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Os gráficos abaixo, que são reproduzidos do documento do FMI mostram como é que os resultados mudam. A linha vermelha representa o cenário que combina a moderação de salários de 2% nas cinco economias afectadas pela crise com o QE praticado pelo BCE. Isto mostra que o PIB global da zona euro aumentaria levemente (à volta de 0,5% do PIB) enquanto que a inflação sobre o médio prazo dificilmente iria descer.
Em termos da composição regional, o resto da euro-área (a zona euro menos os cinco países) ainda estaria a reduzir a actividade económica (menos 0,4% do PIB).
O grupo das cinco economias afectadas pela crise, contudo, ganharia agora substancialmente aumentando o PIB em 2%.
Esta última simulação permite que o FMI se fixe na ideia de que, desde que o BCE empreenda o programa da chamada facilitação quantitativa, a pressão dos salários à baixa é ainda a maneira mais correcta para se sair da crise nas economias altamente endividadas da zona euro. Se isto provoca então uma leve descida do PIB nas outras economias da zona euro (que estão a ter relativamente melhor comportamento, de toda a maneira!), assim seja.
Especificamente sobre este cenário diz-nos o FMI:
Os efeitos de uma estratégia de facilitação quantitativa, a QE (quantitative easing), que inclua a moderação de salário no conjunto das economias da zona euro fortemente afectadas pela crise e as ambiciosas reformas estruturais têm um enorme impacto positivo sobre o PIB para todos os países. Conforme nos ilustram as linhas a preto nas economias da zona euro directamente afectadas pela crise, o PIB nestas economias sobe cerca [de 1 ½] por cento no período de dois anos e é 2 ½ por cento mais alto no espaço de 3 anos.
Com este mesmo cenário, o gráfico 3, em que se ilustra o que acontece nos restantes países da zona euro quando este mesmo cenário é aplicado apenas nos países em crise, mostra que os restantes países crescem ¼ e ½ por cento, no espaço de 2 e 3 anos respectivamente, conforme se vê na figura 3. Uma advertência: as simulações supõem que as reformas estruturais são inteiramente dignas de crédito e que têm rapidamente impacto sobre investimento.
Compreende-se pois a leitura de Ronald Janssen: “Esta última simulação permite que o FMI se fixe na ideia de que, desde que o BCE empreenda o programa da chamada facilitação quantitativa, a pressão dos salários à baixa é ainda a maneira mais correcta para se sair da crise nas economias altamente endividadas da zona euro”.
Mas curiosamente neste trabalho de FMI elaborado por peritos altamente qualificados não terá havido nenhum a quem se ponha a seguinte questão: se todos fizerem uma politica de deflação salarial os resultados são devastadores e para toda a gente, para todos os países. Então coloquemos a hipótese inversa: a de uma politica de expansão salarial e teremos então os resultados inversos, isto é, forte crescimento para TODA A ZONA EURO. Mas esta hipótese não cabe no quadro teórico da zona euro e portanto para quem está aos serviço de uma ideologia, como é o caso destes peritos altamente qualificados, não é uma hipótese a estudar! Simples, portanto. Podemos ainda acrescentar que este texto nos cheira a esturro, cheira-me a uma encomenda ideologicamente solicitada pelo senhor Schaüble. Os países do Sul da Europa, Grécia, Itália, Espanha, Portugal e a França podem e devem fazer austeridade, acompanhada nalguns casos com a Quantitative Easing e outros devem ser dela dispensados. O caminho para a Europa a duas velocidades com a chancela do FMI. Portanto, calem-se os discursos à esquerda em França, em Itália, em Espanha, em Portugal e quanto à Grécia, estes já estão bem abafados pela capitulação imposta. Não nos esqueçamos que Portugal tem um governo a dar os primeiros passos, que brevemente haverá eleições em Espanha, não esqueçamos que em Itália vai surgir um partido equivalente ao PODEMOS espanhol com a diferença que é com gente de longa experiência política que abandona o partido de Matteo Renzi, não esqueçamos que a Inglaterra ganha uma nova liderança à esquerda. Não esquecendo tudo isto, somos levados a dizer que este texto do FMI corresponde a uma encomenda para balizar de uma outra forma as mesmas políticas até aqui seguidas. Que mude alguma coisa para que fique tudo na mesma, é a conclusão a tirar quanto à mensagem deste texto.
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Para ler a Parte I deste trabalho de Júlio Marques Mota sobre textos de Ronald Janssen e do FMI, publicada ontem em A Viagem dos Argonautas, vá a:
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