“ÉRAMOS BARRACAS” por clara castilho

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Com realização de Edgar Feldeman, vi na RTP2 o filme “Éramos barracas” que nos dá a conhecer o Bairro da Curraleira, em Lisboa, pela voz de alguns dos seus habitantes, das suas vivências, das suas memórias e das suas expetativas para o futuro.

Depois de uma realidade de casas sem água, sem luz, sem canalização nem casas de banho, depois do 25 de Abril de 1974 os seus moradores organizaram-se e formaram uma cooperativa. Hoje moram num bairro social. E nem todos acham que tudo melhorou.

“Antes podíamos ter confiança, dormíamos de porta aberta”… “Havia mais união, agora é cada um por si, de nariz empinado!”

“Passei muita fome, não tinha dinheiro para comprar sapatos, levava porrada do meu marido”. “ Ia pedia a casas de senhoras: “Ó menina, dê-me um bocadinho de pão duro” – e eu fazia uma sopinha”. Uma mulher idosa dizia: “ Gostava mais da minha terra que era a Curraleira, a minha mãe morou ali 82 anos”, mostrando fotos dos seus antepassados que serviram o rei.

“Mas hoje eu posso falar, dizer o que penso e graças a deus não passo fome!”. Podemos ouvir uma mulher contar, orgulhosa, como sabia bem lavar a roupa dos tanques colectivos e era elogiada por o fazer muito bem, sentindo-se nostalgia na sua voz.

As filmagens apanharam dias de grande calor. As crianças andam de tronco nu, uma menina de bikini  a dançar com outra, uma velhota a dar conselhos a um pai que passeia um bebé nos braços… Vamos vendo os prédios de
paredes pintadas de vermelho, mas já todas estragadas, o cafezinho de bairro, um grupo de homens a comerem caracóis e a beber cervejas numa mesa montada na rua. E crianças a brincarem na rua, a empurrarem carrinhos de bebé sem bebés lá dentro, rua abaixo, rua acima….

E os animais, ah! os animais que descansam ao sol – cavalos, cabras, ovelhas, e outra vez cavalos, cães, muitos cães lânguidos. Vemos os animais e sentimos que o tempo não passa, as horas não avançam, tudo fica na mesma. Como se estivéssemos numa aldeia dentro da cidade.

A interligação com pessoas de etnia cigana é também abordada: “Eles têm que se integrar na comunidade”; “Agora há condições, mas depende do que nós façamos … se escolhermos mal…”

Este é também o meu país. Este é um filme que pode servir de base de estudo a muitos técnicos que andam no terreno, sem saberem quem são as pessoas que têm pela frente, e a quem tentam impor os seus próprios valores, sem respeitarem os sentimentos e as histórias das comunidades. É por isso que tantas vezes tudo corre mal, os projectos pretensamente inovadores vão por água a baixo e não se aproveitam as sinergias já existentes.

Obrigada ao Edgar e a quem com ele trabalhou.

Não encontrei nenhum vídeo sobre o filme. Fica o Sérgio Godinho a falar destas coisas, há uns bons anitos atrás.

   

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