Nos dias 4-8 de Abril de 1973, realiza-se em Aveiro o III Congresso da Oposição Democrática. A sua
realização foi cercada de intensas medidas repressivas, entre elas o ataque da Polícia de Choque aos congressistas quando se deslocavam em manifestação silenciosa ao cemitério local, em romagem ao túmulo de Mário Sacramento. A onda de repulsa contra o regime ditatorial, começou logo que ele se instalou. Não esqueçamos a grande Revolta de Fevereiro de 1927 ou a da Marinha Grande em Janeiro de 1934. Neste trabalho, apenas vamos referir o ano de 1973. Falámos do Congresso da Oposição Democrática – mas o que havia era um conjunto de oposições que apenas estavam de acordo na necessidade de acelerar a queda da ditadura. Vamos falar dos militares – no seio da «família militar» as divisões eram o reflexo do que ocorria entre os civis. Vamos então lembrar momentos significativos do caminho que levou ao 25 de Abril:
1-3 de Junho de 1973
Desenrola-se no Porto o chamado I Congresso dos Combatentes do Ultramar, através do qual o Governo pretende demonstrar, interna e externamente, a “adesão entusiástica” dos militares à política ultramarina. A sua forma de organização antidemocrática desencadeia um amplo repúdio no seio das Forças Armadas: em Portugal Continental Ramalho Eanes, Hugo dos Santos, Vasco Lourenço e outros encabeçam um vasto movimento de protesto e, com o mesmo objectivo, são recolhidas quatrocentas assinaturas de oficiais do Quadro Permanente em serviço no teatro de operações da Guiné e enviado um telegrama ao congresso assinado por Marcelino da Mata e Rebordão de Brito.
JULHO
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DIA 13
É publicado, no Diário do Governo, o Decreto-Lei n.º 353/73 (e posteriormente o 409/73, com pequenas alterações), o qual criava um conjunto de condições que facilitava o ingresso dos oficiais milicianos no Quadro Permanente (QP), medida que vem incrementar a contestação já latente nos oficiais desse Quadro, tornando-se o verdadeiro rastilho para a criação do futuro Movimento dos Capitães.
AGOSTO
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DIA 18
Reunião de duas dezenas de capitães na sala de jogos do Clube Militar, em Bissau. Analisa-se a legislação considerada afrontosa, ética e materialmente, para a maioria dos capitães do QP. Discute-se a atitude a tomar e escolhe-se uma comissão para elaborar um projecto de carta a enviar às mais altas entidades das Forças Armadas e do Exército e ainda ao Ministro da Educação.
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DIA 25
Leitura e discussão final do documento que recolheu 51 assinaturas. Foi constituída uma Comissão, integrada pelo major Almeida Coimbra e capitães Matos Gomes, Duran Clemente e António Caetano.
SETEMBRO
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DIA 9
Tendo por local de encontro o Templo de Diana, em Évora, 136 oficiais dirigem-se ao monte do Sobral, em Alcáçovas, a uma herdade de um familiar do capitão Diniz de Almeida, onde nasce formalmente o «Movimento dos Capitães». Exige-se a revogação do Decreto 353/73. Um abaixo-assinado será entregue na Presidência da República e na Presidência do Conselho de Ministros, pelos capitães Lobato Faria e Clementino Pais.
– neste mês, 94 oficiais superiores, capitães e subalternos, em comissão em Angola, assinam colectivamente um protesto e enviam-no a Marcelo Caetano. Em Moçambique elabora-se um documento idêntico que recolhe 106 assinaturas, entre oficiais superiores, capitães e subalternos.
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DIA 13
Otelo Saraiva de Carvalho, em fim de comissão, reúne pela última vez numa sala do Grupo de Artilharia de Campanha de Bissau, recebendo a incumbência de, em Lisboa, se integrar no Movimento, sendo porta-voz das preocupações dos seus camaradas.
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DIA 24
O PAIGC proclama, em Madina do Boé, a independência do território da Guiné-Bissau.
