por Rui Oliveira
Cordas sobresselentes
Na Segunda 2 de Abril, o Institut Français de Portugal convida os cinéfilos portugueses para um Ciclo Claude Chabrol (de hoje a 7 de Maio) de entrada livre, às 19h, (quase) todas as Segundas, com o argumento de o realizador francês (1930-2010) ter sido um “grande retratista da sociedade cujo avesso filmou com olhar acutilante, irónico, sarcástico, cru, feroz e inconformista !”. Na realidade, esta figura central da “Nouvelle Vague” francesa, a par de François Truffaut e de Jean-Luc Godard, apreciador de policiais e dotado de um humor sarcástico, adorava salientar os defeitos da burguesia provinciana.
Claude Chabrol impõe-se rapidamente como argumentista, realizador e produtor de filmes. Le Beau Serge [Um Vinho Difícil] (1957), com um estreante Jean-Claude Brialy no papel principal, é galardoado com o “Prémio Jean Vigo” e o “Grande Prémio do Festival de Locarno” de 1958 e o filme Les Cousins recebe em 1959 o “Urso de Ouro do Festival de Berlim”. É nessa altura que se casa em segundas núpcias com a actriz Stéphane Audran que se tornará numa das suas intérpretes fetiche (La Femme infidèle [A Mulher infiel], Le Boucher [O Carniceiro], Juste avant la nuit [Remorso]).
Com Violette Nozière (1978), a história de uma célebre envenenadora parricida dos anos 30, Chabrol contribui para revelar o talento da actriz Isabelle Huppert. O realizador confia-lhe o papel principal em cinco dos seus filmes, entre os quais Une Affaire de femmes [Uma Questão de Mulheres] (1988), La Cérémonie [A Cerimónia] (1995) e Merci pour le chocolat (2000, Prémio Louis-Delluc), com os quais Huppert alarga a sua galeria de “monstros”, mas também no filme Madame Bovary (1991).
Para este ciclo foram seleccionados alguns dos títulos mais importantes dos últimos 25 anos de intensa produção cinematográfica: Inspecteur Lavardin (1986), Betty (1991), L’Enfer [Inferno] (1993), La Cérémonie [A Cerimónia] (1995), Au Coeur du Mensonge [No Coração da Mentira] (1998), La Fleur du Mal (2001), La Fille Coupée en Deux [A Rapariga Cortada em Dois](2006).
Nesta Segunda, dia 2 de Abril exibe-se “La Fleur du Mal”, um filme com Nathalie Baye, Benoît Magimel, Bernard Le Coq nos principais papéis. Tema :
“Se o tempo existe, pode a culpa ser transmitida de geração em geração? Que efeitos poderá ter uma falta não-expiada para o culpado, descendentes e família? No final da Segunda Guerra Mundial uma mulher vai pagar pelo crime que cometeu. Nos dias de hoje, durante as eleições municipais, outro crime é cometido. Quem é o culpado? E culpado de quê? E se o tempo não existisse ?…”
Eis um excerto do filme que ilustra bem o clima duma França onde o contraste entre os descendentes de “collabo(s)” e “maquisards” ainda se não apagou :
Nessa noite de 2 de Abril, às 22h, no Lado B do bar Vinyl (Travessa da Galé nº 36, em Alcântara) actuam os Cornettada, participantes, na noite anterior, na Festa do Jazz no Teatro São Luiz. Trata-se de um trio (Giovanni Di Domenico piano, Hugo Antunes contrabaixo e João Lobo bateria) que se inspira no princípio de Harmolodics tanto nas suas composições originais como no uso do repertório de Ornette Coleman (daí o nome), pioneiro desse mesmo princípio que definiu como “o uso do físico e mental da lógica de cada músico transformado numa expressão sonora para causar a sensação musical de uníssono executado por um indivíduo ou grupo”. A ouvir.
