Durante o mês de Maio, “Um Café na Internet” , sempre neste horário das oito horas, publicará poemas relacionados com o trabalho. Convidamos todos os argonautas e visitantes a enviarem-nos poemas sobre este tema – o trabalho, os trabalhadores. Hoje publicamos um poema de Manuel da Fonseca:
Manuel da Fonseca (1911-1993)
Coro dos empregados da câmara
É tão vazia a nossa vida,
é tão inútil a nossa vida
que a gente veste de escuro
como se andasse de luto.
Ao menos se alguém morresse
e esse alguém fosse um de nós
e esse um de nós fosse eu…
… O Sol andando lá fora,
fazendo lume nos vidros,
chegando carros ao largo
com gente que vem de fora
(quem será que vem de fora?)
e a gente práqui fechados
na penumbra das paredes,
curvados prás secretárias
fazendo letra bonita.
Fazendo letra bonita
e o vento andando lá fora
rumorejando nas árvores,
levando nuvens pelo céu,
trazendo um grito da rua
(quem seria que gritou?)
e a gente práqui fechados
na penumbra das paredes,
curvados prás secretárias
fazendo letra bonita,
enchendo impressos, impressos,
livros, livros, folhas soltas,
carimbando, pondo selos,
bocejando, bocejando,
bocejando.