Julgo que foi Goethe quem o disse, há mais de duzentos anos, ‘só não se equivoca quem nunca faz nada!’
O problema está em conseguir saber o que quer dizer aquele ‘quem nunca fez nada’, pois o poeta não explicou se o ‘fazer’ era por ‘si’ ou pelo ‘outro’.
Recorrer a um poeta romântico para falar da actualidade parece estapafúrdio, mas apelo também à análise de Nietzsche em ‘O crepúsculo dos deuses’, onde se propõe desmascarar os ídolos, por haver no mundo mais ídolos que realidades, ‘urge libertarmo-nos da ilusão dos sentidos, do devir, da história, da mentira – a história é tão só a fé nos sentidos, a fé na mentira’
Uma crítica a considerar, por a memória ser um lugar complicado pela deificação de ícones e símbolos, o sedimento desta sociedade (a ver as multidões nos templos do consumo com ou sem barulho!), onde se vivem intensamente as emoções por ele tão bem explicadas.
Este, um equívoco (?) a contar também com quase cento e trinta anos!
Por ‘eles’ por ‘ele’ ou pelo ‘outro’?
Pergunta necessária pelo complicado da memória, que se vai tingindo com as cores que emoções e circunstâncias dão a cada facto guardado e que, muitas vezes, podem levar a não distinguir muito bem, o verdadeiro do irreal!
Talvez por isso, a escritora e filósofa Ayn Rand, vinda da Rússia e abalada nos EUA em 1982, garantir ‘quando deres conta de que muitos enriquecem graças ao suborno e influências, que as leis não te protegem e os protegem a eles, quando descobrires que a corrupção é recompensada e a honradez se converte num auto-sacrifício, poderás afirmar, sem temor de te equivocares, que a tua sociedade está condenada’
E aqui o equívoco (?) será pelo ‘fazer’, por ‘ti’ ou pelo ‘outro’?
E Bauman, uma vez mais, por apresentar este universo deificado por ícones e consumo, como a ‘última fronteira desta sociedade’ pela componente mecânica de mutação permanente (fazer!), o único aspecto do sistema que gera critérios próprios de ‘movimento para a frente’ podendo assim ser apresentado como ‘em progresso’
E aqui, a haver equívoco, será no ‘fazer’ por ‘eles/ícones’ ou pelo ‘outro’?
Para esta Carta não ser só uma série de perguntas a cair para a filosofia, termino com uma historieta de humor quase negro protagonizada por Donald Sutherland, ao receber o Óscar honorífico que lhe foi concedido em 2017, pouco depois de ter cumprido oitenta e dois anos.
Agradeceu as palavras que, a propósito, lhe foram dirigidas e, falando para o público, ‘Gostaria de vos convidar para o meu funeral!’ para dizer depois, com voz grave e virando-se para os organizadores, ‘Consegui chegar à casa de banho! Para a gente mais velha com bexigas pequenas, seria maravilhoso que as retretes estivessem mais perto!’
Donald Sutherland só quis tirar importância aos protocolos, mas acabou a mostrar neste notável exercício de humor negro, como se podem dessacralizar ícones e símbolos, ‘fazendo-o’ por ‘si’ e pelo ‘outro’!
Sem equívocos!
Nota
Segunda-feira de manhã, já esta Carta estava escrita, depois de comprovar as notícias sobre o que aconteceu naquele que dizem ‘país irmão’ (estou convencido agora, de ser apenas uma denominação do WhatsApp!), lembrei-me de uma afirmação (não tenho nem pratico WhatsApp!) ‘é como pôr a cabeça dentro da boca do tigre, só que é o mesmo a fornecer e cabeça e o tigre!’
Não posso nem quero classificar o que por lá aconteceu, uma eleição pré-decidida nas redes sociais, mas aprendi há muito tempo a pensar que ‘o lugar de um homem não é onde está, mas aquele para onde ele quer ir!’
Mas…
…alguém se equivocou! O dono da cabeça ou o dono do tigre?
António M. Oliveira
Não respeito as normas que o Acordo Ortográfico me quer impor
Adoro passear-me pelas tuas cogitações, pelas citações e deixar-me impregnar, aumentando aquilo em que acreditas e pelo que lutas e…eu…..TAMBÉM!!