UM CAFÉ NA INTERNET – O Corpo Insurrecto, de Luiza Neto Jorge

 (1939 – 1989)

Um café na Internet

 

 

 

 

 

 

 

 


 

Sendo com o seu ouro, aurífero

o corpo é insurrecto.

Consome-se, combustível,

No sexo, boca e recto.

 

Ainda antes que pegue

aos cinco sentidos a chama,

por um aceso acesso

da imaginação

ateiam-se à cama

ou a sítio algures,

terra de ninguém,

(quem desliza é o espaço

para o corpo que vem),

 

labaredas tais

que, lume, crepitam

nos ciclos mais extremos,

nas réstias mais íntimas,

as glândulas, esponjas

que os corpos apoiam,

zonas aquáticas

onde os órgãos bóiam.

 

No amor, dizendo acto de o sagrar,

apertado o corpo do recém-nascido

no ovo solar,

há ainda um outro

corpo incluído,

 

mas um corpo aquém

de ser são ou podre,

um repuxo, um magma,

substância solta,

com pulmões.

 

Neste amor equívoco

(ou respiração),

sendo um corpo humano,

sendo outro mais alto,

suspenso da morte,

mortalmente intenso,

mais alto e mais denso,

 

mais talhado é o golpe,

quando o põem em prática

com desassossego na respiração

e o sossego cru de quem,

tendo o corpo nu,

a carne ardida,

lhe pede o ladrão

a bolsa ou a vida.

 

In  Os Sítios Sitiados, Terra Imóvel, Os Corpos Vestidos, Luiza Neto Jorge, Poesia 1960 – 1989. Assírio & Alvim. 2.º edição, 2001. Aos herdeiros de Luiza Neto Jorge, à Assírio & Alvim, e ao site us2.picscdn.com, o nosso muito obrigado.

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