Morreu Marcello de Cecco, um brilhante economista italiano – por Júlio Marques Mota

Falareconomia1

Texto de Júlio Marques Mota

Morreu Marcello de Cecco, um brilhante economista italiano. À primeira vista nada de especial neste facto para ser notícia neste blog. Mas foi um nosso convidado para nos falar da crise europeia e da equivalência padrão-ouro e euro. Por uma razão simples: era considerado um dos melhores especialistas à escala europeia sobre o tema. Uma grande figura do pensamento económico desaparece pois.

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Do curriculum de Marcello de Cecco tal qual nos foi, em 2012, por ele enviado:

Born in 1939, LL.B ( Parma,1961) , B.A. Econ (Cambridge,1964) is ,currently docente senior at LUISS university in Rome . Going back in time, he was professor of monetary and financial history at the Scuola Normale Superiore di Pisa, professor of Monetary economics at the University of Rome “La Sapienza” , at the European University Institute in Fiesole and at the Faculty of economics at the University of Siena, and a lecturer in the School of Social Sciences at the University of East Anglia. He was also a fellow of the Institute for Advanced Study, Princeton and of the Wissenschafts Kolleg zu Berlin and held the Giannini Chair at U.C. Berkeley.

His publication include “Money and Empire” (Blackwell, 1974 ) , “Changing Money “(Blackwell, 1984) and sevral other books and articles on money and finance in international journals . He contributed two entries to the New Palgrave Dictionary( on the Gold Standard and on Foreign Exchange Markets).

He was a member of the Italian Government’s Committee of Economic Advisers, an adviser to the Bank of Italy and a director of several major Italian banks.

Em Abril de 2012 organizámos na FEUC (Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra) um colóquio de dois dias dedicado à crise do euro, com o tema A Zona Euro, de Maastricht a 2020, a crítica de um projecto e de um trajecto.

Para este colóquio, organizado por mim e mais dois colegas, Margarida Antunes e Luis Peres convidámos então Marcello de Cecco para vir a Coimbra participar no colóquio em questão. Foi para mim muito importante os contactos com Marcello de Cecco, um homem de grande estatura intelectual, e dada a sua enorme prática de eventos como o que íamos realizar, email após email, juntos fomos afinando o esquema do colóquio que depois se ia colocando à reapreciação de todos os convidados. Foi aliás na base de uma proposta sua que este colóquio tinha uma particularidade, para mim bem especial, era de que, deveria terminar por um painel onde haveria 6 conferencistas e um moderadora a falarem “sem programa” durante mais de duas horas. Nem eu nem os meus colegas tínhamos organizado alguma vez um colóquio com estes contornos, com este final.

Pessoalmente assustei-me. Como é que seria possível aguentar 6 economistas de grande perfil, todos eles, a discutirem entre si, num formato painel, sem se dispersarem e sem deixarem de ser entendíveis pelo público a quem o Colóquio se destinava: os estudantes. Discutimos com Marcello de Cecco que temas é que, face ao leque de nomes, poderiam ser questionados. Depois de termos uma ideia do que poderia ser o painel tratava-se de arranjar um moderador que tivesse pulso e obrigasse a respeitar os tempos e os temas. Dito de forma um pouco menos solene. Com seis grandes músicos, trata-se de encontrar um maestro que conduzisse uma tal orquestra. Aqui a tarefa foi fácil: encontrámos o moderador ideal na pessoa de João Cravinho. E o resultado final de tudo isto foi de que toda a gente gostou. Mantendo a analogia, conseguiu-se um grande concerto. Músicos, maestro e público, todos corresponderam ao melhor que deles se poderia esperar.

Simplesmente, por motivo de doença, já em cima do evento, a 12 de Abril de 2012, Marcello de Cecco informa quer não pode vir. Deixámos de poder contar com um dos melhores especialistas sobre padrão-ouro, o sistema que afinal parece ser também o de modelo que esteve na base da criação da moeda única, do Euro. Desses tempos uma busca pelo meu computador e apesar de vários desastres ainda se apanharam alguns emails que aqui lembro como homenagem a Marcello de Cecco.

1. Sobre a estrutura do colóquio e da sua intervenção disse-nos:

dear professor mota

I agree with the change of date. it is important to have a good greek economist present at the conference.

as to the theme I would like to deal with, I think I would choose the reasons for the defeat of the measures adopted to fight the crisis, a national, european and international level.

It is obvious from my correspondence that I can do that only on English. my french is good enough for asking for street directions in france, but for much else, never mind academic transactions. all the best marcello de cecco.

Sobre a não vinda por efeitos de doença tudo foi visto como se tenha estado entre nós. Escrevi-lhe nesse sentido e enviei-lhe pelo correio uma “prenda” igual à foi dada a todos os presentes: uma garrafa de Vintage Vale de Meão e uma de vinho tinto da mesma marca.

A sua resposta:

Cher Julio,

je vous remerci très bien de votre gentillesse. J’ espère che il aura des autres chances de nous rencontrer dans le futur prochaine. Je vous souhaite une très bonne réussite pour la conférence. J’ai déjà lu les matériels envoyées e ils sont vraiment très intéressantes. Je vous envoyerai mon article plus tôt que possible. Si vous voulez être tellement gentil de moi envoyer le vôtres grands vins, qui sont très fameux dans tout le monde, Je serai vraiment reconnaissant.

Au plaisir de vous rencontrer en personne, dans une occasion prochaine. Amicalement marcello

E depois disso nunca mais o contactei, até porque se esfumou a hipótese de publicar um outro livro sobre as Conferências de Coimbra. Não o conheci pessoalmente, não o conhecerei, tenho pena.

Fui informado pelo meu colega Joaquim Feio da morte de Marcello de Cecco e da publicação do artigo que acompanha este texto, com o título Marcello de Cecco, um herético da globalização publicado por Il Manifesto.

Como homenagem a este autor publicaremos depois mais dois artigos:

1. o último texto que escreveu como introdução ao seu livro Ma che cos’è questa crisi, editado por Donzelli, 2013;

2. o artigo La moneta unica che sale fa paura all’Europa del sud ma non alla Germania, publicado pelo jornal la Reppublica em 2014.

E eis pois um homem que não conheci, que não conhecerei, tenho pena. Resta-me portanto eliminar o seu endereço electrónico da minha lista de emails e lembrar o que foi como economista. Isto é o que estou agora a fazer.

 

Coimbra, 15 de Março de 2016.

Júlio Marques Mota

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