OUTUBRO
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DIA 6
Realiza-se uma grande reunião quadripartida, devido à impossibilidade de conseguir uma sala que albergue delegados de quase todas as unidades do País. Em discussão a atitude a tomar pelo Movimento caso o Governo não retroceda na aplicação dos decretos. Foi decidido, nesse caso, a apresentação de requerimentos individuais de demissão.
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DIA 28
Eleições para a Assembleia Nacional com a desistência da Oposição Democrática (CDE) que classifica o acto de fraude eleitoral.
NOVEMBRO
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DIA 7
Remodelação ministerial que afasta o Ministro da Defesa, general Sá Viana Rebelo, e o secretário de Estado do Exército, Alberty Correia. Em sua substituição são nomeados para as pastas da Defesa Nacional e do Exército, respectivamente, o Prof. Joaquim da Silva Cunha, até então Ministro do Ultramar, e o general na reserva Alberto Andrade e Silva, sendo o coronel de artilharia Carlos Viana de Lemos designado subsecretário de Estado do Exército.
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DIA 24
As Comissões Coordenadora e Consultiva provisórias do Movimento dos Capitães reúnem num casarão nas traseiras da Colónia Balnear Infantil de O Século, em S. Pedro do Estoril. É necessário fazer um ponto de situação e eleger uma Comissão Coordenadora definitiva que seja verdadeiramente representativa do Movimento. A «guerra do decreto» devia ser ultrapassada pela acção e passar-se a uma nova fase de luta. Os delegados são solicitados a auscultar as suas unidades sobre o caminho a prosseguir pelo Movimento dos Capitães.
DEZEMBRO
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DIA 1
Reunião no Clube Recreativo de Óbidos. Após se ter tomado conhecimento de que as bases do Movimento não pretendiam, por ora, ir além das reivindicações militares, importantes decisões são tomadas:
– vota-se o nome do general Costa Gomes como chefe prestigiado que o Movimento deveria chamar a si;
– delibera-se alargar o Movimento aos outros ramos das Forças Armadas (Marinha e Força Aérea);
– elege-se uma Comissão Coordenadora e Executiva (CCE), com 3 oficiais por cada arma e serviço do Exército.
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DIA 5
1ª reunião da nova CCE, numa casa de praia na Costa da Caparica. Prepara-se uma proposta com base em reivindicações militares, a apresentar a elementos dos outros dois ramos. Esse documento era de tal forma ambicioso que seria uma forma de pressão quase extrema para o Executivo. Para a CCE foi escolhida uma direcção: majores Vítor Alves, Otelo Saraiva de Carvalho e capitão Vasco Lourenço.
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DIA 17
Vislumbram-se insistentes sinais de que estaria em preparação um golpe de Estado de extrema direita, com a implicação dos generais Kaúlza de Arriaga, Silvino Silvério Marques, Joaquim Luz Cunha e Henrique Troni, visando a conquista do poder.
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DIA 22
São revogados os Decretos-Lei 353/73 e 409/73 que haviam estado na origem do Movimento dos Capitães. Teme-se que a desmobilização da luta alastre à maioria dos militares.
1974
JANEIRO
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DIAS 14-17
Acções reivindicadas pela Frelimo conferem novas proporções à guerra colonial em Moçambique. Na Beira, enquadrados por elementos da PIDE/DGS, cerca de quatrocentos brancos e negros da população local manifestam-se, em fúria, insultando gravemente as Forças Armadas.
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DIA 23
É redigida a 1ª circular do Movimento (circular n.º1/74), por decisão da sua direcção. A mesma é amplamente distribuída, relatando os acontecimentos ocorridos em Moçambique e apelando a que cada militar “…dentro das mais estritas regras da disciplina…” se empenhe na exigência de um desagravo à instituição. Otelo Saraiva de Carvalho e Vasco Lourenço avistam-se com Spínola, dando-lhe conhecimento da posição do Movimento. Esta circular viria a ser citada na BBC, no Le Monde e na emissora Rádio Portugal Livre, de Argel.
