Um Café na Internet
Num Jardim da China (continuação)
O eremita era uma figura canónica da cultura chinesa. Cansado de viver na Corte, isolara-se na província, enriquecia-se com sensações: a música do vento, o canto do rouxinol, os perfumes da brisa, a queda de uma pétala, o som da chuva nas folhas da bananeira, os reflexos da lua na água de um lago… Jacques Pimpaneau cita vários poemas de Xie Lingyun que falam do retorno à liberdade. Tomemos como exemplo este, que traduzo da versão francesa de Claude Roy esperando que algum parentesco guarde com o original chinês do século V:
Jovem, eu não prezava a agitação
crescera amando as montanhas
entrei por engano na vida mundana
perdi treze anos da minha vida.
Na gaiola o pássaro sonha com os bosques
no tanque o peixe sonha com a ribeira
por isso voltei para o Sul.
Cavo a minha horta, cultivo os meus campos
pouco terreno possuo, dez escassos mus.
A casa é pequena
um olmo e um salgueiro fazem-me sombra
há em frente pessegueiros e damasqueiros.
Avisto ao longe casas de camponeses
fumegam as chaminés no céu calmo.
Um cão ladra
um galo canta na amoreira.
O silêncio habita comigo.
Tenho espaço, tenho tempo.
Vivi demasiado numa gaiola
eis-me agora a mim devolvido.