Ventura Ledesma Abrantes – um português de Olivença (II) – por Carlos Luna

 

 

O professor Carlos Luna é um conhecido activista da causa de Olivença. Num texto que escreveu a propósito do cinquentenário da morte de Ventura Ledesma Abrantes, traz até nós a figura ímpar de um ilustre oliventino, de um grande português.

 

 

Ventura Ledesma Abrantes – um português de Olivença (II) – por Carlos Luna

 

 

(continuação)

 

 

 

3) Uma organização mal compreendida

 

Em 15 de Agosto de 1938, fundou, com o então tenente Humberto Delgado, com Amadeu Rodrigues Pires, e Francisco Sousa Lamy, a Sociedade Pró -Olivença, embrião do futuro Grupo dos Amigos de Olivença, nome que teve a partir da sua semi-legalização, em 21 de Novembro de 1945.

 

Esta organização, ao longo da sua História, conheceu várias vicissitudes e direcções/orientações. Foi, principalmente, denegrida, ignorada… e quase proibida. A sua legalização só foi completada depois do 25 de Abril de 1974, pois os seus estatutos ficaram “suspensos” ! Curiosamente, Ventura Ledesma Abrantes veio a abandonar o grupo logo pouco depois de 1945.

 

Convém referir que, ao contrário do que muita gente diz nos nossos dias, Salazar não gostou da Associação que, pela sua linguagem obrigatoriamente anticolonialista, punha em causa a própria orientação da política portuguesa de então. A denúncia de uma situação que tinha tudo de colonial, com repressão cultural e linguística, passando por acções de dispersão de populações, ameaças, e até prisões (uma discreta “limpeza étnica”, ao fim e ao cabo), levou Salazar a criar uma atmosfera de isolamento em torno do grupo, presumindo-se que por isso nunca permitiu a aprovação dos estatutos. A organização era tolerada, mas com frieza. O Ministro da Defesa, Santos Costa, foi mais longe, ameaçando passar compulsivamente à Reserva Militar qualquer membro das forças armadas que se ligasse aos Amigos de Olivença.

 

Os diplomatas franquistas em Lisboa conotavam o Grupo como sendo de Oposição ao Regime, principalmente depois que o M.U.D., em 1945, apoiou as suas reivindicações. Na verdade, pelos Amigos de Olivença passaram muitos intelectuais e homens de acção, muitos deles oposicionistas: Queirós Veloso, Ramos e Costa, Paulo Caratão Soromenho, Humberto Delgado, Matos Sequeira, Sidónio Muralha, Veiga de Macedo, João Pereira da Rosa, Tomé Feteira, Mascarenhas Barreto, Hernâni Cidade (seu Presidente até 1975), e outros. É só por uma cruel ironia da História que análises pouco cuidadas (e preconceituosas) insistam em identificar os “Amigos de Olivença” com extremismos vários, principalmente de Direita, apoiando-se somente em alguns episódios (que os houve !) menos felizes ou menos claros.

 

4) luta por uma cidadania

 

Como é de calcular, Ventura Ledesma Abrantes fez parte do Conselho Regional da Casa do Alentejo durante muitos anos consecutivos. Na década de 1930, foi nomeado representante de Portugal nas Exposições Livreiras de Sevilha, Barcelona, e Florença. Uma grande luta que travou foi a de conseguir a Nacionalidade Portuguesa de forma natural, e nunca como “espanhol naturalizado”.

 

Após uma polémica legal com o Poder do Estado Novo que, confrontado com pareceres jurídicos favoráveis à pretensão de Ventura Ledesma Abrantes, procurava sempre eximir-se ao cumprimento da Lei e à concessão da referida nacionalidade, um aliado surpreendente resolveu a questão: Cavaleiro Ferreira, Ministro da Justiça entre 1944 e 1954. Foi promulgada legislação, mais ou menos ainda em vigor, que dava aos oliventinos o direito de cidadania portuguesa, com a averbação no Bilhete de Identidade da expressão “nascido em Olivença, Portugal.

 

Tal preceito era, mesmo assim, um tanto dúbio, pois empurrava a decisão final para o ministro da Justiça. Vale a pena citar a Lei ( Artigo 117, L. 37 666, 19 de Dezembro de 1949): ” Fora dos casos de naturalização, é da competência do Ministro da Justiça decidir as questões relativas à legalidade da aquisição, perda ou reaquisição da nacionalidade portuguesa ou esclarecer as dúvidas que a esse respeito se suscitarem; # único. Das decisões do Ministro cabe recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos da lei geral.” Diz-se que Salazar, mesmo assim, ainda hesitou em colocar a sua assinatura. Estranha forma de ser nacionalista, na verdade…

 

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