FEVEREIRO
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DIA 5
O Movimento dos Capitães politiza-se de forma galopante. É necessário adoptar um programa. Para isso realiza-se um encontro alargado da CCE no qual é eleita uma Comissão de Redacção do Programa do Movimento. Dela fazem parte o tenente-coronel Costa Brás, majores Melo Antunes e José Maria Azevedo e capitão Sousa e Castro.
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DIA 23
É publicado o livro Portugal e o Futuro, da autoria de António de Spínola, que se esgota rapidamente, conhecendo um enorme sucesso. O general defende uma solução política e não militar para o Ultramar. Fica demonstrado publicamente o conflito existente no seio do regime em torno de uma solução para o problema colonial.
MARÇO
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DIA 5
Miniplenário do Movimento dos Oficiais das Forças Armadas, em Cascais, o último antes do 25 de Abril. Presentes 194 oficiais, das unidades de Infantaria, Artilharia, Cavalaria, Engenharia, Administração Militar, Transmissões, Serviço de Material, Pára-quedistas e Força Aérea (FA), representando 602 militares. O documento, de índole política, «O Movimento, As Forças Armadas e a Nação» recolhe 111 assinaturas.
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DIA 6
Marcelo Caetano faz defesa inflamada da política do Governo para o Ultramar, em discurso proferido perante a Assembleia Nacional e transmitido pela RTP. No seu seguimento é aprovada pelos deputados uma moção de apoio à “política ultramarina do Governo”.
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DIA 9
Os capitães Vasco Lourenço, Antero Ribeiro da Silva e Pinto Soares são detidos, tendo os dois primeiros, decorridos alguns dias, sido transferidos compulsivamente para os Açores e a Madeira, respectivamente, enquanto o terceiro foi internado num estabelecimento hospitalar.
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DIA 14
As chefias das Forças Armadas e de Segurança e os oficiais generais dos três ramos vão a S. Bento afirmar ao Presidente do Conselho de Ministros e ao Governo a sua fidelidade e apoio à política ultramarina, em nome das respectivas instituições.
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DIA 15
Os jornais anunciam com grandes parangonas a exoneração dos generais Francisco da Costa Gomes e António de Spínola dos cargos de Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas e vice-CEMGFA, respectivamente.
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DIA 16
Às 04h00 da madrugada, uma coluna do Regimento de Infantaria 5 das Caldas da Rainha passa os portões do aquartelamento, comandada pelo capitão Armando Marques Ramos. Pretende executar um golpe militar, marchando sobre Lisboa e depondo o Governo. Apenas a três quilómetros da capital terá a noção de que se encontra isolada. Um precipitado e deficiente planeamento da acção leva ao seu fracasso, sendo presos quase duas centenas de militares – oficiais, sargentos e praças – entre os quais o tenente-coronel João de Almeida Bruno, majores Manuel Monge e António Casanova Ferreira e capitães Marques Ramos e Virgílio Varela. Constituiu, embora, um importante balão de ensaio para o 25 de Abril.
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DIA 18
– Otelo e Vítor Alves redigem a Circular 2/74, procedendo a uma análise dos acontecimentos e apelando à firmeza e perseverança nos objectivos do Movimento.
– Encontram-se com Melo Antunes, no Café Londres, e pedem-lhe que elabore um programa político do Movimento dos Oficiais das Forças Armadas (MOFA), com base no Manifesto aprovado no plenário do dia 5.
– O diário República, dirigido por Raul Rêgo, desde sempre ligado à oposição ao Estado Novo, publica, de forma criptográfica, na página desportiva, a notícia intitulada «Quem travará os leões» na qual se conclui que «perdeu-se uma batalha, mas não se perdeu a guerra».
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DIA 21
Após um contacto estabelecido no alto do Parque Eduardo VII por iniciativa do capitão Luís Macedo, colocado no Regimento de Engenharia 1 (RE 1), em que solicita a Otelo, em nome de muitos camaradas, que assuma a condução militar do Movimento, este aceita a missão e designa-o seu adjunto operacional.
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DIA 22
– Reunião em casa de Vítor Alves de um pequeno núcleo de oficiais do Exército, da Força Aérea e da Armada. Melo Antunes lê a primeira versão do programa político do Movimento, sendo por todos aprovada.
