Selecção, tradução e introdução de Júlio Marques Mota
EUROPA: O falhanço da estratégia da contenção
Romaric Godin, L’ÉCHEC DE LA STRATÉGIE DU “CONTAINMENT”
Okeanews.fr, 26 de Maio de 2015
Utilizando a linha dura contra a Grécia, os credores queriam criar um exemplo político. Esta estratégia parece ter falhado completamente , como o demonstram as eleições de Domingo na Espanha e na Polónia.

As eleições locais espanholas do domingo 24 de maio assinam, para além do contexto local, o malogro da estratégia dos dirigentes desde a tempestade levantada pela vitória de Syriza a 25 de Janeiro passado. A recusa do compromisso com o governo grego foi caracterizada pela rejeição completa “das listas de reformas” apresentadas por Atenas, pelo desencadear a partir de Bruxelas de um processo de asfixia financeira da Grécia e pela insistência sobre medidas de austeridade que se hesitava em exigir ao governo conservador de Antonis Samaras.
Os objectivos dos credores da Grécia
Qual era o objectivo desta estratégia? Certamente que não é, como no-lo tentam fazer crer , assegurar o reembolso das dívidas contraídas pela Grécia junto dos seus “parceiros.” Assegurar um tal reembolso colocando um país à beira da falência, reduzindo os meios de acção do seu governo e fazendo pesar sobre o seu crescimento a ameaça de uma declaração de falência e de uma saída da zona euro? O que quer que seja que nos digam os peritos patenteados, a razão quereria neste negócio que os credores, ao mesmo tempo que obtinham as garantias que os Gregos estavam prontos para lhes dar , deixassem trabalhar o novo governo grego. O acordo de 20 de Fevereiro, onde Atenas aceitava pagar o que devia e se reconhecia ligada “pelos acordos existentes”, o que eram já concessões consideráveis, deveria ter sido suficiente para os seus credores. O interesse económico de toda a Europa seria o de rapidamente resolver esta questão grega a fim de se concentrarem sobre a tímida retoma.
A estratégia “da contenção”
Mas fez-se tudo para fazer durar a crise grega. É que, realmente, a estratégia dos credores era sobretudo política. Assustados por verem desembarcar nas suas sepulcrais reuniões energúmenos sem gravata e professando ideias terrivelmente keynesianas, os dirigentes europeus quiseram “mostrar um exemplo” a fim de “conter” a força dos que ousam questionar as escolhas tomadas desde 2010. Esta estratégia era a mesma que a do presidente americano Harry Truman, no início da guerra fria, este “containment” de cuja Grécia foi, uma das mais cruéis vítimas de uma guerra civil que a marcou de uma forma duradoura. Para evitar que outros “dominós” viessem a cair, para evitar que outros países vítimas da lógica “dos resgates do euro” exijam por sua vez uma reestruturação das suas dívidas, era necessário colocar pôr o governo Tsipras de joelhos. Era necessário que o primeiro ministro grego acabasse por reconhecer a verdade das escolhas económicas impostas pelos credores. Então, prova teria sido feita de que “não há alternativa” dado que mesmo os que professam uma alternativa acabam por aceitar o breviário. Portanto, para quê votar ainda contra o pensamento económico dominante?
A lição espanhola
Este cálculo falhou. Aconteça o que acontecer, não somente a resistência grega coloca os credores doravante na posição de terem que assumir o risco de um incumprimento o grego, mas a procura de uma capitulação política grega não permitiu conter as oposições noutros lugares da Europa. É a principal lição das eleições espanholas de 24 de maio. Certamente, convém recordar que o partido popular (PP) de Mariano Rajoy permanece como o primeiro partido do país. É necessário também sublinhar quanto o movimento anti – austeridade Podemos parece ser um fenómeno urbano. Mas “o exemplo grego” não dissuadiu os eleitores espanhóis “de punir” os dois grandes partidos que tinham apoiado a austeridade em 2011. Podemos, que as sondagens diziam em declínio, espantou os espíritos impondo-se como uma força central em Madrid e Barcelona, mas também em Saragoça. Quanto ao partido “centrista” Ciudadanos, uma espécie de cópia do grego Potami, partido “renovador”, mas “pró-europeu”, ganhou de forma bem mais limitada do que se pensava. Por último, a expansão da esquerda, de todas as tendências incluídas, é muito nítida. Resumidamente, se Podemos não está certamente “à porta do poder” e se a Espanha não é a Grécia, a estratégia “do containment” falhou seguramente este Domingo.
