RETRATOS, IMAGENS, SÍNTESE DOS EFEITOS DA CRISE DA ZONA EURO SOBRE CADA PAÍS

Selecção, tradução e nota introdutória por Júlio Marques Mota

UMA HISTÓRIA SOBRE LONDRES, SOBRE A GENTE NORMAL, SOBRE A GENTE BEM ESPECIAL

Nicholas Shaxson

Vanity Fair

Abril de 2013

Disponível em http://www.vanityfair.com/society/2013/04/mysterious-residents-one-hyde-park-london

PARTE V
(CONTINUAÇÃO)

The Candy Men Can

Nick e Christian Candy, os dois irmãos britânicos que montaram o projecto One Hyde Park, construíram as suas fortunas com o boom imobiliário que se verificou em Londres depois das privatizações soviéticas. Eles começaram com um empréstimo de US $9.300 concedido pela sua avó, compraram um elegante apartamento tipo T1 em Earl’s Court por $190.000 em 1995, renovaram-no e venderam-no depois com lucro no ano seguinte. Eles repetiram a cena e descobriram aí um novo nicho no mercado do topo de gama, acima do luxo tradicional. Em 1999 eles criaram a firma Candy & Candy, uma empresa de design de interiores, aprimorando as suas capacidades em iates, aviões privados e em clubes por constituído por membros privados, com paredes em seda pintada à mão e almofadas em que cada peça custava por peça US $3.200.

Graças a uma estratégia de negócios agressiva, hiperactiva (para não falar ainda de um mercado crescente), estes irmãos subiram muito alto, muito rápido. “Os irmãos Candy são dois jovens fanáticos que eram bastante destemidos na sua abordagem às pessoas e onde sentiam que havia dinheiro,”, diz Andrew Langton. “Eles perceberam que o bling era o que lhes interessava, seja através de um iate, de um avião ou de um apartamento caro. Há aqui uma cultura de decoração, uma cultura de segurança, de privacidade, que eles bem entenderam”.

O chic inglês desprezível estava já gasto, os serviços de portarias de luxo, as paredes forradas a pele e à prova de bala também já se tinham ido. É um mercado difícil de acertar, e Abrahmsohn referencia a enorme diversidade de gostos que agora se abraçam. “Os gregos são os mais subestimados de todos os compradores, incluindo os britânicos,” diz ele. “Os nigerianos são muito extravagantes. Eles gostam de muitas cores e muito brilhantes, brilho e brilho. Eles não são tímidos. Os russos são bastante descontraídos, mas eles gostam do seu fausto.» Os indianos decoram as suas casas em estilo super luxuoso, continua ele a explicar-nos. “Muitos detalhes, muitas cores, extremamente ornamentadas, muitas prendas, muitas… Louis XIV iria ser aqui bastante depreciado, por demasiado simples para os gostos destas gentes. “

onehydepark - VIILegenda: The formal reception at One Hyde Park: The 4,200 sq/ft flat boasts five bedrooms, all en-suite. The new owner will now have to pay £1.88million to the government in stamp duty, but pay no more than £1,361-a-year in council tax

De alguma forma, os Candys encontraram o seu caminho através desse labirinto, e em 2001, eles venderam um apartamento por US $6,2 milhões em Belgrave Square ao oligarca russo Boris Berezovsky, que tinha fugido para se refugiar em Londres depois de ter sido acusado de fraude e apropriação indevida. Conforme descrito em Londongrad, ele tinha “um sistema de câmaras de CCTV à prova de bala, um sistema de entrada com impressão digital que podia fazer lembrar 100 impressões digitais, um controle remoto para cinema e televisão com écrans nas paredes da casa de banho, alarmes de raios laser e bombas de fumo. Um sistema electrónico reconhecia a música preferida dos moradores e os programas de TV e seguia-os de uma sala para outra.”

