Tenho investigado, escrito e falado, sobre educação. Falemos então de educação, falemos das crenças da mente que deve ser educada. Conhecido é que o autor do presente texto não tem sentimentos de fé. Conhecido é, também, que foi educado dentro das ideias ocidentais que, por acaso histórico, são cristãs. Ideias que são partilhadas, não apenas pelos cristãos romanos, arménios, ortodoxos gregos ou russos, libaneses, maronitas islâmicos ou de outros países orientais, em paz e convívio com os muçulmanos, essa grande maioria com quem o Ocidente comunga a mesma Bíblia. Bíblia designada pelos Muçulmanos El – al – Corão, texto ditado, por desconhecimento da escrita, pelo Patriarca Maomé a sua filha Fátima. Entre os cristãos romanos, anglicanos e presbiterianos, a Bíblia usada foi sendo escrita pelos reis da Palestiniana, por mulheres corajosas que lutaram pela sua liberdade, como Judite, e por sacerdotes ou reis que sabiam da História Palestiniana e ditaram as suas leis.
Quem quer que tenha sido o(s) autor(es) destes textos, como o Livro Êxodo, atribuído a Moisés ou, da mesma Bíblia, o denominado Génesis, dito ser uma verdade revelada pela divindade a Abram escrito pela sua filha Séfora. Digo, fosse quem fosse o autor dos textos, uma verdade é certa, as crianças devem aprender os princípios, leis, ideias, orações, rituais e pensamentos de interacção social, a partir de textos como os mencionados, aos quais devem-se, ainda, acrescentar as Cartas de Paulo de Tarso que lhe foram ditadas pelo irmão de Jesus, Tiago o Menor.
Formas de entender e interpretar a realidade, que eu designo por mente cultural, conceito organizado após análise de mais de trezentas crianças oriundas, especialmente, da Galiza, Portugal, Picunche da Cordilheira dos Andes na América Latina, Escócia, Inglaterra, França e Holanda. Povos que fazem das suas crianças devotos de dogmas, incutidos nas suas ideias para os orientar através dos afazeres da vida e da interacção social, das hierarquias e da relação entre classes sociais, como foi definido por Karl Marx, devoto luterano (casado com uma mulher profundamente católica), que Bento XVI, Joseph Ratzinger, louva no seu livro Jesus von Nazareth, editado em Alemão por Libreria Editrice Vaticana, Città del Vaticano, Abril de 2007, e em Outubro de 2007, em Português, editado por A Esfera dos Livros, Lisboa.
A mente cultural é esse conceito que guarda as ideias da interacção não somente na vida social, mas também na denominada vida no mais além, como no respeito pelos adultos e pelos colegas e amigos de escola ou brincadeiras. Conceito que todo o educador e analista da infância deve conhecer, para ser capaz de entender medo, arrebato, subordinação, obediência, livre arbítrio e outras actividades e pensamentos que nos acompanham até à morte, queiramos acreditar ou não.
Eu diria aos Educadores da Infância que ou se tem profundo conhecimento da catequese ou é impossível educar, como o tenho referido a médicos, psicanalistas e docentes de vários graus de ensino, para serem capazes de saber orientar. Ninguém, por este facto, está obrigado a ter sentimentos de fé, mas aqueles que os têm devem abster-se de os pregar, respeitando assim a procura insaciável dessa pequena, muita vazia por um tempo, mente cultural.
Não é porque eu o diga: são quarenta anos de experiência entre crianças e os seus adultos, que me têm mostrado que, apesar do abandono de crenças mais tarde na vida, o comportamento continua a ser pactuado em paz, serenidade e solidariedade, denominado pelos cristãos caridade, feio nome para quem deve conviver com outros: parece esmola, enquanto solidariedade é a mente cultural em actividade com respeito pelos outros.
Para educar, é preciso conhecer as bases da cultura que é a religião, e a religião, como sabemos, orienta a cultura.
Finalmente (não por ter acabado o texto) devemos entender uma outra crença da criança: a da confiança nos seus adultos, a sua emotividade. Emotividade, qualidade ou carácter de emotivo; que tem ou revela emoção. A emoção é a confiança e o amor que uma criança demonstra aos seus adultos. Adultos que as acolhem e acarinham. Emoção é uma experiência subjectiva, associada ao temperamento, personalidade e motivação. A palavra em inglês emotion deriva do francês émouvoir. É baseada do latim emovere, onde o é – (variante de ex-) significa ‘fora’ e movere significa movimento. O termo relacionado motivação é assim derivado de movere. Sendo a emoção uma delicadeza e gentileza dos mais novos para os membros da sua família, vizinhos e amigos.
Essa emoção gera confiança de amor para todas essas pessoas. Há, não entanto, emoções falidas, confianças falidas, enganosas, enganos no amor que a criança entrega ao seu adulto. Acontece imensas vezes, quando o adulto abusa dos mais novos, não apenas na sua emotividade, bem como no seu corpo. São os factos a que chamamos de pedofilia ou o amor libidinal de um adulto para uma criança. Criança obrigada pelo ser humano maior a aceitar intimidades corporais que não entende, como define Freud nos seus textos de 1906 escritos em Austro-Húngaro, traduzidos com a sua revisão, no mesmo ano, para a língua inglesa, intitulados Three Essays on the Theory of Sexuality e no de 1923, O Ego e o Id, publicado originalmente também em Austro-Húngaro (traduzido para a nossa língua, na Colecção Completa dos Textos de Freud, Imago 1999) e Melanie Klein, (1961 em Inglês) 1991 (em língua lusa): Inveja e Gratidão, Imago, Rio de Janeiro, intimidades que causam lesões emotivas na criança em relação à pessoa na qual tinha confiança. A criança nada entende, não tem experiência reprodutiva e o seu Id ainda não está desenvolvido, não precisa na sua tenra infância. Desta forma, a sua mente cultural desenvolve-se mais tarde, com uma lesão psíquica e emotiva. A sua mente cultural sofre e fica partida, como analiso em: O processo educativo: ensino ou aprendizagem? (1994), e desenvolvo, em vários artigos publicados na Revista Educação, Sociedade e Cultura, Afrontamento, Porto. As crianças ficam com medo à vida.
Tenho tentado curar esse medo que as desordens emotivas do adulto causam na infância abusada. Por vezes tem sido possível, outras, nem por isso. Como referi antes, Freud e Melanie Klein têm definido que o abuso sexual nas crianças fere tanto as suas emoções, que não lhes permite desenvolver o amor a si próprias, nem a sua transferência para uma pessoa que pretenda amar. A sociedade é a custódia definidora que todo o ser humano tem uma pessoa parceira e os pequenos abusados, com a sua emotividade assustada, apenas conseguem disfarçar esse amor e reproduzirem com pessoas de gâmetas diferentes: cada uma das duas células (masculina e feminina) entre as quais se opera a fecundação dos animais e vegetais.