Claude Debons, Jacques Généreux, Janette Habel, Jean-Marie Harribey, Pierre Khalfa, Marie-Christine Vergiat e Francis Wurtz
Selecção e tradução por Júlio Marques Mota
Num artigo publicado no Le Monde de 25 de Fevereiro e como sendo um ponto de vista intitulado (“o mecanismo de europeu de estabilidade: o erro histórico da esquerda”), os deputados europeus ecologistas e os economistas que deles estão muito próximos criticam aqueles que, à sua esquerda, se opõem ao mecanismo europeu de estabilidade (MEE).
Passemos sobre a simplificação de retórica que consiste em comparar esta oposição à dos membros da direita sobre a lei Veil instaurando o direito ao direito ao aborto e vamos aos factos. O MEE seria “um primeiro passo rumo a uma Europa federal com o seu próprio Tesouro Público e, por conseguinte, com um consequente orçamento”. Para além do facto que seria necessário discutir precisamente os fundamentos, os princípios de uma tal Europa federal, e então se se tratasse de um “fundo de solidariedade”, como eles o afirmam, opor-se ao MEE seria pois “um erro histórico”. Infelizmente, como aquando do debate sobre o Tratado Constitucional Europeu (TCE), os nossos amigos tomam os seus desejos como sendo a realidade.
Um Tesouro público europeu teria como objectivo financiar as políticas públicas europeias. Nada disso é o que nos é apresentado com o MEE. O MEE não tem nenhuma vocação para conduzir as políticas públicas de investimento a nível europeu, o que, no entanto, seria muito útil, nem mesmo tem vocação para contribuir para a convergência das trajectórias económicas e sociais dos Estados-Membros. E sobretudo, longe de permitir à União Europeia União Europeia que se emancipe de todo o poder dos mercados financeiros, o MEE, antes pelo contrário, consagra a dominação dos mercados financeiros.
O MEE visa simplesmente financiar os Estados que tenham dificuldade de contrair empréstimos nos mercados financeiros. Como é que isso se passa? Em primeiro lugar, os Estados-Membros contrairão empréstimos nos mercados financeiros para constituir o capital próprio do MEE, várias centenas de milhares de milhões de euros. A Alemanha levantará fundos nestes mercados a uma taxa um pouco menos que 3%, a França a um pouco mais e os outros países a taxas muito mais altas. Como primeiro resultado, a dívida pública crescerá.
Mas é muito provável que estes fundos possam ser insuficientes no caso do aprofundamento da crise.
Se o MEE era para “resgatar”, para além da Grécia, a Irlanda e Portugal, mas também a Espanha e a Itália – países hoje sujeitos a fortes pressões pelos mercados mas também eles a responder aos apelos do MEE- este mecanismo ficaria rapidamente desactualizado, rapidamente ultrapassado. Daí o facto de que o MEE seja autorizado a contrair empréstimos nos mercados financeiros tendo como objectivo contrair alcançar por ” efeito de alavanca ” empréstimos nesses mercados que possam ser três a quatro vezes o seu próprio capital.
Mas para o fazer a uma taxa baixa, é necessário que seja muito boa a notação atribuída pelas agências de rating. No entanto, todos os países estão mais ou menos sujeitos a desconfiança dos mercados. O risco é assim bem grande para que o MEE seja ele também vítima dessa mesma desconfiança. Este foi o caso do Fundo Europeu de estabilidade Financeira (FEEF) que perdeu o seu triplo-A na sequência da degradação da notação da maioria dos países europeus.
Além disso, como é que o MEE reembolsará a dívida contraída se os países contribuintes, que serão também os seus devedores, estão em dificuldade e se subirem as taxas?
Longe de tirar os Estados-Membros e a zona euro das garras dos mercados financeiros, o MEE reforça ainda mais essa dependência relativamente aos mercados. Os bancos, que podem contrair empréstimos a 1% junto do Banco Central Europeu (BCE), irão eles emprestar aos Estados membros a uma taxa muito mais elevada. O MEE emprestará aos Estados a uma taxa ainda mais elevada e esses fundos serão usados para pagar o serviço da dívida que entrará nos cofres dos bancos. É a solidariedade na versão neoliberal, e os bancos a ficarem entre eles solidários.
Mas isto não é tudo, porque estas “ajudas” aos Estados-Membros estão “sob uma rigorosa condicionalidade” que será definida pela Comissão Europeia, o BCE e o Fundo Monetário Internacional (FMI). É esta Tróica que está em vias de colocar o povo grego de joelhos à força da redução de salários, de privatizações, de colocar sucessivamente em causa os direitos dos trabalhadores. Para ter acesso ao MEE será necessário passar sob as forcas caudinas da austeridade drástica. Os nossos autores estão bem cientes do problema e dizem que eles defendem ” uma condicionalidade, mas não a que está a ser imposta sobre a Grécia.” Mas não são eles que irão definir esta condicionalidade, mas sim a Troika e quanto a esta sabe-se bem qual é a sua concepção.
A cereja em cima do bolo, a concessão de assistência financeira será, a partir de 1 de Março de 2013, condicionada pela ratificação do Tratado sobre estabilidade, coordenação e governação (TSCG). Mas esse Tratado, conforme o sublinha a Confederação Europeia dos Sindicatos – que tinha, contudo, defendido energicamente todos os anteriores tratados “só estipula a mesma coisa: austeridade e disciplina orçamental “. Os nossos autores indicam que a ligação entre o MEE e o TSCG não tem valor legal. Mas o problema não é jurídico, mas sim político. Adoptando o MEE, os Estados estão politicamente empenhados em adoptar a TSCG.
Em suma, longe de ser um mecanismo de solidariedade europeia, o MEE vai ser uma camisa de forças para os povos europeus para os submeter às exigências dos mercados e o segundo E de MEE corre o risco de muito provavelmente vir a significar Escravidão face aos mercados.
A crise actual da UE e da zona do euro é a resultado da aplicação dos Tratados europeus anteriores, todos eles carimbados com o selo do neoliberalismo. Para se sair da crise impõe-se uma mudança da lógica. Os deputados ecologistas e os economistas que lhes estão próximos têm o atributo de serem constantes à falta de serem coerentes. Eles tinham apoiado o TCE que impedia o BCE de poder ser um credor em última instância, um credor em último recurso para os Estados-Membros e defendem o MEE em que os Estados Membros não podem contrair empréstimos junto do BCE e que foi inventado para evitar a necessidade de alterar o estatuto do BCE.
Mas há uma outra solução para sair do domínio dos mercados: que o BCE financie sob o controlo democrático europeu, os défices públicos dos Estados. Isto é aliás possível hoje porque a alínea 2 do artigo 123. do Tratado sobre o funcionamento da União Europeia permite que o BCE e os bancos centrais nacionais emprestem às instituições de crédito público que poderiam, por conseguinte, financiar os défices públicos.
Tirar a dívida pública do estrangulamento dos mercados é a condição de toda a política que se assuma como progressista.
Claude Debons, Jacques Généreux, Janette Habel, Jean-Marie Harribey, Pierre Khalfa, Marie-Christine Vergiat et Francis Wurtz, Le MES n’est pas un mécanisme de solidarité européen, Le Monde, Março de 2012.