UM ORÇAMENTO QUE AGRAVA AS DESIGUALDADES E PROLONGA A RECESSÃO ECONÓMICA E AUMENTA O DESEMPREGO – por EUGÉNIO ROSA – II

(continuação)

CORTES BRUTAIS NOS SALÁRIOS DA FUNÇÃO PÚBLICA, NAS PENSÕES E EM OUTRAS PRESTAÇÕES SOCIAIS, E AUMENTOS RIDÍCULOS DE IMPOSTOS SOBRE OS DETENTORES DE RENDIMENTOS DE CAPITAL

Como consta do quadro inserto na pág. 48 do Relatório do OE2014, o governo pretende cortar 3184 milhões € na despesa pública em 2014, sendo 1.320 milhões € nas despesas com os trabalhadores da Função Pública (corte de salários e de suplementos atingem 796 milhões €, despedimentos, colocação na situação de requalificação a receber apenas 40% do salário base, etc.); 891 milhões € nas prestações sociais (só nas pensões de aposentação e de sobrevivência o governo pretende fazer um corte de 828 milhões €), e mais 460 milhões € nas prestações sociais em espécie fornecidas à população (só nos cuidados de saúde o governo pretende cortar mais 207 milhões €). Portanto, só nestas três rúbricas que atingem principalmente os trabalhadores da Função Pública e os pensionistas o governo PSD/CDS pretende, em 2014, fazer um corte nos seus rendimentos que atinge 2.671 milhões €, o que corresponde a 83,9% do corte total de despesa pública que o governo pretende fazer em 2014. Mas não se pense que o ataque brutal às condições de vida dos trabalhadores e dos pensionistas da Função Pública fique por aqui. De acordo com dados constantes do mesmo quadro, o governo pretende aumentar, em 2014, as contribuições dos trabalhadores e dos aposentados para a ADSE, SAD e ADM em 132 milhões €, o que se traduzirá por mais um corte nos seus rendimentos, sendo um valor superior ao “aumento da contribuição do setor bancário” em 2014 que será apenas de 50 milhões €, ou da “contribuição extraordinária sobre o setor energético” que atinge apenas 100 milhões €, o que levou os acionistas chineses da EDP e da REN a ameaçarem o governo com represálias, numa clara demonstração que também estes “senhores” não respeitam a soberania do país, estando apenas interessados, à velha maneira capitalista, em sacar o máximo lucro.

O CORTE NAS REMUNERAÇÕES  DA FUNÇÃO PÚBLICA, CONJUGADO COM O ENORME AUMENTO DE IMPOSTOS QUE SE MANTEM EM 2014,  DETERMINA QUE, ENTRE 2011 E 2014, O PODER DE COMPRA DOS TRABALHADORES DIMINUA EM 20%

Na pág. 50 do Relatório do OE2014 encontra-se o quadro II.3.5 onde se apresentam simulações de cortes, utilizando a formula constante do artº 33º da proposta de lei OE2014 que o leitor também poder usar para o seu caso e que é – 0,025 + ((0,12-0,025) x (( Valor da remuneração – 600) : (2000-600))) – ver pág. 31 da proposta de lei que está disponível em www.dgo.pt; repetindo, utilizando esta formula é apresentado na pág. 50 do relatório um quadro com várias simulações de cortes para remunerações de 600€, de 700€, de 800€, etc. E como não são feitas para valores de remunerações entre os 600€ e 700€, o governo tem procurado fazer passar a mensagem junto da opinião pública que tais valores estão isentos de cortes. No “Esclarecimento sobre as reduções remuneratórias aplicadas à função” pública insinua mesmo que os cortes de 2011 aprovados pelo governo de Sócrates, e mantidos em 2012 e 2013 pelo atual governo, são superiores aos que o governo pretende fazer em 2014.

Em primeiro lugar, é importante lembrar que os cortes nas remunerações dos trabalhadores da Função Pública de Sócrates em 2011 só se aplicavam às remunerações superiores a 1.500€ e variavam entre 3,5% e 10%. O que aconteceu em 2012, é que o governo PSD/CDS se apropriou inconstitucionalmente dos subsídios de férias e de Natal dos trabalhadores da Função Pública, façanha essa que tentou repetir em 2013, o que foi impedido pelo Tribunal Constitucional. Em 2014, o governo pretende fazer um corte nas remunerações não a partir de 1.500€ mas sim de 600€. E existem na Função Pública centenas de milhares de trabalhadores que ganham menos de 1.500€/mês. O quadro 1 mostra o valor dos cortes-2014

cortespensões - IVEm 2013, os trabalhadores da Função Pública com remunerações inferiores a 1.500€ não sofreram quaisquer cortes nas suas remunerações. Mas em 2014, o governo pretende fazer cortes, que variam entre 16€ e 129€ como mostra o quadro 1,  nas remunerações dos trabalhadores que recebem entre 600€ e 1.500€. E de acordo com a Direção Geral de Emprego Público do Ministério das Finanças existiam, em 2013, 251.931  trabalhadores da Função Pública (43,8% do total) que tinham uma remuneração base ilíquida inferior a 1.500€ por mês. E mesmo se entrar com todas as outras formas de remuneração (suplementos, horas extraordinárias, etc.) continuavam a existir 214.671 trabalhadores (37,3% do total) que tinham uma remuneração total ilíquida (ganho médio ilíquido)  inferior a 1.500€ por mês. O grupo dos “assistentes operacionais”, por ex., com 130.000 trabalhadores recebem uma remuneração base média ilíquida de apenas 611 € por mês.