Na Terça, 3 de Abril, prossegue o Festival internacional de Trompete Almost 6 noticiado na abertura deste Pentacórdio, mas agora no Palácio Nacional da Ajuda, às 21h, onde se realiza um Concerto de trompete barroco em que actua Fruzsina Hara, reconhecida trompetista húngara aluna de Edward Tarr, Friedmann Immer e Neil Brough no trompete barroco, e desde 2009 de Reinhold Friedrich na Staatliche Hochschule für Musik de Karlsruhe (Alemanha).
Neste concerto estará acompanhada por José Pereira violino, Ana Pereira violino, Joana Cipriano viola, Marco Pereira violoncelo e João Paulo Carneiro cravo na execução dum programa que inclui de G. Fantini Sonata detta del Nero, de P. Veivanovski Sonata em Sol bemol, de G. Viviani Primeira Church Sonata, de A. Scarlatti Sonata a Quattro (quarteto de cordas e baixo contínuo), de Giuseppe Torelli Sonata em Ré maior e de Georg Philipp Telemann Concerto para trompete em Ré maior.
Ouçamo-la em solo de trompete barroca na penúltima peça do concerto, a Sonata em Ré maior de Torelli, acompanhada por István Ruppert (órgão) em 2010 :
Também na Terça, 3 de Abril, às 21h30, no espaço TMN ao Vivo, o músico David Fonseca vem apresentar a primeira parte “Rising”, do seu projecto para 2012 cujo título global é “Seasons”, um trabalho que assim se divide em dois discos (“Falling”, o segundo, sairá no início do Outono). Dizem os críticos que o primeiro single daquele disco, “What Life Is For”, “integra no seu eclectismo musical a electrónica e o rock, aprofundando sonoridades que havia abordado nos seus últimos discos ainda que nunca de uma forma tão marcante”.
Ajuize o leitor/ouvinte :
Na Quarta 4 de Abril, novo concerto do ciclo Viagens na minha Terra no Salão Nobre do Teatro Nacional de São Carlos, às 18h, desta vez comentado por Jorge Rodrigues, reúne o Coro do Teatro Nacional de São Carlos sob a direcção musical de Giovanni Andreoli, com os acompanhantes Irene Lima violoncelo e Kodo Yamagishi piano e ainda os cantores sopranos Luísa Brandão e Ana Luísa Assunção, o contralto Natália Brito, o barítono Costa Campos e o baixo Daniel Paixão para o cumprimento de um programa com :
Franz Liszt Via crucis
Piotr Ilitch Tchaikovski Lenda, canção n.º 5, op. 54 (das 16 canções para crianças, op. 54)
Serguei Rakhmaninov Vésperas, n.º 6, 10, 13, 15
Anton Arenski Três quartetos para violoncelo e coro
Também na Quarta 4 de Abril, a continuação do Festival internacional de Trompete Almost 6 no Palácio Nacional da Ajuda, às 21h, chama agora Per Ivarsson trompete e Nenad Markovic trompete para um programa extenso (com um pianista ainda não conhecido) onde constam, entre outras peças, a Fantaisie-Caprice de Gabriel Parés, a Windflüchter I de Sebastian Stier, a Allemanda from Partita 2 in D minor de J.S.Bach, a Ein Hauch von Unzeit para trompete solo de Klaus Huber, a Hikari para trompete e piano de Somei Satoh, a Exchanges para trompete solo de Vinko Globokar, a Parable XIV para trompete solo de Vincent Persichetti e A Chloris para trompete e piano de Reynaldo Hahn.
Ainda na Quarta 4 de Abril, o Concerto Antena 2 acontece às 19h (com entrada livre) na Academia das Ciências de Lisboa pois integra um dos concertos da Temporada DARCOS 2012, uma iniciativa do concelho de Torres Vedras, sob a direcção artística do compositor e maestro Nuno Côrte-Real.
