José Gomes Ferreira (1900-1985)
O Suor dos operários
O suor dos operários
sujos de trabalho e sol
engrossa a argamassa
conclui a cal.
E os tijolos?
Que sangue os trespassa?
Não o meu
que, enquanto os outros agem,
fica nas urzes que piso.
Quando chego,
dou os bons-dias,
dou as boas-tardes,
construo nuvens de casas no céu
com novos horizontes,
espreguiço-me, bocejo no sorriso,
e atiro os olhos para a paisagem
que por momentos pairam
sobre as águias dos montes
«ó Sintra de Lorde Byron!»
Entretanto,
os pedreiros, já sem o rigoir de juntar as pedras,
não perdem tempo como eu
a tange a lira de Orfeu
para construir uma mulher
de sombra eterna.
Preferem a intimidade
de uma Eurídice provisória qualquer
– harpa de suor,
leite de sonho efémero.
(Obra Poética)