GIRO DO HORIZONTE – «40 ANOS DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA» – por Pedro de Pezarat Correia

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No passado sábado, 2 de abril, comemorou-se o 40.º Aniversário da Constituição da República Portuguesa. Data grande da democracia portuguesa em que a Assembleia Constituinte, sob a presidência do cidadão ilustre e combatente antifascista professor Henrique de Barros, reunida em plenário, aprovou a Lei Fundamental que regeria o regime democrático, dando sequência ao compromisso assumido pelo MFA em 25 de abril de 1974. Quarenta anos que se encarregaram de confirmar a previsão de Henrique de Barros, que a Assembleia aprovara uma “Constituição à prova do tempo”.

A Assembleia da República viu-se impedida de levar a cabo a cerimónia solene que se justificava, porque o PSD, no fim-de-semana que abrangia esse dia, agendou o seu Congresso, o qual, aliás, viria a constituir um acontecimento menor na atualidade política portuguesa, que nem a despropositada dimensão da cobertura televisiva conferiu valor acrescentado. Enfim, há coincidências que nem com grande esforço se conseguem entender como tal, e há que respeitar prioridades…

Perante isso a Associação 25 de Abril decidiu propor ao presidente da Assembleia da República a organização de uma sessão comemorativa as instalações da Assembleia e que veio a ocorrer no próprio dia 2 no auditório do novo edifício. Foi uma cerimónia com pouco formalismo mas imenso simbolismo, presidida pelo vice-presidente da Assembleia Jorge Lacão, em representação do presidente Ferro Rodrigues, impedido pelo convite que recebera do presidente da República para almoço comemorativo em Belém com idêntica intenção.

Depois de uma alocução de abertura de Maria Inácia Rezola, passou às intervenções da mesa na qual, além de Jorge Lacão, estiveram o presidente da A25A e convidados que tivessem pertencido a todos os grupos parlamentares da Constituinte, tendo apenas faltado o do CDS que aceitara mas não dera a certeza de poder comparecer. As intervenções caraterizaram-se por uma informalidade original, evitando-se os discursos e, a propósito de questões objetivas colocadas pelo moderador Adelino Gomes, contaram-se pequenas histórias, episódios marcantes, momentos inesquecíveis. E ainda houve tempo para um momento cultural, a cargo de Maria do Céu Guerra, Hélder Costa e Manuel Freire. A assistência que quase enchia o anfiteatro gostou do que viu e ouviu.

O presidente da República, que promoveu um almoço em São Bento assinalando a data, enviou uma significativa mensagem em que sublinhou que a Constituição é a matriz da nossa Democracia, do nosso Estado Social de Direito, e não deixou de valorizar a luta de quantos, antes do 25 de Abril de 1974, durante ele ou depois dele, tudo fizeram para afirmar os valores essenciais da Constituição. E foi simpático com a Associação 25 de Abril, confiando que estará sempre na primeira linha da pedagogia sobre a Constituição e a Democracia, já que coube aos jovens capitães de 1974, com a sua determinação e independência, abrir o caminho para que a Constituição fosse uma realidade e a Democracia pudesse vir a ser o sonho concretizado de milhões de portugueses. Foram palavras suas, textuais, o que prova que algo mudou no panorama político português.

Saiu assim este GDH de hoje, em jeito de reportagem. Mas há efemérides que vale a pena assinalar. Num Estado democrático e de direito a Constituição é a coluna dorsal da democracia. A democracia não é a invocação teórica de valores abstratos adaptáveis aos caprichos dos governantes. A democracia só se cumpre no respeito pela vontade soberana de uma comunidade que, em liberdade, definiu as regras a que devem submeter-se as instituições e os representantes que escolheu para exercerem o poder. Uma constituição reúne essas regras básicas e consagra uma vontade soberana.

Foi em total liberdade que a Constituição da República Portuguesa de 1976 foi aprovada pelos representantes do povo português, eleitos em 25 de Abril de 1975, no sufrágio mais participado e mais livre alguma vez realizado em Portugal. Elaborada no decurso de um processo revolucionário, certamente, Vital Moreira e Gomes Canotilho escreveram que «A CRP nasceu de uma revolução e a ela deve muito do seu conteúdo. Mais do que constituinte de uma revolução a CRP foi constituída pela revolução.»[1]  Mas foi votada e aprovada já findo o processo revolucionário, depois do 25 de Novembro de 1975, quando o processo contra-revolucionário já dava os primeiros passos e os 16 deputados do CDS puderam, sem qualquer constrangimento, no ato da aprovação na generalidade, votar contra.

Portugal ainda está a sofrer os efeitos negativos de um período em que esteve dominado por uma conjuntura política que afrontou, abertamente, a legalidade constitucional. A Constituição foi a bandeira em torno da qual se demarcaram fronteiras pela defesa do regime democrático, do nosso regime democrático. E há bandeiras que só se abatem quando se é derrotado. Não é o caso da democracia portuguesa.

4 Abril 2016

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[1] Constituição da República Portuguesa – Anotada (Coimbra Editora, 1980) (p. 7)

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