Os intérpretes são o Ensemble Darcos, dirigido por aquele maestro e composto por Rui Maia flauta, David Costa oboé, Fausto Corneo clarinete, Laura Salcedo violino, Filipe Quaresma violoncelo e Helder Marques piano. Para este espectáculo escolheram o seguinte programa :
Manuel de Falla Concerto p/ cravo (ou piano) e 5 instrumentos – violino, violoncelo, flauta, oboé e clarinete ; Nuno Côrte-Real Largo intimíssimo, Op. 28, p/ clarinete, violoncelo e piano e Igor Stravinski Suite “História do Soldado” redução de p/ violino, clarinete e piano
Por último nessa noite de 4 de Abril, às 22h, ao Lado B do bar Vinyl regressa o LX Vocal Ensemble (Cristina Pedrosa, Cláudia Duarte, João Farinha e João Neto) cuja actuação anterior, repetida no espaço Fábrica Braço de Prata já em 2012 pode aqui ser visionada, entoando Sound of Silence de Paul Simon :
Na Quinta 5 de Abril, na Recepção do Centro de Reuniões do Centro Cultural de Belém, às 22h, a sessão Dose Dupla – Jazz a Dois reune o pianista português Rui César e a cantora brasileira Pat Escobar que já se encontraram uma vez casualmente no Cascais Jazz Club no âmbito do espetáculo “3 na Bossa”. Espera-se um dueto vivo entre jazz e bossa.
A 5 de Abril, também, há no Cinema São Jorge, às 21h30, o Concerto de Encerramento do Festival Internacional de Trompete Almost 6 em que intervêm a Banda Sinfónica da GNR e o trompetista Jeroen Berwaerts (ver Concerto de Abertura).
Cabe à Banda da GNR a execução da Sinfonietta, fanfare de Leoš Janáček, das Variações Sinfónicas sobre uma Canção Popular Alentejana de Joly Braga Santos, de Le vent des Hélices de Jérôme Naulais (aqui em conjunto com Almost6), de “O Tenente Kije” Suite sinfónica op. 60 de Serge Prokofiev.
Ao terminar Jeroen Berwaerts associa-se à Banda da GNR para tocar o Concerto para trompete de Alexander Arutiunian. O que se ouvirá neste concerto, embora com outros intérpretes (o trompetista Tiago Linck) será semelhante a :
Findo o concerto, às 23h, haverá uma Jam Session com o Quarteto Hulot no Bar do Cinema São Jorge.
Ainda a 5 de Abril, há novo Concerto Antena 2 (com entrada livre) na Academia das Ciências de Lisboa, às 19h, com o Ensemble Palhetas Duplas (com direcção musical de Jean-Sébastien Béreau e direcção artística de Francisco Luís Vieira) que terá a colaboração valiosa da pianista Ana Telles (solista nas Orquestras Gulbenkian e Metropolitana) e ainda a participação especial de Daniel Louro, Hugo Santos e Jorge Barroso em trompete , de Helder Rodrigues sacabuxa,
João Pacheco percussão e Franz Dörsam contrafagote.
O programa do concerto integra de Jean-Baptiste Lully Carousel , Prelude du Carousel de la Grande Écurie, Menuet, Gigue e Gavotte, de W.A. Mozart Serenata em dó menor (Adapt. J. Pereira), de Jan Sweelink Meine junges Leben hat ein End (Arr. F. J. Dörsam) e de Jean-Sébastien Béreau Au Bois de Cise.I
Não havendo registo destas peças, ouça-se o Ensemble Palhetas Duplas tendo como solista João Pedro Silva saxofone alto a tocar de Astor Piazzolla o Libertango (arr.de J.Pereira) no Palácio Nacional de Queluz em Março de 2010 :
O Ensemble Palhetas Duplas criado em finais de 2004, engloba no Oboé / corne inglês António Campos, Bethany Akers, Bruno Ferreira, Bryony Middleton, Christopher Koppitz, David Costa, Filipe Freitas, Frederico Fernandes, Joana Bolito e João Pereira, no Fagote / Contrafagote Daniel Mota, Gonçalo Pereira, Pedro Pereira, Ricardo Lopes Santos, Ricardo Santos e Tiago Paraíso.
