Selecção, adaptação e tradução por Júlio Marques Mota
Deutschland über alles ? por Theux, em L’Espoir
Está conseguido. A Alemanha acaba de conseguir o impensável para uma economia ocidental. De acordo com a OCDE, a Alemanha deve obter um excedente comercial relativamente à China. Portanto, a Alemanha ultrapassaria assim a “fábrica do mundo”. Bravo senhora Merkel! Bravo Senhor Schröder! O vosso sucesso é total e até mesmo os Estados Unidos admiram a vossa capacidade de exportar apesar dos altos níveis de salários. Nicolas Sarkozy nunca escondeu o seu desejo de importar este modelo para a França e Hans – Peter Keitel, o chefe da Federação da indústria alemã, tem completamente razão quando desanca sobre o “modelo francês”. É necessário construir uma Europa à imagem da Alemanha, forte, poderosa, exemplar, disciplinada. A menos que tenhamos que nos opor a este passageiro clandestino?
O anúncio de Mario Draghi indicando que o BCE está empenhado em comprar dívidas de 1 a 3 anos dos países com problemas e que o fará sem limites, não é na verdade uma boa notícia. Na realidade, isto é mais uma prova da dominação sem partilha da Alemanha. Como já o dissemos anteriormente, os líderes da UE estão prontos a tudo para impor as medidas neoliberais até mesmo a monetizar a dívida desde que seja feita sob certas condições. Claramente, os países em dificuldades podem dirigir-se ao BCE que concordará em financiar as suas dívidas, através de instituições financeiras naturalmente, na condição de que o país proceda às reformas pelo BCE julgadas necessárias. Isto significa a adopção de medidas neoliberais, como o desmantelamento do Código do Trabalho e a flexibilização do mercado de trabalho ou a aplicação duma austeridade insustentável sobre as despesas sociais e de saúde assim como a considerada optimização das despesas públicas. Com uma tal anúncio, a Alemanha sai reforçada pois que a sua política é apoiada e em que novas armas passam a estar à sua disposição.
Analisemos agora as razões para o primeiro excedente comercial da Alemanha relativamente à China desde 1988. É uma verdadeira proeza se nós considerarmos que a China se tornou a ‘fábrica’ do mundo e o primeiro exportador mundial. Nos media , os analistas não deixam de se referir ao “perigo” que representaria a China e sobre a importância da redução da nossa dívida para não passarmos a ser “escravos” do Império Médio. Se a Alemanha conseguiu ” vencer ” a China, é pois importante adoptar o seu modelo. Então, nós louvamos a qualidade da indústria alemã da BMW ou da Mercedes em comparação com os fracassos da Renault ou Peugeot.
Com efeito, a análise dos números do excedente comércio alemão relativamente à China, mostra-nos que este último resulta mais da queda das importações alemãs (menos 7,9%) do que do crescimento das exportações (mais 1,5%). Esta reflexão mostra‑nos a extrema fragilidade da imagem transmitida pelos nossos meios de comunicação sobre o poder da indústria alemã. A face oculta do modelo alemão aparece em plena luz do dia: o enorme aumento da precariedade.
Enquanto os alemães foram capazes de desenvolver uma indústria de grande eficácia mas fizeram-no essencialmente à custa da deflação salarial. Esta política de passageiro clandestino foi realizada à custa dos seus principais parceiros europeus que financiaram o crescimento alemão, enquanto que esta última sufocava a sua própria procura interna .
No final, quem é o verdadeiro vencedor com uma tal política? Os parceiros económicos da Alemanha na UE? A Itália, a Espanha e a França viram os seus respectivos défices a aumentar e de forma abismal. Os assalariados alemães que finalmente poderão colher os benefícios de seus pesados sacrifícios? Destatis (a versão alemã do nosso INE) indica que se verificou um aumento na pobreza no período entre 2010 e 2011 na maioria dos Estados federados. Não, os grandes vencedores são os principais dirigentes da indústria alemã ou os grande accionistas que acumulam os lucros redistribuindo-os com bastante moderação.
Qual a importância para os trabalhadores alemães, que o seu país seja o campeão das exportações, se eles estão a ficar mais pobres? É certo, isso irá promover o excedente do comércio alemão como se observou relativamente à China, mas quê e para quem?
Se o modelo alemão consiste em melhorar a competitividade ao mesmo tempo que se empobrece então este não apresenta nenhum interesse. Sem ofensa para os Baverez, Minc ou Barbier, o modelo alemão não é único. A França não tem a vocação de restaurar a escravatura para maximizar a sua competitividade! Porque é exactamente isso, Senhores Deputados, que está subjacente no vosso discurso, nas vossas conclusões.