EDITORIAL – Arqueologia da luta política

logo editorialNem a vitória de um candidato de esquerda nos teria salvo de muitos problemas que vamos enfrentar, nem a vitória de Rebelo de Sousa significa o fim ou o princípio seja do que for. Seria bom que todos compreendêssemos que estamos mergulhados num sistema que obriga seja quem for que esteja (supostamente) à frente dos destinos políticos de um país a tomar uma de duas vias: a da gestão da submissão ao império ou a da ruptura. Por mais honestos e sinceros que fossem os candidatos de esquerda nas eleições que ontem tiveram lugar, não iriam romper com o sistema – e por «sistema» entendemos inclusivamente, para além do facto de estarmos inseridos num conjunto de entidades que nos obrigam a comportamentos humanamente errados – ONU, UE, NATO…, toda a nossa economia, umbilicalmente ligada a um sistema económico que sabemos errado, mas para o qual não encontramos alternativa objectivamente factível.

Não vamos procurar consolação no facto de Marcelo ser obviamente menos estúpido do que Cavaco e de nos representar com mais dignidade. Marcelo tem o seu quê de clown, enquanto Cavaco é de uma imbecilidade invulgar. Ambos provêm da matriz fascistoide que o PSD herdou da UN. Diríamos que nada de importante vai mudar . De um discursante idiota passamos a um jongleur  de palavras – de um homem que nem sequer leu Os Lusíadas, a outro ao qual basta a leitura das badanas de um livro para o apresentar com argumentação vistosa. Ou seja, sai um estúpido que defendia um sistema estúpido e cruel com palavras e conceitos rudimentares, entra um esperto que defende o mesmo sistema com um discurso sofisticado e (dizem) com graça.

Não minimizamos o prejuízo que a derrota de Nóvoa ou de Marisa significam para a esquerda. Qualquer deles, estamos certos, teriam usado até ao limite os seus poderes. Não temos muita convicção de que obtivessem grandes resultados.

Enquanto Marcelo vai ter o apoio da direita, Nóvoa ou Marisa, teriam problemas vindos de sectores de esquerda. A arqueologia politica ensina-nos que o sufrágio universal, conquista das esquerdas do século XIX, se transformou no maior trunfo da direita. A televisão, o futebol, o  marketing, as redes sociais, todas essas estimáveis criações, confeccionam um caldo de alienação, a grande barricada da direita que a esquerda não consegue transpor. Quem ontem venceu as eleições não foi o Professor de Direito, mas sim o comentador de televisão.  Há gente de esquerda que confessa ter votado nele. Porquê? – Acham-lhe graça.

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