BRASIL DE FATO – BOLETIM PONTO – DESCULPE O AUÊ – por LAURO ALLAN ALMEIDA DUVOISIN e MIGUEL ENRIQUE STÉDILE

 

 

Lula pensou que doar ministérios para União Brasil, PSD e MDB seria suficiente para saldar a dívida e garantir maioria parlamentar, o que não ocorreu – Evaristo Sá / AFP

Sexta-feira, 12 de Maio de 2023

 

Olá, depois de duas derrotas no Congresso, o governo tenta pôr ordem na casa para não comprometer o principal: aprovar o novo marco fiscal e destravar a economia.

 

.Quem poderá nos defender? Se Flávio Dino encarnou os Vingadores esta semana, coube a Alexandre Padilha vestir a fantasia de Chapolin Colorado. Afinal, o ministro esteve no centro de dois fracassos recentes do governo: o PL das Fake News e o Marco do Saneamento. O recado do centrão foi direto: sem liberação de emendas, nada de aprovação. E, se no caso do PL das Fake News Arthur Lira foi pego de surpresa, o erro não se repetiu e foi o próprio Lira quem ajudou a derrubar o Marco do Saneamento na Câmara. Todo problema se resume ao fim do orçamento secreto, que tirou cerca de R$ 10 bilhões das mãos do Congresso e passou para o Executivo. Lula pensou que doar ministérios para União Brasil, PSD e MDB seria suficiente para saldar a dívida e garantir maioria parlamentar, o que não ocorreu. O fiasco foi tão grande que até seis vice-líderes do próprio governo votaram contra o Planalto. Agora, se resolver ceder à chantagem, o governo terá que tirar recursos que seriam destinados ao novo Programa de Aceleração de Crescimento. Só nesta semana, R$ 712 milhões já foram desembolsados com a liberação de emendas, quase o dobro dos quatro meses anteriores juntos. Vista como responsável pelo fracasso no Congresso, a dupla Rui Costa e Alexandre Padilha continua responsável pelas articulações políticas, mas agora quem negocia é Lula e resta aos dois executar. Para não correr o risco de perda total, o governo vai fatiar o PL das Fake News, separando o tema do pagamento de direitos autorais pelas plataformas digitais a empresas jornalísticas do projeto original. O mesmo artifício já havia sido definido para a alteração da Reforma Trabalhista, ainda sem uma proposta definida, mas que deverá ir em partes para o Congresso no segundo semestre. Lula trabalha também para reverter a derrota do Marco do Saneamento no Senado, onde supostamente o governo tem maior margem de manobra. Mesmo que o plano funcione, o centrão sai vencedor deste round e restabelece o método do toma-lá-dá-cá e do parlamentarismo de ocasião. E, para piorar, na próxima semana tem início a CPMI dos atos antidemocráticos para bagunçar ainda mais o tabuleiro. Para um governo que sabe que entregou pouco e tem pressa, perder a iniciativa da política e ter que jogar no ritmo do apetite do centrão é péssimo.

.O monge e o mercado. Sem poder repetir o fracasso no Congresso e sem ter o clima de lua de mel dos primeiros meses de mandato, o governo teve que articular o adiamento do relatório do novo marco fiscal para semana que vem. Um dos impasses é que, para votar favorável, a oposição quer criar um dispositivo de responsabilização do presidente da República caso haja descumprimento das metas estabelecidas. Mas também tem o fogo amigo contra a proposta dentro do próprio PT. Se no Congresso as coisas não vão bem, a boa notícia para o governo é a reaproximação da FIESP, antigo antro lavajatista e bolsonarista, assim como a trégua com o mercado. Enquanto prolonga-se o embate de Lula com Campos Neto, Haddad aparece como um mediador moderado, aproximando a Faria Lima e afastando-a das tentações golpistas, o que se revela pela boa avaliação que o setor financeiro tem feito do ministro. A tática budista de respirar fundo e “comer quieto” rendeu ao ministro da Fazenda a indicação de um forte aliado, Gabriel Galípolo, à Diretoria de Política Monetária do Banco Central. Com isso, Haddad mata três coelhos com uma cajadada só: cria condições mais favoráveis para mudar a política de juros praticada pelo Banco Central; antecipa o nome de um possível substituto a Campos Neto na presidência do BC; e de lambuja amplia sua própria influência dentro da área econômica do governo, a ponto de se tornar o ministro da Fazenda mais poderoso desde FHC, segundo Maria Cristina Fernandes. Mas como é próprio da política, o movimento tem sua contrapartida. Não é que no cargo deixado vago por Galípolo dentro do Ministério da Fazenda assumiu um desafeto do PT? E agora Dario Durigan, ex-chefe de políticas públicas do Whatsapp e crítico do  PL das Fake News, se tornou o segundo homem mais poderoso dentro do Ministério.