– Melo Antunes comunica que, por ironia do destino, em resultado de um pedido seu, deferido apenas naquela altura (!), irá partir nessa noite para Ponta Delgada, devido a ter sido colocado no Comando Territorial Independentedos Açores (CTIA). Fica combinado o célebre telegrama em código que o irá informar do grande momento: “Tia Aurora segue dia…Um abraço António”.
– O comandante Almada Contreiras acompanha Melo Antunes ao aeroporto, sendo apresentado por este a Álvaro Guerra, jornalista do República.
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DIA 24
A CCE reúne. É aprovado por unanimidade que os dois elementos da direcção ainda activos assumam a responsabilidade da preparação militar e da preparação política do movimento. Otelo aceita, perante os presentes, gizar um plano operacional e elaborar a «ordem de operações» respectiva. Garante que o golpe será desencadeado entre 20 e 29 de Abril e, desta vez, para conduzir à vitória.
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DIA 28
Marcelo Caetano faz, na RTP, a sua derradeira «conversa em família».
ABRIL
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DIA 15
– Otelo Saraiva de Carvalho conclui o Plano Geral das Operações (PGO), que intitula simbolicamente “Viragem Histórica”. Divide o país em duas grandes áreas de operações: Zona Norte e Resto do País, sendo este segmentado em quatro áreas. As unidades do Norte deveriam convergir para o Porto, onde ocupariam pontos estratégicos, nomeadamente o Quartel-General, instalações de forças de segurança, estações de rádio e televisão, aeroporto e pontes. As unidades situadas a Sul do Douro adoptariam idêntica manobra relativamente à capital, sendo atribuídas a algumas das colunas mais importantes missões de natureza táctica. (EPC e EPA). Nesse mesmo dia entrega o PGO ao tenente-coronel Garcia dos Santos para que este elabore o Anexo de Transmissões.
– Encontro no restaurante Califa, em Benfica, de Otelo, do capitão Frederico Morais e dos tenentes milicianos Luís Pessoa e Miguel Amado com vista a planear a tomada da Emissora Nacional.
– Escolha do Rádio Clube Português (R.C.P.) para posto emissor do MFA, em virtude de possuir uma rede que cobre o país e o Ultramar, emitir noticiários de hora a hora em simultâneo e de dispor, nas instalações da Rua Sampaio e Pina, nº 26, de um estúdio compacto, de gerador de emergência com entrada automática em funcionamento e rádio-telefone para o centro emissor em Porto Alto.
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Meados de Abril
Álvaro Guerra, elemento de ligação entre alguns oficiais do MFA e meios civis da oposição, obtém a colaboração do núcleo do República, no qual se conta o seu director, Raul Rêgo, bem como os jornalistas Álvaro Belo Marques, Carlos Albino, Fernando Assis Pacheco, José Jorge Letria e Vítor Direito.
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DIA 16
Otelo Saraiva de Carvalho reúne, no RE 1, com o major Eurico Corvacho a quem explica a ideia geral de manobra, particularizando as movimentações a levar a cabo na Zona Norte. A pedido deste, agrega-lhe as forças do Centro de Instrução de Operações Especiais (CIOE) de Lamego, cometendo-lhes a missão de reforçar as tropas do Porto.
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DIA 17
Otelo Saraiva de Carvalho distribui as missões aos delegados do Agrupamento Norte (November), no apartamento de Dinis de Almeida, estando presentes todos os agentes de ligação para esse sector, facto que se repete nas restantes reuniões.
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DIA 18
Otelo Saraiva de Carvalho distribui as missões aos delegados do Sector Centro (Charlie), em sua casa, contando-se entre estes o capitão Correia Bernardo, em representação da Escola Prática de Cavalaria (Santarém).
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DIA 19
Otelo Saraiva de Carvalho distribui as missões aos delegados do Sector Sul (Sierra), em casa do major Fernandes da Mota.
