrgico).

No meu tempo, nas Ruas Braamcamp e Mouzinho da Silveira estava apenas a Siderurgia, que tinha ainda vários andares alugados por essa Lisboa, incluindo um para uma Direcção de Investimentos que ia fazendo umas propostas pouco recomendáveis. Rescindi todos esses contratos e fui comprando portáteis para a fábrica numa determinada lógica global e coerente. No fim transferi para a fábrica todo o pessoal da informática, que nada tinham para fazer em Lisboa; todo o equipamento foi para a sucata. Ou seja: todos os informáticos ficaram excedentários, como acontece com muitos empregos públicos e privados (não há que escravizar, mas há que trabalhar, saber trabalhar e servir os utentes).

Quando no final do projecto saí, deixei 3200 funcionários em vez dos quase 7000 que recebera, não tendo despedido ninguém. Simplesmente, fui criando empresas para os produtos que eu comprava e escolhia os funcionários a transferir (para essas empresas que passavam a ser deles), ficando com os melhores. Mais me obrigava a comprar a produção – a preços baixos – durante dois anos, mas essas novas empresas não eram obrigadas a vender. Logo descobriram que o mercado era muito mais interessante pelo que passei a ter que gerir os pedidos de saída.

Quanto ao projecto: fraccionei-o em 24 subprojectos e concorria quem queria. Cada projecto era entregue, na sede da empresa, em determinado dia, entre as 18 e as 19 horas a uma equipa (que fui variando com frequência), que abria as cartas e anexos rubricando e numerando todas as folhas à frente dos proponentes. Depois havia uma outra equipa (também bastante variável) que fazia a apreciação técnica, após o que uma outra fazia a avaliação financeira (idem) e só então ia a Conselho para decisão, recebendo os administradores todos os documentos que pretendessem.

Que dificuldades haverá neste tipo de solução ou outras equivalentes? Porque não se comparam os preços pagos pelos hospitais no mercado? Porque não são conhecidos os fornecedores de determinado bem a todos os hospitais do País? Suspeito haver por aí tantas histórias…

E não julguem que isto se traduzia em demoras; com poucas excepções foram sempre rigorosamente cumpridos os prazos. Evidentemente, ocorreram algumas situações curiosas, mas que só podem ser contadas em privado.

A da laminagem considero-a exemplar e foi muito badalada na casa.

Por isso não percebo – porque os dados estão todos em DR – por que é que não se faz o inventário de todos os grandes projectos, de quanto foi inicialmente previsto e finalmente gasto. Pagamos milhares de milhões e não sabemos porquê, para quem e para quê, nem quem foram os responsáveis pelos projectos e respectiva execução. Embora a legislação tenha sido feita para esconder elementos ou outras coisas mais gravosas, não é possível desenhar umas fichas, muito simples e curtas (afinal o nascimento e morte dos humanos reduzem-se a uma folhinha de papel), que os beneficiários de fundos do Estado (ou da UE) têm de preencher, enviar ao Estado e que este publica por tudo ser do interesse geral e no fim serem os comuns cidadãos quem paga. É razoável que nem sequer saibamos o que queremos em matéria ferroviária? E tantas auto–estradas por onde passa quase ninguém e outras inexistentes que tanto ajudariam?

Quando entrei na SN eram milhões esvoaçando a partir do tesouro. Quando saí, o Expresso dedicou-me um amplo espaço. Milagre? Não. Apenas princípios, exigência de responsabilidades, controlos. Eu nem sequer sabia nada de Siderurgia, como não sabia nada dos grandes navios (só dos cacilheiros por neles viajar), nem de pescas a que voltarei um dia.

Termino: certamente temos o que interessa ter (ontem beneficiavam uns tantos, hoje porventura muitos) e há que acreditar em milagres como o daquele ex-Politburo da URSS, rapidamente transformado em putinista, que, partindo do nada, tem hoje milhares de milhões. Bem merece um visto «gold» e deve ir rezar a D. Manuel, que lhe expulsou os antepassados.

Lisboa, 2023-05-30

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