CARTA DE BRAGA – “o dedo, a Lua, a exposição” por António Oliveira

De acordo com um antigo provérbio oriental, atribuído a Confúcio, ‘quando o sábio assinala a Lua, o ignorante olha para o dedo’.

Há quem olhe o dedo, como há quem olhe a Lua, mas são poucos os que pensam na razão de terem ali os dois, Lua e dedo. Haverá sempre uma intenção para levar alguém a apontar a Lua, só que também é fácil olhar para ela, sem querer saber da razão do dedo estendido.

Para os antigos egípcios, a Lua era o mais visível dos filhos de ‘Nut’, a deusa do céu e de toda a abóbada celeste e, por isso, também a Mãe também de todos os astros.

Aparentemente, tal situação, mesmo com outros nomes e outros intervenientes, continua vigente agora, muitos séculos depois, qualquer que seja a vocação interior do citado, para olhar o dedo ou a lua, pois já Nietzsche dizia, redutor, que ter fé significa não querer saber a verdade.

Só que cada cultura tem o seu modelo cosmogónico, desde os gregos que calcularam o raio da esfera terrestre acreditando-a fixa, até hoje, quando ainda há muito idiota patusco espalhado por esse mundo, a acreditar que a Terra é plana!

O conceito de ‘idiotia’ vem também da Grécia antiga e refere uma pessoa egocêntrica que se põe à margem dos assuntos públicos, conseguindo que outros o façam por ela e, às vezes e não raro, até mesmo contra ela.

Aliás, os modernos ecrãs, grandes ou pequenos, amanham e apoiam-se em olhos devidamente domesticados, para seguirem mais o brilho que o dedo, o do seu ecrã em especial, entre tantos outros maiores ou iguais, mas todos e ligados sempre, às vezes até à mesma hora, a apontar para o mesmo sítio.

E assim vive o cliente submisso, subjugado às tendências que lhe são postas ou sugeridas por eles, mas já em redes, sem distinguir o dedo da Lua, às ordens da deusa ‘Nut’ das pantalhas, pagando-lhe os serviços com o seu próprio tempo de vida, sem nunca reparar nesse ónus, nem na importância da distância entre a sugestão (isco) e o brilho.

Em jogo estará também algum desejo interior, talvez o de se servir da tecnologia, como nova forma de ultrapassar as limitações humanas, principalmente as que referem o próprio corpo, tais como as distâncias e as relações com o outro.

Será o ponto mais fraco de tal gente, por pressupor a negação de qualquer relação com a cultura, posta de lado pela velocidade de acesso e resposta (ao e do) dr. Google ou da IA que, como a maioria das sugestões fornecidas pelos algoritmos dos ecrãs, não passam de inalcançáveis ideais ou propostas de bem elaboradas teorias de auto-ajuda.

E a propósito, o historiador e cronista Pedro Luis Angosto salienta, ‘A elite mundial que maneja a economia, necessita engenheiros, publicistas, jornalistas a soldo, polícias e especialistas em algoritmos, para nos marcarem o caminho e com a nossa entusiástica colaboração saberem de nós e de tudo o que nós sabemos’, até com aquela surrealista ‘app anti-covid’ para o telemóvel!

A partir daqui, acrescenta o cronista, qualquer estudioso de gente como Aristóteles, Bruno, Giotto, Erasmo, Kant, Jung e muitos outros, mais modernos e actuais, ‘servirá apenas para ajudar a decorar o salão de chá, ou animar as festas da inauguração de uma grande exposição, na sede central de um qualquer banco privado e único’.

Assim, para o tal cliente submisso ou submetido, talvez não seja boa a notícia de que não poderá viver sem tal calmante (os brilhos!) e a boa será a de que sempre pode escolher a forma de se alienar, para viver bem longe dos problemas dos outros, os que são públicos.

E poderá até buscar ajuda num ‘iluminado’ como este que, de acordo com o DN de 25 de Abril, ‘Vê António Costa como alguém reflexivo, fruto de uma ascendência oriental, enquanto Luís Montenegro é completamente diferente, que vem de um país profundo, urbano-rural, com comportamentos rurais, mas não deixou de se auto-analisar Sou um ocidental apressado, definiu’.

Parece não ser necessário ir à inauguração de uma qualquer exposição elas até andem por aí não será?

António M. Oliveira

Não respeito as normas que o Acordo Ortográfico me quer impor

 

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