“Os russos são criaturas de hábitos” explica Hollingsworth. “Quando Berezovsky comprou em Belgrave Square, o oligarca russo Abramovich comprou ao virar da esquina em Lowndes Square, ao lado de Harvey Nichols e  Chester Square. Eles são como chefes de gangs num pátio de escola e a gostarem de se exibir: ‘a minha casa é maior que a tua ‘. “Na sequência da venda a Berezovsky, ganhou-se uma aura em volta dos irmãos Candy à medida em que os novos russos que iam chegando exigiam comprara as propriedade de Candy & Candy.

Em 2004, Christian Candy reconfigurou o grupo CPC, registado no paraíso fiscal de Guernsey, para fazer face a projectos bem maiores, incluindo, eventualmente, One Hyde Park. Num mercado em rápido crescimento, com mais e mais compradores vindos cada vez mais de mais partes do globo, os Candys sabiam que poderiam pedir a lua e obtê-la. Quando eles lançaram as vendas de apartamentos das torres One Hyde Park, em 2007, os típicos preços de topo de Londres eram de $29000 por metro quadrado, com picos à volta de US $45000. No primeiro ano de vendas de One Hyde Park, o preço subiu para US $88000 e para US $109.000 no ano seguinte, alcançando, por fim, no ano passado quase US $120,000. Os preços em Nova York ocasionalmente correspondem ocasionalmente a estes níveis: recentemente um oligarca russo comprou a vivenda de Sanford I. Weill na 15 Central Park West por um pouco mais de US $130.000 por metro quadrado — mas isto era considerado uma anomalia. De acordo com Susan Greenfield, vice-presidente para os correctores de imóveis Brown Harris Stevens em Nova York, as vendas para os prédios em construção em 2012 são em média US $61.000 por metro quadrado. “One Hyde Park mudou o mapa,”, diz o consultor de propriedades Davidson. “Os preços estavam fora da escala — fiquei atónito. Isso criou um mercado próprio.”

Vivendo no quadro de uma bolha de elite, os irmãos parecem ter uma orelha de tísico para o estado dos seus clientes. No final de 2010, a meio de uma forte austeridade a nível nacional, irromperam em mais de 50 cidades por toda a Grã-Bretanha os protestos sobre os impostos, em movimentos de protesto liderados por um movimento chamado Uncut. Eles protestavam contra a evasão fiscal organizada pelas grandes empresas e por outras figuras proeminentes como o multimilionário da venda a retalho Philip Green. Em Dezembro do mesmo ano, os irmãos Candy jogaram o Monopoly com um repórter do Financial Times no apartamento de Christian no One Hyde Park. No jogo Christian parou na casa “Imposto de Luxo”. “O quê!” disse ele e pôs-se a chorar e a gritar. “Eu não pago impostos. Eu tenho residência num paraíso fiscal e, por isso mesmo, não pago impostos.” (Um porta-voz dos Candys negou que Christian, que é um residente no Mónaco e em Guernsey, tenha dito isso.)

Revelações subsequentes do London Sunday Times e de outros media sobre a dimensão dos detentores de apartamentos de One Hyde  Park provocou um novo escândalo na Grã-Bretanha, e o governo ficou sob intensa pressão para reprimir a situação. O Chanceler George Osborne, observando que o tratamento de zero-imposto sobre a venda de propriedades compradas através de empresas sediadas nas regiões offshore “desperta a ira de muitos dos nossos cidadãos,” introduziu novas propostas legislativas, agora a entrarem em vigor, para, entre outras coisas, aplicar um imposto de transacções sobre o valor da vendas de até 15 por cento sobre as propriedades compradas através de empresas offshore e cobrar uma taxa anual que pode ir até US $221.000 nas propriedades mais caras detidas em regime de offshores. Muitos britânicos em grandes dificuldades pelas políticas de austeridade aplicadas congratularam-se com esta legislação. Um indignado como Nick Candy chamou-lhes de “leis absolutamente lamentáveis”.

(continua)

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Para ler a Parte IV deste texto de Nicholas Shaxson, publicada ontem em A Viagem dos Argonautas, vá a:

RETRATOS, IMAGENS, SÍNTESE DOS EFEITOS DA CRISE DA ZONA EURO SOBRE CADA PAÍS

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