E os cortes nas remunerações ilíquidas totais que podem sofrer os trabalhadores da Função Pública em 2014 serão certamente superiores aos que se poderá concluir dos valores do quadro 1. E isto porque segundo a alínea a) do nº4 do artº 33º da proposta de lei “Consideram-se «remunerações totais ilíquidas mensais as que resultam do valor agregado de todas as prestações pecuniárias, designadamente remuneração base, subsídios, suplementos remuneratórios, incluindo emolumentos, gratificações, subvenções, senhas de presença, abonos, despesas de representação e trabalho suplementar, extraordinário ou em dias de descanso e feriados”. Só “não só consideradas os montantes abonados a título de subsídio de refeição, ajuda de custo, subsídio de transporte ou o reembolso de despesas efetuado nos termos da lei e os montantes pecuniários que tenham natureza de prestação social”.

Contrariamente àquilo que o governo pretende fazer crer no “Esclarecimento sobre as reduções remuneratórias aplicadas à função pública” divulgado em 18-10-2013, o corte nas remunerações que pretende fazer em 2014, a concretizar-se, determinará uma forte redução na remuneração liquida total dos trabalhadores da Função Pública e, consequentemente, no seu poder de compra e nível de vida. Tomando como base de cálculo o ganho médio ilíquido na Função Pública que é atualmente 1.750€, segundo a DGAEP, o enorme aumento de impostos verificado em 2013 que se mantem determina uma redução no ganho médio liquido de 5,8% e o corte nas remunerações em 2014 causa uma nova redução estimada em – 8,8%. Portanto, o efeito conjugado do aumento enorme de impostos, que se mantem em 2014, e do corte de remunerações em 2014 determinará que, entre 2011 e 2014, ou seja em apenas três anos, o ganho médio líquido dos trabalhadores da Função Pública diminua  em 14,1%. Se consideramos o aumento de preços verificado neste período conclui-se que, só entre 2011 e 2014, os trabalhadores da Função Pública perdem cerca de 20% do seu poder de compra.

A CES TAMBÉM SE APLICA A PENSÕES DE APOSENTAÇÃO COM CORTES DE 10% EM 2014

O governo tenciona manter em vigor em 2014 a Contribuição Extraordinária de Solidariedade  que se aplica apenas aos pensionista da Segurança Social e da CGA. E mesmo em relação aos aposentados da Função Pública, a quem o governo pretende cortar 10% nas pensões (o corte de 10% conjugado com o enorme aumento de impostos que se mantem em 2014, determina uma redução, entre2011 e 2014, na pensão liquida média estimada em 25,9%) que estão a ser pagas, o governo pretende aplicar a CES embora com algumas “adaptações”. E quais são essas adaptações? Segundo o nº 9 do artº 74º da proposta de Lei OE2014, “A CES apenas é acumulável com a redução das pensões da CGA operada no quadro da convergência deste regime com as regras de cálculo do regime geral de segurança social na parte em que o valor daquela exceda o desta”. Assim, para o aposentado da CGA, que sofre um corte de 10% na pensão que estava a receber, saber quanto ainda terá de pagar de CES terá de fazer o seguinte: (1) Calcular o valor da CES com base na sua pensão após o corte de 10% (a CES só se aplica a pensões de valor ilíquido superior a 1.350€; para pensões 1350€-até 1800€ a taxa a aplicar é 3,5% do valor da pensão; para pensões até 3750€: até 1800€ a taxa  é 3,5%; para o valor entre 1800€-3750€ a taxa é 16%; para pensões superiores a 3750€ a taxa que se aplica sobre o valor de toda a pensão ilíquida é 10%) (2) Comparar o valor obtido com o valor do corte que sofreu na sua pensão; (3) E enquanto o corte na remuneração for superior ao valor do CES, não tem de deduzir nada por CES, mas logo que o valor da CES  ultrapasse o valor do corte na pensão, tem de deduzir a diferença entre o corte e a CES à sua pensão. Para muitos aposentados é mais um corte.

(continua)

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Para ler a Parte I deste trabalho de Eugénio Rosa, vá a:

http://aviagemdosargonautas.net/2013/10/21/um-orcamento-que-agrava-as-desigualdades-e-prolonga-a-recessao-economica-e-aumenta-o-desemprego-por-eugenio-rosa/

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