Selecção, tradução e nota introdutória por Júlio Marques Mota
UMA HISTÓRIA SOBRE LONDRES, SOBRE A GENTE NORMAL, SOBRE A GENTE BEM ESPECIAL
Nota Introdutória
Reunimos três peças a constituírem um conjunto, a primeira, uma viagem ao inferno da crise, uma viagem sobre a dimensão da crise em Portugal e na Europa, cuja publicação já se iniciou no blog A viagem dos argonautas; a segunda, uma viagem a Londres, ao One Hyde Park, ao mundo extraordinariamente sem sentido de Ali Babá e dos seus quarenta ladrões; e a terceira, uma viagem à procura do sentido da luta a assumir face à barbárie a que estamos todos nós a ser sujeitos, uma viagem até ao pensamento político de Obama e da sua visão do mundo e da política a seguir, de resto, o oposto que pela Troika tem sido imposto e desejado à escala europeia. E há ainda quem, muito bem informado, nos diga que na Alemanha o ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble, é apenas uma pomba face aos muitos falcões que por lá andam e que por lá dominam.
Chamo a atenção ao leitores de A Viagem dos Argonautas que o texto aqui apresentado é de um dos grandes especialistas em paraísos fiscais. Deste autor referencio em francês o livro :
Les Paradis fiscaux: Enquête sur les ravages de la finance néolibérale de Nicholas Shaxson .
A dar um certo charme a esta viagem podem pois visitar One Hyde Park e se quiserem podem levar o vosso carro Maybach ou eventualmente um Ferrari, de menos bom tom diga-se, que garantidamente o carro fica seguro à chegada à recepção. E boa viagem.
E é tudo.
Júlio Marques Mota
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UMA HISTÓRIA SOBRE LONDRES, SOBRE A GENTE NORMAL, SOBRE A GENTE BEM ESPECIAL
Nicholas Shaxson
Vanity Fair
Abril de 2013
Disponível em http://www.vanityfair.com/society/2013/04/mysterious-residents-one-hyde-park-london
Parte I
Quem é que vive realmente em Hyde Park, considerada a zona de construção residencial mais cara do mundo? Os seus proprietários, frequentemente ausentes, escondendo-se atrás das grandes empresas sediadas em offshores e protegidos dos impostos, dão-nos um retrato dos novos super-ricos a nível global.
Vida Moderna Uma das torres de Hyde Park projectada por Richard Rogers, faz um profundo contraste com o meio envolvente de matriz vitoriana. Fotografia de Dylan Thomas.
Até ao século XVIII, Knightsbridge, que faz fronteira com a elegante Kensington, era uma zona sem lei por onde vagueavam os monges predadores e os sórdidos assassinos. Uma zona que não era nada como nós a conhecemos ainda hoje, depois do boom vitoriano que nos deixou um legado encantador de belas casas vitorianas na sua maioria grandes e belas, com a sua marca de tinta branca ou creme, grades de ferro preto, tectos altos e curtos, elegantes degraus em pedra até a porta da frente. Esta não será a impressão com que fica agora um visitante quando ele aparece à saída sul da estação de metro de Knightsbridge. O visitante encontrará quatro pesadas torres a que se juntam as torres em vidro, metal e betão, apertadas entre os esplendores vitorianos do Hotel Mandarim Oriental, a leste, enquanto a Oeste se encontra um bonito bloco residencial de 5 andares.
Este é One Hyde Park, que os seus projectistas e designers insistem em considerar que é a zona residencial mais exclusiva do mundo e tem como base o projecto de desenvolvimento residencial mais caro já alguma vez construído em qualquer lugar na Terra. Com apartamentos a serem vendidos até por US $ 214 milhões, o prédio começou a registar recordes mundiais de preços por metro quadrado, quando as vendas abriram em 2007. Depois de rapidamente passarem por cima da crise financeira global o complexo chegou a incorporar o mercado imobiliário de Londres central, onde Charles McDowell, como consultor de High-End Propriedade, considerava que “os preços têm tido um comportamento maluco.”.
Do lado do Hyde Park, One Hyde Park projecta-se agressivamente para a linha do horizonte como uma nave espacial em visita, um pouco acima dos arredores de vermelho-tijolo e de um ambiente vitoriano em tom cinza-pedra dos seus vizinhos. No interior, no andar térreo, um lobby grande, vítreo, oferece o que se poderia esperar de qualquer hotel intercontinental de luxo: reluzentes estátuas em aço, tapetes grossos de tonalidade cinza, cinza mármore e candelabros extravagantes com feixes radiantes em vidro. Não é que os habitantes do edifício precisem de se aventurar em qualquer um desses espaços públicos: eles podem conduzir os seus Maybachs para um elevador de vidro e aço que os leva para a garagem do subsolo, do qual eles podem subir para os seus apartamentos.
Exemplo de um Maybach
O maior dos 86 apartamentos originais (após algumas fusões, existem agora cerca de 80) são atravessados por corredores espelhados de 213 metros de comprimento em vidro, alumínio anodizado e de seda acolchoada. As salas de estar apresentam pisos em carvalho europeu em escuro, produtos de mobiliário em tonalidades Wenge, estátuas em bronze e aço, ébano e muito mais em mármore. Para uma maior privacidade, venezianas verticais e inclinadas nas janelas impedem os forasteiros de espreitarem para dentro dos apartamentos.
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