CARTA DE BRAGA – “de livros e de guerras” por António Oliveira

Há quase um ano que este mundo vive uma realidade estranha e dificilmente explicável.

Como não encontro explicação para o que me aconteceu hoje (Sábado, 6 de Fevereiro) ao entrar na FNAC e o simpático senhor me ter esclarecido, logo à entrada, ‘não vendemos livros!’ Já não entrei, por não estar interessado nas tecnologias, aparelhos ‘para o lar’, ‘para ele’ ou ‘para ela’, dvd’s, cd’s e outras especialidades que ali também se vendem, pois o que queria mesmo era um livro.

Uma realidade estranha, apor sombra na tentativa mais ou menos espúria de nos adaptarmos, rodeados pela absurda mistura constituída pelo medo ao real e ao que poderá vir, no meio de muita gente inconsciente ou ‘macha’, mas rasteira, convencida de que nada a poderá atingir.

E sem o consolo de uma bica, pois aqui a maioria está fechada ou as mistelas que têm à disposição até terem café, mas estão bem longe de um bem tirado, cheguei esta manhã à triste conclusão de que num livro, os autores e as ‘pessoas’ das ficções ou ensaios, também podem ou devem ser portadores do tal ‘bicho’.

E por muito que custe, sou levado a pensar, como alguém já disse ‘com as máscaras permanentemente <afiveladas> chego a pensar que já nos esquecemos de um sorriso’.

Mas não há grandes motivos para rir, ao ver como se trata uma coisa tão simples como um livro que, para os legisladores parece ter menos importância que uma qualquer lata de refrigerante, essa sim de venda livre em qualquer ‘super’ pois, disse uma vez Bertrand Russell, Nobel de Literatura em 1950, ‘Que bom seria um mundo em que ninguém pudesse negociar a menos que passasse num exame de economia e poesia gregas, e em que os políticos fossem obrigados a ter um conhecimento sólido de história e do romance moderno!

E por falar de história e literatura, convém não esquecer que a primeira fábula, já com 5.000 anos, é a epopeia de Gilgamesh, o rei que pergunta aos deuses ‘Porque não sou eu imortal?

Na realidade, sempre que se fala da evolução do mundo, lembramos prioritariamente a arte, os pintores, os poetas, os filósofos e os cientistas, por estar neles a realidade da evolução e da história da Humanidade, por darem nomes e porem caras nos factos e a poesia explicar o que seria complicado.

Começando pelos gregos, como a nossa cultura terá começado, Parménides encerrava-se dois dias numa cova escura, sem luz, sem água e sem ruído para escutar as musas, Victor Hugo e Beethoven atribuíam as suas obras aos espíritos e Maquiavel garantia que eram os antepassados a ditar-lhas.

E quanta vezes fizeram a pergunta ‘de onde teriam vindo as magníficas ideias que deram origem a obras imortais como as Homero, Virgílio, Camões, Cervantes e tantos outros, maiores ou menores?’ Creio mesmo ter já lido que já lido que o poeta Shelley disse um dia, ‘Os poetas são os legisladores não reconhecidos do mundo’.

E um outro poeta, John Donne, escreveu em 1624, nas suas ‘Meditações VII’, ‘Nenhum homem é uma ilha isolada; cada homem é uma partícula do continente, uma parte da terra; se um torrão é arrastado para o mar, a Europa fica diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse a casa dos teus amigos ou a tua própria; diminui-me a morte de qualquer homem, porque sou parte do gênero humano. E por isso não perguntes por quem os sinos dobram; eles dobram por ti!

Tudo começou naquela afirmação à porta da FNAC, ‘não vendemos livros’ e pela noção que ela me deixou, do tão insignificante que é uma pessoa sozinha. Não posso deixar de citar Jean-Paul Sartre ‘a consciência só pode existir de uma maneira e é ter consciência de que existe!’ e por uma outra, há poucas semanas, do filósofo italiano Nucio Ordine, especialista na Renascença, ‘Todo o ser humano está unido à humanidade inteira, como um pedaço de terra está unido ao continente. É muito importante reler os clássicos, não só pelo prazer que nos dão por si mesmos, mas porque ajudam a entender o mundo que nos rodeia’.

E a terminar, tal como referiu Russell, um escritor moderno, Nobel de Literatura em 2003, o sul-africano J. M. Coetzee, ‘A afirmação de que o nosso mundo se deve dividir por entidades económicas é exagerada. As economias competitivas apareceram por terem sido criadas por nós. A competitividade é um substituto sublimado da guerra!

E será que é deles, nossa, ou só somos vítimas dela?

António M. Oliveira

Não respeito as normas que o Acordo Ortográfico me quer impor

 

 

 

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