A Guerra na Ucrânia — Washington dá à Ucrânia falsas esperanças de poder recapturar o Crimeia, por Ahmed Adel

Seleção e tradução de Francisco Tavares

3 min de leitura

Washington dá à Ucrânia falsas esperanças de poder recapturar o Crimeia

Por Ahmed Adel

Publicado por  em 21 de Fevereiro de 2023 (original aqui)

 

Bandeiras da Rússia e da Crimeia

 

Ao afirmar que os EUA apoiarão os ataques ucranianos à Crimeia, a Subsecretária de Estado Victoria Nuland confirma sem margem para dúvidas que Washington encoraja a agressão de Kiev e a escalada da guerra. Contudo, um possível ataque à Crimeia não só falhará porque a península está bem protegida, como levará a uma retaliação mais devastadora por parte da Rússia contra o regime no poder em Kiev.

“Não vou julgar antecipadamente onde os ucranianos escolhem lutar ou como escolhem lidar com a Crimeia a curto, médio ou longo prazo. Reconhecemos a Crimeia como pertencendo à Ucrânia”, disse Nuland durante uma discussão online organizada pela Carnegie Endowment a 16 de Fevereiro.

“Essas [instalações militares russas na Crimeia] são alvos legítimos, a Ucrânia está a atingi-los, e nós apoiamos isso”, continuou, acrescentando que a Ucrânia não estará segura a menos que a Crimeia seja no mínimo desmilitarizada.

 

Nuland está efectivamente a incitar Kiev a uma nova escalada no conflito, apesar de trazer mais sofrimento aos cidadãos ucranianos. Não menos importante, o facto de a Ucrânia estar em guerra com a Rússia, trouxe grandes benefícios aos EUA, uma vez que o seu objectivo final é enfraquecer o gigante euro-asiático. Ao dar a Kiev a falsa crença de que pode conquistar a Crimeia, Washington está efectivamente a incentivar os militares ucranianos a continuar o seu inútil esforço de guerra.

Os EUA ignoram que a Crimeia se tornou parte da Federação Russa, de acordo com as normas e padrões internacionais. Os cidadãos da Crimeia votaram esmagadoramente para deixar a Ucrânia e juntar-se à Rússia, e esta é uma dura realidade que o Ocidente se recusa a reconhecer.

A negação desta realidade manifesta-se com o facto de Nuland estar a encorajar a Ucrânia a trazer o terror à Crimeia. Efectivamente, ela não só defende a violação do território soberano da Rússia, mas, dada a sua posição e o facto de não haver negação ou rejeição por parte dos seus superiores, ela está a expressar a opinião oficial da administração Biden.

No entanto, Washington não dá um encorajamento apenas retórico à Ucrânia. Os EUA entregaram milhares de milhões de dólares de armas aos militares ucranianos e os instrutores americanos estão a treinar novos soldados e estão activos no campo de batalha. Moscovo advertiu repetidamente que a ajuda militar à Ucrânia apenas irá agravar ainda mais o conflito.

Nuland está plenamente consciente de que se houvesse um ataque à Crimeia, haveria poderosos ataques às instalações ucranianas. Além deste facto, a Crimeia está bem protegida e é efectivamente uma fortaleza com uma abundância de sistemas de defesa antiaérea, sistemas de navios, aviões de combate e muitas tropas. De facto, o grosso das forças militares da Rússia na região do Mar Negro está concentrado na Península da Crimeia.

Note-se que a Embaixada da Rússia nos Estados Unidos também respondeu à declaração de Nuland. A embaixada sublinhou que a declaração de Nuland apenas confirma o envolvimento dos EUA no conflito.

“Deve finalmente tornar-se óbvio para toda a comunidade internacional que os Estados Unidos são o verdadeiro instigador do confronto na Ucrânia”. No entanto, as tentativas de Washington de utilizar os ucranianos para nos infligir uma derrota estratégica estão condenadas. Ninguém pode ter a mínima dúvida de que a Rússia irá proteger os seus cidadãos e o seu território”, adverte a embaixada.

Embora o Presidente Joe Biden e a sua administração estejam sem dúvida a provocar mais guerra na Ucrânia, nem todos dentro do seu partido estão convencidos com a estratégia. Adam Smith, o principal democrata do Comité dos Serviços Armados da Câmara, disse que a maioria das pessoas aceita que a Ucrânia nunca voltará a apoderar-se da Crimeia.

“Penso que há mais consenso de que as pessoas percebem que a Ucrânia não vai retomar militarmente a Crimeia”, disse ele à margem da Conferência de Segurança de Munique, acrescentando que a dada altura haverá um fim negociado para a guerra.

Recorda-se que funcionários do Pentágono disseram ao Comité dos Serviços Armados da Câmara, num briefing classificado em Janeiro, que é pouco provável que as forças ucranianas consigam recuperar a Crimeia das tropas russas num futuro próximo. Esta é obviamente uma realidade que qualquer pessoa sensata concluiria, mas Nuland ao reafirmar que a Ucrânia poderia recapturar a Crimeia, um objectivo central da guerra de Kiev com a Rússia, serve apenas para prolongar o conflito e o sofrimento no país.

Como Politico salientou, os comentários de Smith “reflectem o que parece ser uma visão crescente em Washington de que, após um ano de combates violentos, algum tipo de acordo terá de ser realizado para pôr fim à guerra”.

No entanto, não deve ser considerado surpreendente que as negociações tenham de ocorrer após quase um ano de conflito, especialmente se a Ucrânia quiser fazer uma recuperação económica rápida. No entanto, os comentários de Nuland demonstram que, embora Washington aceite a contragosto que Moscovo vencerá a guerra, está disposta a esgotar totalmente a Ucrânia na esperança de enfraquecer a Rússia.

____________

O autor: Ahmed Adel é um investigador em geopolítica e economia política, sedeado no Cairo.

 

Leave a Reply