Violência, talvez uma das palavras mais ouvidas durante o ano de 2023, e não por acaso, devido à falta de paz em países em quase todos os continentes.
Quanto mais perto estamos dos países que estão em guerra, mais o vocabulário dominante fala de violência, guerra, atrocidades, mortes violações, torturas, fome, crianças que ficam sem pais, sem conforto…
O medo, a revolta, a contestação saíram à rua.
Este comportamento linguístico não é novo, antes das guerras que vemos e lemos todos os dias nos meios de comunicação social, a palavra violência já era repetida até à exaustão.
Violência doméstica, vítimas de atos de violência nos abusos sexuais de menores. Violência exercida com facas, bofetões e pontapés, violência cometida nas esquadras contra os “ detidos”, violência nos Lares para idosos, nas creches e nas escolas, violência verbal, violência visual nos vários canais de televisão desde alguns anúncios como em muitos filmes e séries.
Violência nos condutores de automóveis que ingeriram bebidas alcoólicas em excesso, violência nas expressões e nas palavras entre pessoas.
A violência tortura, mata, humilha, gera mais violência.
A violência aumenta a falta de saúde mental, deprime, leva ao suicídio…
Ora, a Humanidade sofreu e ainda sofre para se libertar de outras violências como a escravatura, o racismo, a exclusão étnica, religiosa, do deficiente, dos idosos, dos pobres…
O que se sabe sobre a origem da violência? A Humanidade terá sido violenta desde o seu início? Será alguma vez atingida a paz social, familiar, de estado, ou seja, dos homens e das mulheres contra outros homens e contra outras mulheres?
Não será, para este ambiente bélico, que num ato de amor são gerados os seres humanos, será que neste ambiente de violência, atos, não de amor, mas de agressividade, serão geradas crianças não desejadas, maltratadas, abandonadas…
Na Natureza, a violência também existe em outros seres vivos, mas visando apenas a subsistência das espécies.
Haverá violência lícita e violência ilícita? Tudo é violência, ou melhor, não há só uma violência, mas violências várias, pois como se sabe existe violência quando há poder de um sobre o outro, seja em que situação for.
A violência mata vulneráveis e poderosos! Porque nos pomos a favor de uns e não a favor de outros?
Acreditamos que não possa haver outras maneiras de resolver os problemas que a própria Humanidade criou?
Quem criou o direito de posse de territórios alheios?
Quem criou as desigualdades sociais, económicas, étnicas, religiosas, culturais? E para que as criou?
O que tem o homem e a mulher que gere tanta violência?
Muitas são as teorias que se têm debatido sem se conseguir encontrar algo que atenue essa violência.
Sabe-se que a agressividade nasce com a humanidade, mas a violência não.
Desde a sociologia, a antropologia, a educação, a psicologia, a psiquiatria, a psicanálise e tantas outras especialidades do estudo do comportamento humano que se tem tentado encontrar qual a sua origem. Sabemos que as condições económicas, habitacionais, de literacia, de saúde, de ambiente são potenciadoras das diferentes violências.
Porque não há vontade política de gerar paz, de uma cultura de reconhecimento positivo do outro, de liberdade de expressão responsável, de construção de sociedades em que todos possam partilhar o mesmo espaço e o mesmo ar que respiram, em que não haja exploração “ do homem pelo homem”.
Os poderosos não sabem o que é não ter o essencial para viver, alimentar os filhos, andar em transportes públicos, viver na rua, não tomar banho quando precisa, o que sente quem se prostitui por necessidade, tanta vida que os poderosos não conhecem, tanta vida fútil em que os poderosos se envolvem até viverem entre muros opacos em que só cabem alguns.
A vida é feita de pequenos nadas. O nada não é a violência, a felicidade sim.
Cantiga da Velha Mãe e dos Seus Dois Filhos
Ai o meu pobre filho, que rico que é ai o meu rico filho, que pobre que é Nascidos do mesmo ventre Um vive de joelhos pró outro passar à frente E esta velha mãe para aqui já no sol poente
Um dia há muito tempo, vi-os partir levando cada um do outro o porvir Seguiram pela estrada fora Um voltou-se para trás, disse adeus que me vou embora Voltaremos trazendo connosco a vitória
De que vitória falas, disse eu então Da que faz um escravo do teu irmão? Ou duma outra que rebenta como um rio de fúria no peito feito tormenta quando não há nada a perder no que se tenta?
Passaram muitos anos sem mais saber nem por onde passavam, nem se por ter criado os dois no mesmo chão eram ainda irmãos, partilhavam ainda o pão E o silêncio enchia de morte o meu coração
Depois vieram novas que o que vivia da miséria do outro, se enriquecia Não foi para isto que andei dias que foram longos e noites que não contei a lutar pra ter a justiça como lei
Às vezes rogo pragas de os ver assim Sinto assim uma faca dentro de mim Sei que estou velha e doente Mas para ver o mundo girar de modo diferente Ainda sei gritar, e arreganhar o dente
Estou quase a ir embora, mas deixo aqui duas palavras pra um filho que perdi Não quero dar-te conselhos Mas se é teu próprio irmão que te faz viver de joelhos Doa a quem doer, faz o que tens a fazer