Pesadelo espanhol
Este resultado é um verdadeiro pesadelo para os líderes europeus. Primeiro, porque, como a vitória de Syriza no 25 de Janeiro, o sucesso de Podemos em Madrid e Barcelona e o desmoronamento por toda a parte dos conservadores permite relativizar “o milagre económico espanhol” que seria o fruto “das reformas dolorosas.” Os Espanhóis, nas urnas, arruinaram esta história mal contada storytelling que se tem tornado recorrente para fazer aceitar as referidas reformas, nomeadamente deste lado dos Pirinéus. Seguidamente, porque as eleições do 20 de Novembro apresentam um desafio delicado para a Europa. Se Podemos participar ao poder, haverá um repor em causa da ideologia dominante na Europa, e um novo dominó cairá. Se, em contrapartida, os dois partidos tradicionais se combinam “numa grande coligação” com que tanto sonhar os altos-funcionários europeus, Podemos tornar-se-á a primeira força de oposição e corre-se o risco de se adiar a queda do dominó espanhol para mais tarde.
Sequência em Portugal e na Irlanda?
“A política da contenção” parece ter falhado nos outros países que conheceram as visitas da Troika. Se o partido “Podemos” não se reproduz em Portugal como algo de equivalente ao Podemos de Espanha e se a extrema-esquerda não progride, os Socialistas portugueses deixam de hesitam em retomar os elementos de linguagem da esquerda radical e evocam nomeadamente a partir daqui uma negociação sobre a dívida. Na Irlanda, o Sinn Fein poderia também no próximo ano criar uma dinâmica de expansão e ganhar o primeiro lugar, o que, aí também, poria igualmente em causa o famoso “ regresso do Tigre céltico graças à austeridade.” Nestes dois casos também não, o tratamento infligido aos Gregos não teve o efeito esperado pelos líderes europeus.
Euro-cépticos de direita também têm o vento em popa
Mas há ainda pior. A estratégia “do containment” também não teve nenhum êxito em acalmar o desenvolvimento dos euro-cépticos de direita. Por uma razão bem simples: a dureza com a qual os Gregos são tratados alimentou o sentimento “anti Gregos” e mais largamente anti-euro destes movimentos. A desconfiança dos credores da Grécia foi tomada como prova da realidade dos clichés contra este país. Uma bênção para movimentos como os Verdadeiros Finlandeses de Timo Soini, que alcançou a segunda posição a 19 de Abril, aquando das eleições legislativas finlandesas, mas mais geralmente para todos os euro-cépticos do Norte. Do mesmo modo, a utilização pelos credores das oposições internas à zona euro entre “os bons alunos pobres” (bálticos ou de Europa central) e “os maus alunos” do Sul para fazer ceder Atenas foi pão abençoado para os movimentos nacionalistas destes países. Sem estar a contar que estes países tenham podido ver nos renascimentos da crise grega a confirmação de três dos seus pressupostos: a incapacidade da burocracia de Bruxelas, o estar a colocar-se em perigo pela Europa do dinheiro dos contribuintes e pela falência “dos salvamentos” de 2010-2011.
Também o eurocepticismo floresce cada vez mais ao norte e a leste. Domingo, onde os eleitores polacos infligiram uma bofetada retumbante a Bruxelas elegendo contra qualquer espectativa para a presidência da República o conservador euro-céptico Andrzej Duda, contra o candidato do presidente do Conselho europeu e antigo primeiro ministro Donald Tusk!
O apelo de Matteo Renzi