CARTA DO RIO – 137 por Rachel Gutiérrez

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Começo hoje citando a carta de uma leitora do Globo de domingo, 6 de fevereiro  com o título Dinheiro desviado pela corrupção :

Gostaria de poder fazer uma simulação para saber qual seria a posição do Brasil no cenário mundial em qualidade de vida se todo o dinheiro desviado para a corrupção tivesse sido usado em saneamento básico, educação, saúde e segurança. Se incluíssemos ainda, as despesas com Copa do Mundo e Olimpíada certamente seríamos quase uma Suíça.

(Carta assinada por Margarida Khauaja, do Rio de Janeiro.)

E para ilustrar a carta da leitora, cito também a matéria da página 3 da mesma edição do jornal, sobre como a penúria afeta a Saúde Pública:

A crise econômica começa a gerar efeitos diretos na saúde pública em ao menos nove estados. A dívida desses governos com fornecedores, municípios e hospitais filantrópicos passa de R$3,9 bilhões.

E eis os números do déficit do orçamento e dívida da saúde em 3 dos estados mais prejudicados: Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Rio de janeiro. No primeiro, (RS), o quadro é o seguinte: déficit do orçamento – R$ 2,97 bilhões, e a dívida da Saúde é de R$490 milhões; no segundo, (MG), déficit de R$ 8,06 bilhões, dívida da Saúde – R$579 milhões; e o Rio de Janeiro, o mais sacrificado : déficit do orçamento de R$19 bilhões e a dívida da Saúde chega a R$ 2 bilhões !

 O Rio de Janeiro foi governado por Sérgio Cabral de 1 de janeiro de 2007 até 3 de abril de 2014, quando renunciou ao cargo em nome de seu Vice.  Em 6 de dezembro de 2016, a Justiça aceitou a denúncia do Ministério Público Federal e Sérgio Cabral virou réu pelos crimes de corrupção, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.  Na mesma semana, a advogada  Adriana Ancelmo, sua mulher,  também foi presa.

Comprovou-se que o ex- governador desviou R$224 milhões, quantia equivalente a 11% da folha de pagamento do estado!

Que espécie de criminoso é esse que só na área da Saúde prejudicou a população do Rio dessa maneira?

Ninguém melhor para definir essa espécie de malfeitor político, ou, sociopata, do que o Ministro Ayres Britto, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, na entrevista que concedeu ao jornalista Josias de Souza há algumas semanas.  Num dado momento, quando o repórter perguntou quais eram os criminosos mais perniciosos, se os bandidos ligados ao Tráfico de Drogas ou os políticos corruptos, o ministro não hesitou:

 – Os assaltantes do erário são os meliantes mais prejudiciais à ideia de vida civilizada. […] O dinheiro que desce pelo ralo da corrupção —sistemicamente, enquadrilhadamente—, é o que falta para o Estado desempenhar bem o seu papel no plano da infraestrutra econômica, social, prestação de serviços públicos, educação de qualidade, saúde. O assaltante do erário, no fundo, é um genocida. É o bandido número um.”

Impossível dizer melhor: o corrupto é um genocida. Quantas pessoas morreram nas filas dos hospitais, por falta de leitos, de médicos, de aparelhos de radioterapia ou de hemodiálise? Quantos morrem de dengue, ziKa, chicungunya por falta de prevenção ou de assistência? Quantas crianças nasceram com microcefalia causada pela zika? Quantos já morreram agora, recentemente, por causa da febre amarela, que já havia sido erradicada no início do século XX?

E por acaso o combate aos mosquitos que transmitem essas doenças não depende do Saneamento Básico, pelo qual político algum parece se interessar a não ser durante suas enganosas campanhas eleitorais?

E que dizer dos prejuízos imensos na área da Educação?

No jornal de ontem, o incansável Senador Cristovam Buarque  reclamava sobre a nossa falta de indignação moral diante do não acesso à educação de milhares de crianças:

(…) a população brasileira ainda não sente indignação moral com a moderna escravidão decorrente da desigualdade no acesso educacional de cada criança, dependendo da renda da família. A má educação ainda não é vista como um navio negreiro que leva milhões de crianças carentes em direção à pobreza, e leva o país à baixa produtividade, má distribuição de renda, violência, ineficiência e a injustiça. Não se consegue visualizar que uma criança fora de boa escola é como se ela fosse uma pessoa sendo jogada ao mar, crescendo para ser explorada e excluída devido à negação da educação.

E a situação dos quase 13 milhões de desempregados?

“Os estados com maior taxa de desemprego são Bahia (15,9%), Pernambuco (15,3%) e Amapá (14,9%). E os menores, Santa Catarina (6,4%), Mato Grosso do Sul (7,7%) e Rio Grande do Sul (8,2%). Com taxa de 12,8%, São Paulo concentra 3,111 milhões de desempregados, um quarto do total nacional. Em um ano, o crescimento foi de 38,4%, um acréscimo de 864 mil pessoas. Essa alta é superior à media do país (33,9%).”

Precisaríamos ainda falar na (in)Segurança, ou no pesadelo da violência, pois sabe-se que o crime mata mais por dia no Brasil do que o confronto entre Israel e Palestina. Mas as minhas lamentações já foram longe demais.

Não há dúvida de que o mundo anda feio e ameaçador. Contudo, a resistência aos corruptos e autocráticos também não deixa de crescer. As multidões nas ruas da distante Romênia, os protestos nos Estados Unidos contra os desmandos de Trump, com suas ressonâncias nas manifestações da Europa, além da continuidade do trabalho da nossa valorosa Lava Jato, isso tudo traz um novo alento aos que continuam a acreditar nos valores humanistas e a lutar por dias melhores.

 

1 Comment

  1. Excelente seu comentário, querida Rachel. A vergonha nacional predomina em tudo. Nosso país e o Rio, em particular, está simplesmente podre.
    E cadê a luz no fim do túnel?
    Beijos

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