Publicamos hoje este comunicado da AAP, porque nos identificamos com as ideias nele expressas, sobre um assunto de grande importância para o nosso país, com um significado que ultrapassa em muito o mero simbolismo. Normalmente não publicamos regularmente comunicados de outras entidades, a não ser que se trate de entidades que lutem por problemas de extrema gravidade, de emergência social, como será o caso dos desempregados, ou que representem povos oprimidos, com um mínimo de idoneidade. À AAP – Associação Ateísta Portuguesa, apresentamos os nossos cumprimentos, e pedimos a sua compreensão por esta nota.
Aos Partidos com assento parlamentar na Assembleia da República
A Associação Ateísta Portuguesa solicita aos deputados portugueses que, em nome da laicidade e da dignidade nacional, acolham a posição republicana, laica e democrática do comunicado que, a seguir e em anexo, se envia.
Antecipadamente gratos, apresentamos as nossas melhores saudações.
Carlos Esperança
COMUNICADO
A Associação Ateísta Portuguesa (AAP) sempre considerou desnecessária a concordata assinada entre a Santa Sé e a República Portuguesa, no dia 18 de Maio de 2004, e acha-a lesiva dos interesses nacionais pelos privilégios que confere à Igreja católica.
A questão dos feriados veio confirmar que, além de desnecessária num país onde a liberdade religiosa está constitucionalmente consagrada, é uma fonte de perturbação da equidade com que um país laico deve tratar todas as religiões e, pior ainda, pretexto para a humilhação de um Estado soberano que o Vaticano trata como protetorado.
O Estado foi subserviente com a Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), que lhe impôs a eliminação de dois feriados cívicos para prescindir de igual número de feriados católicos e, provavelmente, influenciou a eliminação do feriado do 5 de Outubro, data emblemática a que se deve a separação da Igreja/Estado.
A AAP, não se pronunciando sobre eventuais razões económicas ou motivos ideológicos que tenham conduzido à eliminação de quatro feriados, por não constar dos objetivos estatutários, sente-se indignada com a pusilanimidade do Governo perante a CEP, manifesta o seu repúdio face à prepotência, tartufismo e arrogância do Vaticano e o seu mais vivo repúdio pela Concordata com que a Igreja católica afronta a República e humilha Portugal.
Na defesa da igualdade religiosa e da dignidade do Estado Português, onde há cúmplices do Vaticano, a AAP repudia a chantagem sobre o Estado português, obrigando-o a recuar na questão dos feriados e, ao mesmo tempo, impondo o prazo de 5 anos como mera suspensão de feriados católicos, os únicos que o estado laico consagra.
A AAP espera que a Assembleia da República exija ao Governo a denúncia da Concordata, que submete a democracia portuguesa à última teocracia europeia.
Direção da Associação Ateísta Portuguesa – Odivelas, 11 de Maio de 2012
Carlos Esperança TM – 917322645
(Presidente da Direção)
Estou inteiramente de acordo com o teor deste comunicado.Creio que haveria base mais que suficiente para dirigir uma petição à AR, no sentido de que esta debata a pertinência jurídica da “negociata dos feriados” e lhe ponha legalmente cobro, mesmo que o Governo em exercício a considere, acefalamente, “abrigada pela Concordata”. E, também, para solicitar ao Tribunal Constitucional que se pronuncie sobre esta palhaçada, já que, se, eventualmente, a dita Concordata previr tal “chapéu-de-chuva”, então é anti-constitucional, ferindo os princípios da laicidade do Estado e, como muito bem refere o comunicado da AAP, da equidade no tratamento das diversas religiões.Percebo que, na AR, mesmo os partidos que estão contra os disparates económico-financeiros do actual Governo se foquem, preferencialmente, na inutilidade da abolição ou suspensão de qualquer feriado, até porque, em última análise, “todos são civis”, já que o seu estabelecimento decorre de decisões das instituições de um Estado laico. Não deveriam, no entanto, em meu entender, desvalorizar a importância de o Estado (pela mão de governantes que agem, sem disfarces, em obediência às sua crenças pessoais – mostrando-se incapazes de as separar das funções públicas, que ocupam mas não exercem condignamente, razão suficiente, até, para delas serem desalojados…) conferir à igreja católica um papel que não lhe cabe e direitos que, constitucionalmente, não pode ter.Se há tradições que justifiquem os “feriados religiosos” (sendo que estes não passam, como se sabe, de adaptações de festividades pagãs, muito anteriores à expansão do cristianismo, em geral, e do catolicismo, em particular), não pode aceitar-se que o nosso ordenamento jurídico acolha a prevalência de uma qualquer “tradição” que “obrigue” a dotar a igreja católica de mais direitos que os conferidos a qualquer outra religião, cuja dignidade, perante o Estado, tem de ser idêntica, por razões mais que conhecidas e explicadas, pelo que me abstenho de aqui as repetir.Talvez fosse esta uma oportunidade de reexaminar o tema dos “dias santos” das diversas religiões e acabar, de vez, com os privilégios inaceitáveis da igreja católica, distribuindo alguns desses feriados entre as diferentes religiões maioritárias, de modo a que os seus seguidores possam ter as mesmas possibilidades de os celebrar…Estou completamente à vontade, nesta matéria, porque equidistante de qualquer crença, já que só não me considero “tecnicamente” ateu nem agnóstico por me ser completamente indiferente a questão de existir ou não uma “entidade”, de bem difícil definição e racional entendimento, que tenha criado o Universo (distraidamente, por impulso tão casual como casual é a evolução do mesmo Universo…) e, para mais, nele insista em intervir “como lhe dá na telha”, com tanta arbitrariedade e subjectividade como o mais vulgar dos seres humanos – única conclusão que se pode tirar das narrativas, sobre si próprios e a sua história, elaboradas pelos diversos cultos, enredados na teia dos seus dogmas. Nenhuma religião que eu conheça é lisonjeira, relativamente ao deus ou deuses em que afirma acreditar, atribuindo-lhes características que, para não me alongar em considerações, diria que “só os comprometem”…O que não é admissível é que alguma dessas crenças se arrogue de uma pretensa superioridade moral, de resto em absoluto carente de provas, sobre quem se guia por princípios essencialmente assentes no respeito pela dignidade humana e na integridade pessoal de cada indivíduo. Muito menos que, com base nessa abusiva pretensão, procure imiscuir-se em assuntos que dizem respeito a todos os cidadãos, cuja liberdade de pensamento, de acção e de comportamento é posta em causa por essa invasão, em geral por fanáticos (mais do que simples crentes), de territórios que a todos pertencem, por igual.