VAMOS BEBER UM CAFÉ? – 21 –  por José Brandão

Imagem1

DO BOTEQUIM AO CAFÉ (PEQUENA HISTÓRIA DOS GRANDES CAFÉS DE LISBOA – cont.)

AS BRASILEIRAS DO CHIADO E DO ROSSIO.

A do Chiado apareceu em 1905. Veio para vender o genuíno café do Brasil, de Minas Gerais, e ainda lá está nos mesmos números 120 e 122. Tem nova cara, que o restauro de 1922 lhe veio trazer. Ficou com pinturas trabalhadas por Stuart Carvalhais, Eduardo Viana, José Pacheko, Jorge Barradas, Almada Negreiros e tudo o que seria a “nova vaga” daquela época. Tem história grande, enorme, este café A Brasileira do Chiado, que queria vender o melhor café de Lisboa mostrando um cartaz com um velho desdentado segurando uma chávena e oferecia, no princípio, gratuitamente aos seus clientes de café a peso, uma chávena da deliciosa infusão.

Esteve já ameaçado de morte, mas continua a ser a Brasileira do Chiado. Ainda não foi a leilão, em hasta pública, como esteve para acontecer em Agosto de 1960 com execução ordenada pelo distrito do Tribunal de Execuções Fiscais.

Tem tido mais sorte do que teve a sua congénere do Rossio, fundada em 1911. Esta era a Brasileira preferida dos republicanos e de tudo o que tinha a ver com o Partido Democrático de Afonso Costa. Foi mais um dos grandes cafés que Lisboa viu nascer nos primeiros anos deste século. Eram os anos da locura, do frenesim desenfreado. Escrevia-se aos amigos com este tom: “Escrevo-te ainda sob os efeitos da noitada. Aqui, um homem perde a cabeça, tantas são as sereias setinosas, que não se sabe ao certo se Lisboa é a saída do Céu ou a entrada fatal no Inferno. Ontem foi uma pândega: passeios com as primas, jantar no Leão d’Ouro, com ostras à valenciana, uma representação do Frei Luis de Sousa e a companhia de duas espanholas que fui buscar à saída do teatro para uma ceia no Tavares Rico com rapaziada do tempo de Coimbra.

A Brasileira - I

Oh menino, isto é que é cidade! Pega nos postais que te mando e imagina-te por aqui.”

Aumentava a cada momento o número de novos cafés em Lisboa. Havia-os para todos os gostos e facções. Uns mais para gente das letras, outros para aficionados da festa brava, para músicos, poetas e políticos, para o que fosse preciso. Nas suas memórias, Raul Brandão recorda: “É na Brasileira e no café Chiado que os pobre diabos, como rãs num charco de café, se exaltam ou combinam as revoluções do dia seguinte.”

«Fui hoje ao café Gelo ver o sítio onde o Buíça se reunia com os amigos. O café é já de si curioso, com duas salas de aspeto completamente diverso, uma para o Rossio, de aparato; outra, nas traseiras, baixa, para os fregueses envergonhados, com portas para a Rua do Príncipe. Era ali, naquela mesa, do canto, à direita de quem entra pelas traseiras, que o professor se juntava com os outros e passavam horas a conversar baixinho.

– Eram muitos?

– Às vezes doze ou quinze – diz o criado. – E ficavam até tarde em grandes discussões…» – Raul Brandão, Memórias –I

Leave a Reply