ONTEM, NÃO FOI UM DIA BOM PARA A ARGENTINA, por MATT LEVINE

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Selecção, tradução e introdução por Júlio Marques Mota

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Ontem, não foi um dia bom para a Argentina

 

Yesterday Was Not Argentina’s Day, por Matt Levine

Bloomberg View, 31 de Julho de 2014

 Matt Levine

Parte II

(continuação)

… 

Por outro lado, há rumores de progressos tendo sido já feitas algumas propostas criativas, com os bancos a comprarem os títulos. E até na  medida em que todos estes especuladores detêm CDS, swaps  de crédito contra a Argentina, os swaps (provavelmente) tem sido desencadeados e (provavelmente) terão como resultado um grande pagamento, o que pode levar a que os holdouts  se tornem mais  inclinados a chegar a um acordo agora do que ontem.(4) E penso  que a demonstração de querer chegar a um acordo pela parte da Argentina ontem irá  melhorar a sua credibilidade nas negociações. Se cada um de nós  fosse um destes investidores   obrigacionistas e se pensarmos:  “bem mas a Argentina nunca  pode nunca pagar nem a  nós ou a  qualquer outra pessoa,”  nós teríamos que  re-avaliar a teoria.(5) Pensando bem e mesmo que pareça uma loucura, isto,  às vezes é uma boa estratégia de negociação.

Pagamentos em euros :

Se não há  uma solução de curto prazo então, em seguida, o que é que vai acontecer? Continuo intrigado com a possibilidade dos detentores de títulos expressos em euros poderem  ser pagos. Agora Griesa  intimou basicamente toda gente no mundo  a não aplicar dinheiro na  Argentina. Mas há um argumento muito bom de que os pagamentos dos títulos da Argentina denominados em euros nunca sejam feitos a passarem  através da jurisdição do juiz: a Argentina dá o dinheiro a um banco em Buenos Aires, que transfere para um banco em Frankfurt, que o detém como depósito em  nome de um banco de  Bruxelas, que o transfere para Londres em nome de Câmaras de Compensação na Bélgica e no Luxemburgo, que paga aos detentores de títulos. Ou qualquer coisa parecido .(6) E se for assim, então a lei belga e a luxemburguesa exigem realmente aquelas câmaras de compensação para repartir o dinheiro se Argentina o enviar para esse efeito.(7) Assim,  os detentores de títulos de troca  que têm títulos denominados em euros podem ser capazes de convencer os tribunais na Europa, a ordenar que lhes sejam pagos..–e essas ordens podem ser eficazes, uma vez que estes se situam inteiramente fora da jurisdição dos EUA.

Isto não seria grande coisa para ninguém.  Os detentores de títulos antigos ainda continuariam a não receber. A Argentina poderia ainda estar em incumprimento e a não ter  acesso aos mercados de capitais. Os detentores de títulos de troca com títulos expressos em  dólares  americanos  não  ficariam a receber nada.  E o sistema legal dos Estados Unidos poderia sentir-se   ignorado, depois de todo esse drama. Penso  que os detentores de títulos em  euros ficariam felizes com este final feliz, ou  happy-ish, penso. .

Oferta de troca de títulos :

Há também a possibilidade de uma oferta de troca. Existem várias formas para o fazer, presentemente, mas a ideia básica é que a Argentina se ofereça  para trocar os seus títulos não pagáveis em troca de novos títulos pagáveis.  A forma simples é: dêem-nos os vossos títulos expressos em dólares ou euros e nos dar-vos-emos  novas obrigações ao abrigo da lei da Argentina, pagáveis em Buenos Aires, denominados em dólares ou euros. (Se os obrigacionistas detentores de títulos em euros podem ser pagos em  euros  e, em seguida, outra opção poderia ser: dêem-nos os vossos  títulos expressos em  dólares americanos  e nós dar-lhes-emos  novas obrigações em euro sob a lei inglesa pagável em Bruxelas.)

