PRAXEDES ANTI-ESPIRITA, por André Brun

1881 - 1926
1881 – 1926

 

Esbarrei esta tarde com o Praxedes. Eu ia distraído lendo um opúsculo de capa verde, que tinha recebido de manhã e, trocado o aperto de mãos da praxe, perguntei ao nosso amigo:

― Sabe o que é isto?

― Eu não.

― É o Boletim do Grémio Internacional de Espiritismo, referido a Dezembro de 1913. Você acredita em almas do outro mundo?

― Acredito, é claro; mas no espiritismo é que não creio.

― Essa agora!

― Nada. Comeram-me uma vez e não me comem segunda. Imagine o meu amigo que, há tempos, a Fifi tinha um namoro, cadete da Escola de Guerra e contou-me ela que o rapaz falava com os mortos, por meio de uma mesa de pé de galo. A cousa pareceu-me história; mas tanto ela teimou que era verdade, que me tirei dos meus cuidados e conversei com o rapaz, que me declarou ter estado ainda na véspera de cavaqueira amena com o próprio Napoleão…

― Toma!

― … E ofereceu-se para ir lá a casa fazer uma sessão de espiritismo. Ora eu tinha o maior empenho em descompor pessoalmente a memória da minha tia Pulquéria, que até á última hora me intrujou, dizendo-me que me deixava ficar tudo e afinal fez testamento a um padre. Aceitei a proposta do rapaz e, na noite seguinte, ele apareceu, acompanhado de outro sócio, também cadete e espirita. Põe-se a mesa no meio da sala, o namoro da Fifi senta-se ao pé da pequena, vem a sopeira, requisitada pelo outro cadete, e senta-se ao lado deste. Apagam-se as luzes e invoca-se o espírito da minha tia Pulquéria…

― E veio?

― Veio. A mesa pôs-se a dançar e eu já estava com suores frios. A minha tia começou por me responder uma coisa muito feia, mandando-me a um sítio que não sei se lho diga…

― Adiante…

― Nisto, a minha mulher deu um grito…

― De susto?

― Se lhe parece! O segundo cadete tinha-se enganado e, em vez de apalpar a sopeira, estava apalpando a minha Genoveva. Ah! meu amigo!… Peguei na bengala e os cadetes não pararam senão na Bemposta. Ora aqui tem porque eu não acredito em espiritismo.

16 de Dezembro de 1913
IN PRAXEDES, MULHER E FILHOS. CADASTRO DE UMA FAMÍLIA LISBOETA. 1916, GUIMARÃES & C.ª, EDITORES. RUA DO MUNDO, 68 – 70. LISBOA.

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