CRISE DA DEMOCRACIA, CRISE DA POLÍTICA, CRISE DA ECONOMIA: O OLHAR DE ALGUNS ANALISTAS NÃO NEOLIBERAIS – 11. O MERCADO DE TRABALHO AMERICANO A DEGRADAR-SE: OS PREJUIZOS DA GRANDE CRISE FINANCEIRA TEM AINDA UMA LONGA VIDA PELA FRENTE- 1ª PARTE – por BILL MITCHELL

Selecção e tradução de Júlio Marques Mota

O mercado de trabalho americano a degradar-se: os prejuizos da grande crise financeira tem ainda uma longa vida pela frente- 1ª Parte

Bill Mitchell

Bill Mitchell, US labour market deteriorating – the losses from GFC will be long-lived

Billy Blog, 14 de Fevereiro de 2017

 

Em setembro de 2016, publiquei – O mercado de trabalho dos EUA está longe do pleno emprego. Isto foi escrito no contexto de um número crescente de comentadores a considerarem que a economia dos EUA já tinha regressado à situação de pleno emprego. O World Economic Outlook publicado pelo FMI também estimava que a diferença entre o PIB efetivo e o PIB potencial americano (o gap ou diferença entre estes dois  PIBs) se tinha tornado positivo (ou seja, os EUA já estavam mesmo acima do pleno emprego). Em contraste, o Congressional Budget Office considera que os EUA estavam com um gap negativo de 0,9 por cento (o PIB efetivo abaixo do PIB do potencial) no último trimestre de 2016. Os factos apontam para desvios de produção ainda mais elevados. A publicação dos dados BLS atual – Situação Emprego Resumo – Janeiro 2017 – não modificou em nada o meu ponto de vista

Esta publicação mostrou que o emprego total não-agrícola a partir do registo dos pagamentos salariais aumentou em 227.000 postos de trabalho e a taxa de desemprego manteve-se “pouco alterada” em 4,8 por cento. Mas a partir da perspectiva do inquérito sobre o emprego (Current Population Survey), o emprego total diminuiu em 30 mil. Veja-se abaixo a explicação para este paradoxo. A questão a sublinhar é que o emprego permanece ainda bem abaixo do valor de pico alcançado antes de disparar a grande crise financeira em 2008 e os empregos que têm sido criados são enviesadamente empregos de baixos salários. O inquérito revela adicionalmente que as perdas deste desempenho económico lento vão ser  de longa duração e irão degradar as perspectivas das gerações futuras. A austeridade orçamental é má para os nossos netos! Em geral, o problema é que tanto quanto menor for a criação de empregos assim como a baixa qualidade daqueles que estão a ser criados menor é a possibilidade dos trabalhadores americanos poderem desfrutar de aumentos salariais.

The Bureau of Labour, BLS, diz-nos:

A série sobre o levantamento do emprego tem uma menor margem de erro na medição da mudança de mês a mês do que o levantamento feito pelo inquérito às famílias, até pela muito maior dimensão da sua amostra… No entanto, os inquéritos às famílias têm um alcance mais amplo do que o levantamento feito pelo conjunto das folhas de salários porque o inquérito inclui os trabalhadores independentes, cujo trabalho está sem personalidade jurídica, os trabalhadores familiares não remunerados, os trabalhadores agrícolas e os trabalhadores domésticos privados…

Focalizando os dados do Inquérito sobre o trabalho feito às famílias, a força de trabalho ajustada sazonalmente cresceu de 76.000 em janeiro de 2017 e a taxa de participação aumentou em 0,2 pontos.

O emprego total caiu 30 mil em termos líquidos, e, como consequência, o desemprego oficial aumentou em 106 mil. (76.000+30.000)

A taxa de desemprego aumentou de 4,72 por cento para 4,78 por cento.

No ano civil de 2015, o emprego total aumentou em 2.509 mil (ou 209 milhares em média por mês). Em 2016 o emprego aumentou em média apenas de 172 mil por mês ou seja 2.081 mil ao ano.

O crescimento no mercado de trabalho dos EUA abrandou então consideravelmente o seu ritmo de crescimento.

A economia dos EUA foi minando o emprego de nível salário médio desde 2005 (ver – All net jobs in US since 2005 have been non-standard ) e tem mostrado um claro enviesamento para a criação de empregos de baixos salários (veja-se Bias toward low-wage job creation in the US continues).

Além disso, a taxa de participação de Janeiro, que tinha subido em Dezembro, foi somente de 62,9 por cento e a ficar ainda muito abaixo do valor de pico alcançado em Dezembro de 2006 (66,4).

Excluindo o efeito de envelhecimento (ver US labour market – some improvement but still soft para a explicação desse efeito), o aumento anual médio do conjunto dos que desistiram de procurar trabalho (os chamados desencorajados) tem sido desde Dezembro de 2006 de cerca de 295 mil trabalhadores. (Por exemplo, ajustando pelo efeito de envelhecimento o aumento dos desencorajados de Março a Abril de 2016 foi cerca de 145 milhões.)