Tudo isso é um desafio porque muitos titulares não querem ter nada designado em termos da lei da Argentina, (8) e porque Griesa tem encorajado realmente   uma troca. Então realmente ninguém se poderia atirar contra os detentores de títulos nos Estados Unidos, e seria difícil fazer mecanicamente as etapas para executar  a troca porque os administradores dos fundos  e assim por diante estariam relutantes em se envolver.

Um gestor de hedge fund de um mercado emergente e que é meu  conhecido sugeriu uma solução inteligente, que eu irei explicar numa nota de pé de página.(9) A ideia é fazer uma oferta segundo a regra  “pari passu” nas mesmas condições para todos—sejam os que aceitaram em tempos a troca sejam aos que se tornaram resistentes a essa troca, os holdouts, a fim de cumprir a determinação do juiz  que exige igualdade de tratamento. Mas fazer isso sem recompensar de modo nenhum os abutres, os holdouts  através da torção pretendida de fazer a oferta nas mesmas condições para todos com base nos valores  de pre-2001! Por  outras palavras: apenas se está re-fazer  a oferta de troca de 2005, que a maioria dos detentores de títulos aceitou  mas em que alguns se recusaram a aceitar. E pode-se fazer isso  na base do  direito belga, para que Griesa não possa ajudar os abutres  da próxima vez.

(continua)

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(4) Embora eu pense que ontem estavam muito inclinados a resolver a questão, a chegarem a um acordo. A postura aqui parece ser a de  que os holdouts  proponham  soluções e que a Argentina diga “, não, os senhores podem  ter a oferta de  2005.”

De qualquer forma, eu escrevi ontem  sobre o problema dos  CDS. Não sei se os holdouts têm muito,  mas..–há somente  US $ 1 milhar de milhões  por liquidar,  pendentes..—e provavelmente  não deve ser um grande negócio.

(5) Joseph Cotterill sobre as  grandes  implicações:

A utilização da regra Pari passu é de facto o melhor tiro dos holdouts desde há  uma década. Se não funcionar agora — mesmo depois da bruma que tem envolvido o sistema de pagamentos de títulos e em que  outros credores tem sido envolvidas nisto — porque a resposta da Argentina é a de incumprimento´, seja de que maneira for, então um enorme  marco jurídico, de séculos sobre a  dívida soberana, de novo, vai sair totalmente para  fora  do alcance do mercado.

(6) Veja-se nota 5 acima   e a declaração emitida  pelo Bank of New York). O procedimento  é o seguinte :

  • A Argentina deposita em  euros numa conta no banco central argentino em nome do banco de Nova York.

  • Os euros são transferidos para uma conta do Deutsche Bank em Frankfurt em nome do banco de Nova York Mellon S.A. N.V., um banco de Bruxelas.

  • BoNY Bruxels transfere os fundos para Euroclear (uma câmara de compensação belga) ou para Clearstream (Luxemburgo).

  • Estas câmaras de compensação aparecem a utilizar o  Bank of New York Depositary (Limited), um banco de Londres, como o seu titular detentor  da nota global.

Um problema aqui é o aparecimento frequente da palavra “New York”, os nomes dessas empresas financeiras  estrangeiras, que sã, no fundo,  todas elas  filiais do Bank of New York que está em Nova York. Então pode-se assim ver porque é que o juíz Griesa poderia ser levado a pensar  que teria poder jurídico sobre elas . E talvez possa ter ! Há sempre a possibilidade de decisões jurídicas passiveis de entrarem em conflito, onde os  tribunais belgas forçariam BoNY  Bruxels a  movimentar o dinheiro e Griesa então poderia ameaçar os dirigentes de BoNY Nova York de os colocar na prisão  por desrespeito à sua decisão. .

(7) Veja-se páginas  14-17 do  euro exchange bondholders’ motion de  Griesa no mês passado .

(8) Embora, se uma oferta de troca pode ser feita mecanicamente, e Argentina deseja fazê-la , então,  o detentor  de títulos provavelmente deve  fazer  isso. Um efeito colateral do drama de ontem é que a Argentina deixou muitíssimo bem claro  que ele não há  tempo para os abutres .

