Selecção e tradução por Júlio Marques Mota
Euro: o resgate, pior que o naufrágio
A União Europeia compra tempo, antes da catástrofe
Sylvia Bourdon, Euro: le sauvetage, pire que le naufrage – L’UE achète du temps avant la catastrophe
Revista Causeur.fr, 25 de Março de 2015
Se houvesse dúvidas quanto à submissão dos Europeus aos Estados Unidos, esta informação, de que toda a imprensa alemão falava na manhã de 17 de Março de 2015, virá levantar as incertezas. Prova também que Jean-Claude Trichet – doravante o presidente da Trilateral, um centro de reflexão na dependência de Bilderberg, presidida por Henri de Castries – está sob influência directa da administração americana.
É o antigo economista chefe do BCE, Jürgen Stark, que o afirma: o presidente Obama teria exercido enormes pressões sobre o BCE, quando se tratou de salvar o euro. O objectivo dos Americanos era de que o Banco central da União europeia interviesse de forma tão agressiva quanto o FED sobre os mercados. Imediatamente depois destas pressões, foi elaborado um programa de compra maciço de empréstimos de Estado.
Este mês, Mario Draghi pôs em prática o seu programa de estabilização do euro, anunciado desde há muito tempo. De acordo com as suas previsões, realizadas com a participação activa dos Americanos, 60 mil milhões de euros serão aplicados mensalmente na compra de títulos da dívida. Jürgen Stark conta num documentário realizado pela televisão alemã ARD como, numa noite em que houve uma sessão do BCE, alguém lhe entregou um envelope. Esta continha as instruções detalhadas que o BCE deveria aplicar na compra massiva de títulos da dívida pública. Estes planos eram-lhe então totalmente desconhecidos. “Aquele documento foi para mim um choque incrível”, declara Stark a propósito deste episódio, que teria tido lugar em Lisboa em Maio de 2010.
Este tipo de programa de empréstimos é contestado com vivacidade pelos juristas, e mesmo os juizes do Tribunal constitucional de Karlsruhe têm-no como ilegal. “As pressões da administração americana eram enormes, de todos os lados, em especial por parte do presidente Obama”, precisa Stark, que acabou por apresentar a sua demissão sob a administração Trichet, em 2011. A imprensa francesa tinha considerado na altura que Trichet ficaria enfraquecido por esta demissão. As declarações de Stark foram confirmadas, durante a crise financeira, por Philipp Hildebrand, o presidente do Banco nacional suíço: “Aquando da entrada em função de Mario Draghi, recebi um telefonema de Tim Geithner, o ministro das finanças americano, que queria saber como é que se deveria proceder para que o BCE viesse a adoptar um estilo tão agressivo, como se pratica no FED e na Grã-Bretanha”.
E depois, de repente, durante a cimeira da União europeia que acaba de se dar entre Junker, Merkel, Tsipras, Hollande e Draghi, a UE declara que a situação da Grécia representa uma catástrofe humanitária. Tira-se então do seu chapéu mágico europeu “um fundo desconhecido de 2 mil milhões de euros, destinado ao desenvolvimento” (e interroguemo-nos sobre qual desenvolvimento). Junker decide por conseguinte que esta soma será atribuída aos Gregos. E Juncker encarrega o Comissário europeu Valdis Dombrowski “de ver” como este dinheiro é absorvido pela Grécia… Depois da cimeira, Junker declara que este dinheiro deve servir para enfrentar os problemas sociais do país e ajudar as PME a desenvolverem-se. Mas omite precisar como é que se vai controlar a atribuição deste valor a Atenas.
Tudo isto pôde apenas satisfazer Alexis Tsipras, em recompensa do seu alinhamento à UE e, por repercussão, aos Estados Unidos. Os outros Estados-Membros da UE, eles, não estiveram associados a estas negociações, embora se tratasse do dinheiro dos seus contribuintes. O jornal económico alemão Deutsche Wirtschaftsnachrichten precisa: “Por esta decisão, a Troika tem doravante as mãos livres para pedir outros milhares de milhões ao BCE e ao FMI a título da dívida grega. Esta acção arriscada é conhecida pelo grande público sob o nome “de resgate da Grécia” e já custou ao contribuinte europeu 240 mil milhões de euros. ” Como mencionado na reportagem da cadeia de televisão alemã, ARD, a UE está a comprar, mais uma vez, o tempo e isto antes da catástrofe. Assim Georges Friedman, fundador da mais importante agência privada de informações no mundo, Stratfor Global Intelligence, considerava por ocasião de uma recente conferência em Chicago que o euro e a Europa implodirão.
Entretanto, os Estados Unidos podem sempre fazer pressão porque, como diz Georges Friedman, “a Europa ficou incontrolável”. Prova da sua deriva autocrática, uma declaração de Junker, citada por Der Spiegel, deveria chocar cada um dos cidadãos que somos: “Decidimos das coisas e pomo-las de lado, a esperar algum tempo e ver o que se vai passar. Se não há grandes protestos e outros motins – porque, de toda a maneira, ninguém compreende o que decidimos – então continuamos, passo a passo, até que voltar para trás se torne impossível . ” Assim vai a democracia em UERSS!
Sylvia Bourdon, Revista Causeur, Euro: le sauvetage, pire que le naufrage-L’UE achète du temps avant la catastrophe, 25 de Março de 2015. Texto disponível em :
http://www.causeur.fr/euro-etats-unis-union-europeenne-bce-32002.html
*Photo : Reynaldo Paganelli/SIPA/1503240924