Herberto Helder – Portugal
( 1930 – )
“SEI ÀS VEZES …”
Sei às vezes que o corpo é uma severa
massa oca, com dois orifícios
nos extremos:
a boca, e aos pés a dança com a coroa de labaredas
– a cratera de uma estrela.
E que me atravessa um protoplasma
primitivo,
uma electricidade do universo,
uma força.
E por esse canal calcinado sai
um ruído rítmico, uma fremente
desarrumação do ar, o verbo sibilante,
vento:
o som onde começa tudo – o som.
Completamente vivo.
(de “Poesia Toda”)
Talvez a mais exuberante personalidade poética que se manifestou na segunda metade do século XX. A sua poesia, com fortes conotações surrealistas, conheceu sempre a marca do experimentalismo, tendo sido um dos grandes animadores de “Poesia Experimental 1 e 2”. Os seus primeiros textos (“O amor em visita”, 1958; “A colher na boca”, 1961) trouxeram para a poesia portuguesa um sinal indelével de novidade. Citem-se ainda, entre outros possíveis: “Ofício cantante” (1967), “Vocação Animal” (1971), “Cobra” (1977), “Flash” (1980, “Poesia Toda” (1990).