.Carta fora do baralho. A sorte de Lula é que não é só o governo que tem vivido momentos difíceis. Para Bolsonaro, as notícias ruins tem sido quotidianas. A perícia no celular do ex-ajudante de ordens Mauro Cid e os US$ 35 mil e R$ 16 mil em espécie encontrados em sua casa levantam suspeitas de lavagem de dinheiro, que se somam aos esquemas das joias sauditas, da falsificação de comprovantes de vacinação e de participação no 8 de janeiro. Ao mesmo tempo, as investigações apontam para o envolvimento do coronel Élcio Franco, ex-assessor especial da Casa Civil, e do general Braga Netto na organização dos atos golpistas. Se não fosse o bastante, a Polícia Federal apertou o cerco contra os financiadores dos atos de janeiro. A soltura de Anderson Torres não altera em nada esse quadro negativo. Por isso,  o sonho de Bolsonaro de voltar ao Planalto vai ficando cada vez mais distante. Os sinais estão aí. Sem vergonha de deixar clara sua infidelidade ao governo, Arthur Lira mencionou o potencial de governadores como Cláudio Castro (RJ), Tarcísio de Freitas (SP), Romeu Zema (MG) e Ratinho Jr. (PR) de se tornarem presidenciáveis durante um evento com empresários em Nova Iorque. Lira ainda reconheceu a importância de Bolsonaro para tirar os conservadores “do armário”, mas disse preferir um candidato que cometa “menos erros”.  Mensagem parecida foi dada por Tarcisio de Freitas à CNN, que acrescentou na lista dos governadores presidenciáveis Eduardo Leite (RS) e Raquel Lyra (PE), sem mencionar o ex-chefe. É claro que é o próprio Tarcísio quem tem melhores condições de se tornar uma alternativa, principalmente porque governa o estado mais poderoso do país. Mas, para isso, ele terá a difícil tarefa de apresentar-se como o sucessor de Bolsonaro, ganhando seu eleitorado, mas sem ser visto como mais um golpista. Apesar disso, Thomas Traumann alerta que ainda é cedo para considerar Bolsonaro carta fora do baralho e que, apesar dos revezes, uma ressurreição política sempre é possível no Brasil.

.Ponto Final: nossas recomendações.

.Chile: por que a ultradireita venceu. No Outras Palavras, Tomás Leighton e José Acevedo explicam o complexo cenário político chileno e como o governo perdeu terreno na disputa política.

.Ofensiva das Big Techs contra PL das fake news expõe lobby mais poderoso do mundo. O Intercept mostra como a Frente Digital vem atuando desde 2021, premiando deputados e pagando tour para o Vale do Silício.

.Historiador explica por que Santa Catarina tem tantos grupos neonazistas. O historiador João Klug analisa as características do nazismo à brasileira e aponta sua certidão de nascimento: o coronelismo político.

.Subsídios bem direcionados são essenciais. No O Globo, Juliane Furno e Lavínia Barros de Castro discutem a importância e a necessidade de uma política de subsídios para retomar o crescimento.

.Como softwares que imitam cantores desafiam direitos autorais. O Nexo mostra os recentes casos de deepfakes musicais produzidas por inteligência artificial.

.Tempo Quente . Na Rádio Novelo, podcast com 8 episódios discute como o Brasil perdeu a dianteira da mudança climática e quem ganha com isso.

.MST abre Feira Nacional em SP após 5 anos trazendo a produção da reforma agrária de todo o país. Além de alimentos saudáveis, a Feira Nacional da Reforma Agrária tem música de qualidade. No Brasil de Fato, veja como foi a abertura do evento.

 

Ponto é editado por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.

Edição: Vivian Virissimo

O Ponto é editado por Lauro Allan Almeida e Miguel Enrique Stédile, do Front – Instituto de Estudos Contemporâneos, e é publicado todas as sextas-feiras.

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