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DIA 20
– Finalmente, na mais importante das reuniões, Otelo Saraiva de Carvalho distribui as missões aos delegados das unidades da Região Militar de Lisboa (Lima), na residência, então vaga, do pai do tenente Américo Henriques, em Cascais.
– Conclusão do essencial dos textos políticos (em cuja redacção, coordenada por Vítor Alves, participaram Franco Charais, Costa Brás, Vasco Gonçalves, Nuno Lopes Pires e Pinto Soares, pelo Exército; Vítor Crespo e Pedro Lauret, com a participação menos activa de Teles e Contreiras, pela Marinha e a ocasional presença do major Morais e Silva e do capitão Seabra, pela Força Aérea). A partir desta data, Otelo, que também assegura a ligação com Spínola, passa a efectuar os contactos, por razões de segurança, através do major de cavalaria na reserva Carlos Alexandre de Morais. São da lavra do general algumas das modificações introduzidas, nomeadamente a designação de Movimento das Forças Armadas (MFA), em substituição da versão anterior de Movimento dos Oficiais das Forças Armadas (MOFA) e de Junta de Salvação Nacional (JSN) em alternativa à proposta do Directório Militar.
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DIA 21
Encontro, na marginal em Oeiras, de Otelo e do major Moura Calheiros com os coronéis Rafael Durão (representante do general Spínola) e Fausto Marques, com vista a obter a adesão do Regimento de Caçadores Paraquedistas, comandado pelo último oficial, iniciativa que se revela inconclusiva.
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DIA 22
00h01 – A partir do início deste dia, todos os delegados do Movimento nas unidades entram em estado de alerta, preparados para receber o contacto do agente de ligação, portador das instruções finais.
– A Escola Prática de Transmissões (EPTm), localizada em Sapadores, recebe autorização do Estado-Maior do Exército (EME), por proposta do tenente-coronel Garcia dos Santos, para o estabelecimento de uma linha directa com o RE 1, da Pontinha, numa extensão de 4 quilómetros. Inicia-se, sem demora, a sua instalação, efectuada por uma equipa comandada pelo furriel Cedoura, que ficará concluída em menos de 24 horas. Tal iniciativa viria a permitir ao Posto de Comando do MFA o acesso permanente às escutas das redes de transmissões militares e das forças de segurança, missão de apoio técnico cometida à primeira unidade militar, em que se destacaram os capitães Fialho da Rosa, Veríssimo da Cruz e Madeira.
c. 11H00 – O capitão FA Costa Martins contacta João Paulo Dinis, no Rádio Clube Português (R.C.P.), por incumbência de Otelo, que o tivera como subordinado no Comando Chefe na Guiné, com o objectivo de emitir um sinal radiofónico para desencadear o movimento. O radialista, que desconhecia o emissário, desconfia da sua identidade, mas aceita, depois de muito instado, aprazar um encontro entre os três, nessa noite, num bar lisboeta.
Noite – Reunião de Otelo, na Reboleira, com os grupos de comandos coordenados pelo major Jaime Neves
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DIA 23
00h15 – Otelo Saraiva de Carvalho e Costa Martins, protegidos pelo major FA Costa Neves, avistam-se, no Apolo 70, com João Paulo Diniz. Este esclarece que apenas colabora no programa matutino Carrocel do R.C.P., razão pela qual não poderá emitir a senha pretendida. Obtêm, contudo, a garantia de transmissão do seguinte sinal, entretanto combinado, “Faltam cinco minutos para a meia-noite. Vai cantar Paulo de Carvalho «E depois do adeus»”, através dos Emissores Associados de Lisboa (E.A.L), que apenas dispõem de um raio de alcance de cerca de 100 a 150 quilómetros de Lisboa. A limitada potência do emissor torna, assim, necessária a emissão de um segundo sinal, através de uma estação que alcance todo o País.
– Deslocam-se, seguidamente, para junto da Penitenciária de Lisboa, onde aguardam que o ex-locutor do Programa das Forças Armadas em Bissau obtenha informação no Rádio Clube Português sobre a constituição da equipa que entrará de serviço na madrugada de 25. Este apura que o serviço de noticiário estará a cargo de Joaquim Furtado mas, conhecendo-o mal, não arrisca estabelecer contacto.