Ainda a 5 de Abril, mas também na Sexta 6 e no Sábado 7, actua no Hot Club de Portugal, às 23h, o “João Lencastre Group” onde o sempre criativo compositor e percussionista divulgará o seu mais recente CD “Sound it Out”, de que revelamos um excerto :
Na Sexta 6 de Abril, como boa “Sexta-feira Santa” não há a tentação de qualquer acontecimento cultural (mesmo uma pobre homenagem ao “Rei do Rock” Elvis Presley no Coliseu foi cancelada) e, fora as sugestões cinéfilas que fizémos no início, é preciso deixar passar a meia-noite para, às 2h00 no MusicBox, se poder ter uma experiência curiosa, a de apreciar o valor da consanguinidade musical (?).
De facto, sobe ali ao palco Taylor McFerrin, filho do muito popular Bobby McFerrin (vencedor de dez Grammys, colaborador de Chick Corea e Herbie Hancock, autor de Don’t worry be happy) e neto de Robert McFerrin (o primeiro afro-americano da Metropolitan Opera de Nova Iorque). Vem apresentar “Early Riser”, o seu álbum de estreia, que dizem “um produto da future soul, de texturas electrónicas processadas até ao osso, com o alcance do dub e a postura do hip hop”. Veremos (quem lá fôr).
No Sábado 7 de Abril, os amantes de ópera – mesmo só (ou)vista – devem deslocar-se ao Grande Auditório da Fundação Calouste Gulbenkian, às 17h, porque aí o Met Opera Live in HD possibilita assistir em directo à ópera de Jules Massenet inspirada num conto do abade Prévost “Histoire du Chevalier Des Grieux e e Manon Lescaut”, mais abreviadamente designada “Manon”.
Esta nova produção de Laurent Pelly, estreada no Covent Garden londrino, que acentua o carácter perverso da noviça Manon e de seu irmão, será dirigida pelo maestro Fabio Luisi e interpretada, nos principais papéis, por Anna Netrebko (Manon), Piotr Beczala (Des Grieux), Paulo Szot e David Pittsinger.
Antecipemos duas cenas, a ária “Manon ! Sphinx étonnant !” e a cena final do 3º Acto :
Ainda a 7 de Abril, no espaço do teatro A Barraca, às 21h30, com entrada livre, actua João Alegria Pécurto, “desenvolvendo na guitarra acústica peças de uma beleza transparente, de rendilhados ternos e hipnóticos”. Antecipa assim o espectáculo que dará na Culturgest a 20 de Abril revelando o seu primeiro disco “Um lugar de silêncio, para que tudo cante na tua ausência”.
No Domingo 8 de Abril também o panorama é escasso e apenas surge como espectáculo interessante a exibição no Teatro Ibérico (Rua de Xabregas, nº 54) do Mr SC and the Wild Bones Gang, um projecto original que reúne a nata dos trombonistas da nova geração portuguesa de metais graves, como Mário Costa, um dos mais promissores bateristas nacionais e Sérgio Carolino (tubista), o mentor deste ensemble de baixa frequência.
Tocam música encomendada a compositores como Elisabeth Raum (Canadá), Roland Szentpáli e Jánus Mazura (Hungria), Paul Hanmer (África do Sul), Stéphane Krègar, Eric Bourdet (França) e muitos outros, além do português Filipe Melo. No seu primeiro disco incluem um vasto leque de estilos musicais, desde o príodo barroco à música moderna, passando pelo jazz, funky e mesmo rock.
Compõem o conjunto os trombones tenores HugoAssunção, Gabriel Antão, Ruben da Luz, Ricardo Pereira, JoãoMartinho, Daniel Dias, RubenTomé, André Melo, André Conde, António Santos, Emanuel Rocha, Daniel Seabra, os trombones baixos Gonçalo Dias, Nuno Martins, Tiago Noites, Alexandre Vilela, Júlio Sousa, NunoHenriques e RuiBandeira, os contrabaixistas Sérgio Carolino e Gil Gonçalves e o baterista Mário Costa.
Eis como o “Mr SC and the Wild Bones Gang” se apresenta :
Caro leitor: E assim termina uma semana pobre, talvez mais da época do que da crise…
VIVA.Excepcional trabalho o apresentado neste post. Isto é cultura.. Parabens por tudo e pelo esforço que este post exigiu.Reconhecidamente, deixo um grande abraço culural.João Brito Sousa