(9) Aqui está a sua proposta , via email :

A resolução da situação da dívida Argentina está presa numa  contradição entre um conceito de “igualdade de tratamento” com base na lei e o conceito de “igualdade de tratamento” com base em critérios financeiros. A contradição fundamental é que a lei vê os títulos de valor já reduzido, os títulos de troca,  como estando em igualdade com os títulos que não foram sujeitos a nenhuma redução, os títulos pertencentes aos holdouts.”. Economicamente, no entanto, a Argentina e os detentores de títulos de troca  salientam que neste caso tratamento por igual significa tratamento desigual. Agora que os títulos de troca entraram em incumprimento  há pois uma maneira de equilibrar o tratamento jurídico e económico. A Argentina deve oferecer uma nova reestruturação em igualdade de condições para todos os reclamantes. Como parte desta reestruturação, a troca de  títulos deve ser “refeita ” em títulos  pré-2001. Uma vez reconvertidos, todos os credores terão então títulos de  crédito pré-2001 economicamente equivalentes. Quando a estes é  oferecido  um acordo legalmente equivalente, nós teremos  encontrado uma forma de oferecer “igualdade de tratamento” simultaneamente numa base jurídica e financeira.

Fase  1:  A renovação dos títulos de troca .

A Argentina e os detentores de   títulos troca estão  de acordo sobre uma fórmula para “renovar ” a troca de 2005 (e mutatis mutandis, a troca de títulos de 2010). Não podemos renovar  para os  instrumentos antigos, mas sim e sobretudo para activos  que reflictam em média os títulos de antes de 20001.   A premissa geral é que podemos transformar  qualquer redução principal, subtrair quaisquer cupões  pagos (com um ajustamento face ao  tempo pós-recebimento dos pagamentos obtidos ) e recalcular o valor de  2001 até ao presente a uma taxa que reflicta o  cupão médio dos títulos de pre-2001 em incumprimento da  Argentina. Os detentores de títulos de troca têm  agora têm activos de  “pré-2001″. Esta transformação  pode ser feita numa base de título a título . O resultado será ” Activos de pré-2001 a desconto “, “activos de pré-2001 ao par “; e ” activos Global 17  pré-2001.”

Fase  2: “Pari Passu offer”

Holdout bonds will receive a mix of Discounts and Pars reflecting the relative weights of Pre-2001 Discount Claims and Pre-2001 Par Claims.

A Argentina irá iniciar  uma nova oferta de troca a  todos os seus credores contra quem está em incumprimento . Os activos pré-2001 a desconto receberão  novos títulos a desconto  ; activos de pré-2001 ao par  receberão um novo título  ao par,  etc. Os títulos dos holdouts receberão um mix  de descontos e ao par reflectindo  os pesos relativos dos títulos de pré-2001 a desconto  e e de títulos ao  de  pré-2001.

Fase  3: A Troca/Voto

Substancialmente, em simultâneo , o detentor de títulos de troca  votará numa resolução  proposta pela  Argentina de transformar os seus títulos em títulos  pré-2001 ; e oferecer  então estes títulos para  uma troca. Esta troca será então aberta aos holdouts .

Fase 4: Os novos instrumentos

Os novos instrumentos estarão sob a lei belga. Terão um trustee depositário e um agente responsável pelo pagamento sem ligação aos Estados Unidos . Os holdouts  que declinem entrar na troca  não terão o benefício de uma ordem similar a determinada pelo juiz Griesa para interferir com o pagamento nos novos instrumentos.

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Ver o original em:

http://www.bloombergview.com/articles/2014-07-31/yesterday-was-not-argentina-s-day

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Para ler a introdução de Júlio Marques Mota a este texto de Matt Levine, publicada ontem em A Viagem dos Argonautas, vá:

http://aviagemdosargonautas.net/2014/08/19/uma-nota-introdutoria-de-julio-marques-mota-ao-texto-ontem-nao-foi-um-dia-bom-para-a-argentina-de-matt-levine/

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Para ler a Parte I deste texto de Matt Levine, publicada ontem em A Viagem dos Argonautas, vá a:

http://aviagemdosargonautas.net/2014/08/20/ontem-nao-foi-um-dia-bom-para-a-argentina-por-matt-levine/

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