O papel das rádios clandestinas na luta contra a ditadura do Estado Novo
4. A Rádio Portugal Livre.
No ano seguinte ao do início dos combates em Angola, o PCP lançava, partir da Roménia, a Rádio Portugal Livre. Em 12 de Março de 1962, após os acordes iniciais de «A Portuguesa» ouviu-se pela primeira vez: «Fala Rádio Portugal Livre, Emissora Portuguesa ao Serviço do Povo, da Democracia e da Independência Nacional». O sinal indicativo emitido antes e depois das emissões, era a «Jornada» de Lopes Graça (conhecido por “Vozes ao Alto”).
Na anteriormente referida intervenção do director da RPL, no Colóquio Internacional dos 25º aniversário 25 de Abril, falando da criação da Rádio Portugal Livre, disse Aurélio Santos : «RPL foi a voz livre de muitos que cá dentro não podiam falar em voz alta – e livre. Foi a voz constantemente desperta para a informação que sempre recebia de uns para a transmitir a quantos quisessem ou pudessem ouvi-la. Uma voz vinda do exílio tem a obrigatória ressonância da voz que vem de longe. De um campo de indeterminável éter que está ao nosso lado e que, no entanto, não sabemos onde se localiza. De sítios onde não podemos saber de onde vem. De lugares que porventura nunca poderemos conhecer, onde talvez, mesmo percorrendo-os, nunca a poderemos encontrar».
Em recente artigo publicado em «O Militante», diz Maria da Piedade Morgadinho: «A criação da RPL e a sua entrada em funcionamento em Março de 1962 correspondeu a uma exigência colocada pela luta do povo português contra a ditadura fascista (…). O PCP, única força política organizada, vanguarda da resistência ao fascismo, dando uma vez mais provas da sua capacidade e imensa criatividade, foi ao encontro dessa exigência» (…) «Nos nossos programas denunciámos, através da informação que nos chegava, enviada fundamentalmente pelo Partido, a política da ditadura fascista, a exploração dos trabalhadores, o domínio imperialista; os crimes das guerras coloniais; a situação repressiva (a censura, as perseguições, as prisões, a situação prisional, os julgamentos, as condenações, as torturas, os assassinatos…»
Muito disto é verdade. Uma rádio que nos dissesse o que as emissoras controladas pelo regime nos ocultavam, fazia muita falta. Na RPL , a canção foi uma arma eficaz – Luís Cília pôs as pessoas a cantar versos de Borges Coelho, António Gedeão, Jonas Negalha, José Gomes-Ferreira, Carlos de Oliveira… O PCP, como diz Maria da Piedade Morgadinho, era a única força política organizada ou, pelo menos, a que tinha uma organização forte e permanente. Os republicanos históricos, por exemplo, apenas se organizavam em períodos eleitorais. Tudo o resto eram embriões sem consistênciaorganizativa.
Afirmar-se que a RPL dizia «a verdade», já será um exagero – a verdade que ouvíamos era filtrada pelos princípios pecepistas – que estavam longe de coincidir com os da oposição no seu conjunto. E o papel de vanguarda, de modo algum lhe era reconhecido pelas outras oposições. A RPL apenas elogiava as iniciativas pecepistas. Não raro, acções que partiram de outros grupos de democratas foram classificadas como “aventureiristas”. Digamos que a RPL teve uma grande importância para contrabalançar a desinformação da Emissora Nacional, mas também ela praticava uma informação pouco objectiva e com intuitos propagandísticos.
Porém, não respondamos sectariamente ao sectarismo pecepista – exageros aparte, historicamente, a RPL teve um papel fundamental na criação de uma alargada consciência antifascista. Esse mérito deve ser reconhecido. Em breve outra emissora entraria em acção – a Rádio Voz da Liberdade, emitindo a partir de Argel e ligada à Frente Patriótica de libertação Nacional.
A seguir: A Rádio Voz da Liberdade