Manhã – Otelo carrega, no porta-bagagem do seu automóvel, estacionado na Academia Militar, os aparelhos rádio Racal, obtidos por Garcia dos Santos, que se destinam às unidades que não dispõem de material de transmissões, designadamente o Centro de Instrução Anti-Aérea e da Costa (CIAAC) e o Regimento de Cavalaria 3 (RC 3).
Final da manhã – Álvaro Guerra, contactado por Almada Contreiras em nome do Movimento para conseguir a emissão de um sinal radiofónico de âmbito nacional que sirva de código para o desencadeamento das operações, solicita a Carlos Albino, seu colega no República e um dos responsáveis pelo Limite – um programa independente que aluga tempo de antena à Rádio Renascença – a transmissão, no início da madrugada de 25 de Abril, da canção Venham mais cinco, de José Afonso. Carlos Albino pede a Álvaro Guerra para devolver a resposta de que tal canção estava proibida pela censura interna da Renascença. Sugere alternativas, entre as quais Grândola, Vila Morena.
15h00 – Otelo entrega ao major Neves Rosa os documentos finais para policopiar (anexo de transmissões, alterações de missão, indicação do grupo data-hora (GDH) de execução, modo de confirmação da Hora H e a senha e contra-senha a utilizar nos contactos com tropas). Esta missão é efectuada num período inferior a três horas, numa firma de artigos electrónicos na Rua Luciano Cordeiro, 78, pertencente ao referido oficial que coordena o sector da ligação operacional, coadjuvado pelo capitão Sousa e Castro.
Tarde – Encontro de Otelo com o tenente-coronel de cavalaria Correia de Campos, num bar na zona do Rego (Lisboa), onde o último aceita participar no Movimento e assumir o comando do Regimento de Cavalaria 7, coadjuvado pelos tenentes Cid, Cadete e Aparício, logo que concretizada a detenção dos oficiais superiores daquele regimento que deveria ser efectuada por grupos de comandos coordenados pelo major Jaime Neves.
18h00 – Otelo inicia, na Avenida Sidónio Pais, junto ao Parque Eduardo VII, a entrega dos sobrescritos lacrados contendo as instruções finais, bem como de um exemplar do jornal Época – porta-voz do regime, código escolhido para identificar as equipas de ligação (dois oficiais por unidade, circulando cada um na sua viatura e seguindo preferencialmente itinerários diferentes, de modo a prevenir diversas eventualidades) – e, ainda, em alguns casos, material de transmissões.
20h00 – Na residência do comandante Vítor Crespo, no Restelo, realiza-se uma reunião final de Otelo e Vítor Alves com representantes da Armada, nomeadamente os comandantes Geraldes Freire e Abrantes Serra, onde foi obtida a garantia da neutralidade das forças da Marinha.
– O capitão Santa Clara Gomes, oficial de ligação, procede à entrega, na residência do capitão Teófilo Bento, da ordem de missão referente à Escola Prática de Administração Militar (EPAM).
2?h00 – Otelo decide pernoitar, por razões de segurança, no RE 1.
23h00 – Chegada a Santarém dos capitães Candeias Valente e Torres, oficiais do Movimento, portadores da ordem de operações para a Escola Prática de Cavalaria. Comunicam telefonicamente com o tenente Ribeiro Sardinha informando que já se encontram na cidade, na Pastelaria Bijou. Este contacta Salgueiro Maia.
23h30 – O capitão Salgueiro Maia desloca-se à Pastelaria Bijou, no Largo do Seminário, em Santarém, para se encontrar com os agentes de ligação.
23h55 – Na viatura de Salgueiro Maia, estacionada junto ao Jardim da República, é-lhe entregue a ordem de operações e acertados os últimos detalhes. Uma viatura da PIDE/DGS ronda a zona e segue o capitão à distância.
PEDIMOS DESCULPA PELA INTERRUPÇÃO. A CONSPIRAÇÃO CONTINUA DENTRO DE MOMENTOS.