CARTA DE BRAGA – “da Economia e da História” por António Oliveira

De Economia aqui escrita com letra grande pelo respeito que devo a essa ciência sei apenas tentar equilibrar os números entre o sobrar mês e o faltarem trocos, por nunca ter conseguido alcançar os seus meandros, apesar de ainda ter tentado o primeiro ano no antigo ISCEF, mas que interrompi depois de, numa aula de economia prática, ter perguntado ao professor. ‘Se conseguir terminar o curso, o que serei além de um razoável contabilista?’, a que ele amável como sempre foi, respondeu apenas ‘E se calhar nem isso!’. Estendi-lhe a mão, agradeci, peguei nas minhas coisas e nunca mais ali entrei.

Mas vou vendo e lendo, tirando apontamentos, sempre a olhar em volta e escutar gente que me mereça confiança, penso que o suficiente para ter uma ideia, aliás bem triste, do mundo, do continente e do país em que vou deixando os anos, mas aumentando os cabelos brancos, para a fazer parte daquilo a que um qualquer idiota esclarecido denominou um dia, ‘peste grisalha’.

Assim, lembro-me de, já no princípio de Abril, ter lido ‘Lucros dos bancos crescem com subida dos juros no crédito e baixas taxas nos depósitos. Estão a ser beneficiados pelas altas taxas de juro nos empréstimos e lenta subida nos depósitos, segundo analistas contactados pela Lusa, que avisam para o risco de algum crescimento a médio prazo do crédito problemático’.

O escritor e jornalista João de Melo, também director da revista ‘África 21, afirma também no mesmo jornal, ‘O neoliberalismo, ao pôr em causa o Estado social (o que, como alguém já disse, não significa realmente diminuir o Estado, mas pô-lo ao seu serviço), é o principal responsável pela crise da democracia liberal, cada vez mais transformada, na melhor das hipóteses, em democracia política (onde os direitos e liberdades políticas são razoavelmente salvaguardadas, mas os direitos económicos e sociais são reduzidos) ou mesmo em mera democracia eleitoral (onde os cidadãos votam e nada mais acontece)’.

Obviamente que estas coisas não acontecem de repente, são antes o somatório de uma série de medidas conjunturais e estruturais tomadas anteriormente, basta recuar até ao final da II guerra como diz Luís Castro Mendes ainda no DN, ‘O modelo de sociedade que se instaurou na Europa Ocidental após 1945 e que foi aquele escolhido por Portugal na sua adesão à Europa, foi formatado por um compromisso histórico entre a social democracia e o liberalismo, no sentido daquilo a que Dahrendorf chamava o pacto social democrata, no qual a economia de mercado era uma economia regulada e o Estado assumia a responsabilidade pelas prestações sociais, necessárias para manter o equilíbrio e a coesão do modelo de economia social de mercado vigente’.

Mas, continuando a remexer nos tais apontamentos que vou tomando, recorro a este tirado de um diário europeu, na segunda semana de Maio, ‘Os auditores da UE, lançam dúvidas sobre a supervisão bancária do BCE, por o Tribunal de Contas considerar que a instituição pilotada por Christine Lagarde não impôs medidas de capital adicional paras as entidades com risco, nem intensificou o controlo dos bancos com mais crédito perigoso’. 

Um antigo director de um grande jornal europeu, já tinha escrito, no princípio de Maio, ‘Há já algum tempo, que a ética me parece um pedaço de plasticina, que cada um vai moldando de acordo com os seus gostos’, a justificar uma máxima do poeta romano Ovídio, nascido 43 anos a.C., ‘Quem tem muito dinheiro pode ser burro o quanto quiser’.

E volto a um DN de meados de Maio, para citar umas palavras de António Guterres, o secretário geral da ONU, ‘Não há coesão social sem direitos humanos. Não há justiça sem igualdade. Uma ganância grotesca está a punir as pessoas mais pobres e vulneráveis, enquanto destrói a nossa única casa’.

E, dois dias antes do final de Maio, leio mais este título, ‘Os aumentos salariais nominais da negociação coletiva, registados em Abril, de 6,4%, não conseguiram conter a erosão provocada pela inflação. Assim, descontando o efeito da subida dos preços, a atualização média anual das remunerações sofreu uma perda real de 1,4%’.

É, esta, uma época de mudança em todos os níveis, políticos, económicos, sociais, educacionais bem como do modo de ‘sermos e estarmos’ neste mundo. Uma mudança que se vem anunciando há já algum tempo, mas que parece não interessar a toda a gente. Talvez por isso, recorra,  para terminar, a mais uma frase, agora de Gramsci, que morreu em 1937 numa das prisões de Mussolini, mas frase que ele usava frequentemente, ‘velho mundo está a morrernovo demora a aparecer. E neste claroescuro nascem os monstros’.

Será a História que se repete ou o ser humano a não conseguir apreender?

António M. Oliveira

Não respeito as normas que o Acordo Ortográfico me quer impor

 
 

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