Se nós adicionarmos os desencorajados à força de trabalho e os considerarmos então como estando desempregados (o que não é uma hipótese desprovida de sentido dado que a diferença entre ser classificado como oficialmente desempregado ou não deve-se somente ao facto de ter ou não procurado activamente emprego no mês anterior) – iremos verificar que cerca de 3,698 milhões de trabalhadores deixaram de contar como força de trabalho devido à falta de oportunidades de emprego, o que colocaria a taxa de desemprego atual dos EUA em torno de 6,8 por cento, em vez da estimativa oficial de 4,8 por cento.

Isto dá-nos uma perspectiva muito diferente na forma como se deve avaliar a retoma da economia americana.

O mercado de trabalho dos EUA tem ainda uma longa via a percorrer para alcançar valores equivalentes aos do final de 2007.

Estamos perante um vacilante crescimento do emprego

Em janeiro de 2016, o emprego diminuiu em 0,02 por cento, enquanto a força de trabalho aumentou 0, 05 por cento.

Parece que em 2017 tem continuado a deterioração que se iniciou em 2016.

O gráfico seguinte mostra o crescimento mensal do emprego desde o ponto mais baixo da taxa de desemprego (Dezembro de 2006). A linha a vermelho indica a média de crescimento da força de trabalho durante o período de dezembro de 2001 a Dezembro de 2006 (0,0910 por cento por mês).

O que é evidente é que uma forte tendência positiva, e ela mesma também a aumentar no que se refere ao crescimento do emprego, não foi ainda estabelecida no mercado de trabalho dos Estados Unidos desde que a recuperação começou em 2009. Há ainda muitos meses em que o crescimento do emprego, embora positivo, permanece relativamente fraco quando comparado com a média de crescimento da força de trabalho de antes da crise.

Uma boa medida da força do mercado de trabalho é o rácio dado por Emprego/População uma vez que as suas variações são relativamente inequívocas porque a população no denominador não é particularmente sensível ao ciclo (ao contrário da força de trabalho).

O gráfico a seguir mostra a relação Emprego/População dos Estados Unidos a partir de Janeiro de 1970 até Janeiro de 2017. Embora a proporção oscile um pouco, o resultado de Janeiro (59,9 por cento) foi superior em 0,2 pontos ao valor alcançado em Dezembro.

Mas permanece bem abaixo dos níveis da situação de antes do rebentamento da grande crise financeira de 2008 (pico de 63,4 por cento em Dezembro de 2006), o que é mais uma indicação de quão frágil tem sido até agora a recuperação da economia americana

Este resultado também mostra porque é que nós temos de ter cuidado ao lidar com dados dos inquéritos mensais, quando as populações subjacentes não são coletadas numa base mensal.

Os dados BLS estão-nos a dizer que o emprego diminuiu de 30 mil em Janeiro de 2017 (líquido). Então, como pode a taxa de emprego-população subir? A resposta é que a sua referência como valor da população para Janeiro sugere que a população em idade activa caiu em 516 mil.

Mesmo Donald Trump não teria tido este efeito!

 

O Indice das Condições do Mercado de Trabalho (LMCI)

O Federal Reserve Bank of America publicou um novo indicador – Labor Market Index Condições (LMCI) – que é derivado de uma análise estatística de 19 medidas individuais do mercado de trabalho e fá-lo desde Outubro de 2014.

Este índice está agora a ser analisado por aqueles que querem ser os primeiros a prever um aumento das taxas de juro oficiais nos Estados Unidos. Basta dizer que, no curto prazo as mudanças (mensais) no LMCI são “assumidas resumirem as condições gerais do mercado de trabalho”.

A valorização (variação positiva) é um sinal de um mercado de trabalho a melhorar, enquanto um valor em declínio (variação negativa) indica o contrário.

Em Janeiro de 2017, a LMCI subiu 1,3 pontos no índice mas continua a diminuir a sua tendência desde  2015.

O gráfico seguinte mostra o índice LMCI de Federal Reseerve Bank para o período de Janeiro de 2007 a Janeiro de 2017.

Verificamos assim que enquanto o desemprego é agora menor do que no ano passado, a taxa de emprego  estabilizou-se depois de ter descido no início do ano. A maneira pela qual estes fatores se combinam no índice leva a uma avaliação geral de que o mercado de trabalho está em declínio.

A queda fora nos últimos nove meses tem sido bastante significativa, não obstante a retoma em Julho de 2016.

O défice de empregos nos Estados Unidos

Como se referiu no início do texto, a taxa de participação atual (62,9 por cento) representa um longo trajeto abaixo do valor de pico mais recente, verificado em Dezembro de 2006 de 66,4 por cento.

(continua)

________

Para ler o original clicar em:

US labour market deteriorating – the losses from GFC will be long-lived

 

 

Leave a Reply