O BCE DEVERÁ COMEÇAR A FINANCIAR AS INFRAESTRUTURAS PÚBLICAS E AS SUAS NECESSIDADES DE TESOURARIA – por BILL MITCHELL – III

Falareconomia1

Selecção e tradução por Júlio Marques Mota

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O BCE deverá começar a financiar as infraestruturas públicas e as suas necessidades de tesouraria

Bill Mitchell, ECB should start funding government infrastructure and cash handouts

Billy Blog, 30 de Março de 2015

(CONCLUSÃO)

Se alteramos os pressupostos para reflectirem mais os factos do mundo real os modelos da equivalência ricardiana não aguentam a mudança de qualquer das suas hipóteses e fornecem depois previsões muito diferentes. Nesse sentido, consideramos que o seu quadro de trabalho nem é fiável nem é útil.

Além disso, num sentido empírico, o teorema de equivalência ricardiana foi mostrado ser um fracasso regularmente e não deve ser usado como uma autoridade para guiar qualquer projecto de política económica.

Então no que estava a pensar Skidelsky?

Ele afirma que depois dos pacotes de estímulo orçamental iniciais em 2008-09:

Os assessores económicos asseguraram aos seus chefes que a retoma seria rápida. E houve sinais de retoma; Mas a retoma parou em 2010. Entretanto, os governos foram assumindo grandes défices – um legado da crise económica – que um renovado crescimento era suposto reduzir. Na zona euro, países como a Grécia enfrentaram crises de dívida soberana, assim como os resgates de bancos transformou a dívida privada em dívida pública.

Mas ele admite que os governos “comprometeram-se a uma contracção orçamental” rapidamente depois de se terem introduzido os pacotes de estímulos orçamentais.

Ele não parece fazer a ligação com o bloquear do crescimento.

Porque não?

Qual a sua explicação?:

Uma vez que as crenças e expectativas são introduzidas na economia, como é certamente razoável, os resultados da política orçamental tornam-se indeterminados. Muito depende do que as pessoas pensam do que vão ser os resultados da política económica seguida. No calão dos economistas, os resultados da política são “dependentes do modelo.”

Mas para mostrar que a política real tornou as coisas piores não significa que uma melhor política esteja actualmente disponível. O verdadeiro sucesso da política pode então depender e em muito das expectativas do público quanto aos resultados dessas mesmas políticas. A questão não respondida é então porque é que o público deve ter expectativas erradas.

As expectativas são importantes na condução dos comportamentos económicos. Esta é uma posição correcta mas dificilmente justifica a ideia de que a política orçamental se torna ineficaz porque as pessoas são levadas a acreditar que ela é ineficaz.

Isso é o absurdo que emerge das análises dos economistas neoliberais.

Então, aqui estão alguns exemplos de medidas de estímulo orçamental. Interroguem-se sobre o que esperam que tenham sido os impactos desses estímulos.

O governo nacional, responsável pela emissão de moeda, enfrentando elevadas taxas de desemprego, de profundas causas, e o aumento continuado da pobreza num ambiente de vendas deprimido e de fracas medidas de apoio às pessoas de baixos rendimento anuncia que introduzirá uma – Garantia de emprego.

O governo diz aos cidadãos, sobretudo a todos aqueles  são cépticos quanto aos défices orçamentais, que oferecerá um emprego com um salário razoável (mínimo socialmente viável e inclusivo) para qualquer pessoa que não consegue encontrar trabalho noutros lugares.

Esta oferta de emprego é permanente e incondicional e o salário será protegido em termos reais ao longo do tempo.

A diferença entre o salário e o subsidio de rendimento pago não é insignificante.

  1. Será que irá haver uma redução na taxa de desemprego? Definitivamente. Não completamente, porque alguns trabalhadores de mais elevada qualificação podem evitar a possibilidade de garantia de emprego e sair para um emprego melhor. Eles também podem ter indemnizações de despedimento. Então eles irão permanecer na situação que chamamos de «Esperar sem emprego». Mas a maioria dos desempregados irão assumir os seus empregos.

  2. Os trabalhadores recentemente empregados que estavam a debater-se contra a pobreza gastarão mais devido a posição de garantia de emprego que lhes é garantida? Quase que certamente. A propensão a consumir por alguém em situação de quase pobreza é quase 1, o que significa que para cada dólar extra que ganhem eles gastá‑lo‑ão.

Alguns trabalhadores agora empregados por este programa claramente aumentarão as suas taxas de poupança também.

Mas haverá um aumento contínuo da despesa agregada.

  1. Será que a despesa adicional irá induzir ainda mais despesa? Ou seja, são os multiplicadores de despesas acima de 1? Mesmo o FMI admite agora que os multiplicadores de despesas podem ser cerca de 1,7 numa recessão. Então não só os trabalhadores de Garantia de Emprego gastarão o seu rendimento extra mas será certo que estes gastos vão estimular as vendas em toda a economia, o que irá induzir ainda mais produção, mais emprego e mais pagamentos de salários, o que conduz a um aumento da despesa global superior ao inicial da Garantia de Emprego. .

  2. Irão os trabalhadores ficar preocupados com o défice orçamental e não gastar o seu rendimento adicional? Nenhuma possibilidade de ser assim. Mesmo se eles fazem parte da direita neoliberal na sua posição ideológica e na sua visão sobre o mundo , eles vão passar a gastar mais – a pobreza é dura, consumir é melhor.

  3. O que farão as empresas ? Elas suprimiam os investimentos em período de recessão porque o stock de capital existente (máquinas e equipamentos) era bem suficiente para responder aos baixos níveis de vendas.

Quando aumenta a despesa, eles verificarão que precisam de maior capacidade produtiva para manter a sua quota de mercado e isto irá induzir a mais compras, agora em bens de investimento, especialmente tanto quanto eles  percebem que a Garantia de Emprego será permanente e os rendimentos continuarão a ser pagos aos trabalhadores.

Como ocorre mais actividade económica, a Garantia de Emprego pode reduzir o seu programa e os trabalhadores poderiam transitar para  outros empregos que pagam mais elevados salários e isso significa que a retoma já ganhou raízes, que está para ficar.

Exemplo 2 – o governo estabelece um programa substancial de encomendas ( um concurso público)  para realizar novos sistemas de transporte público de massa ou para novas infra-estruturas educacionais ou de saúde. Os contratos para a construção garantem pagamentos durante as próximas duas ou três décadas.

  1. o leitor acha que os operadores empresariais na construção e nas infra-estruturas recusarão o concurso para essas oportunidades, porque eles estão preocupados com maiores taxas de imposto que poderão vir a pagar depois?

  2. o leitor acha que as empresas que ganharam a adjudicação dos contratos recusarão a aumentar a produção e o emprego – mesmo as empresas mais conservadoras (politicamente) aproveitam os contratos com o governo para expandirem a sua actividade. .

Não há provas que tais medidas de estímulo vão chocar contra a parede das ‘expectativas’ e deixem de apoiar a actividade económica.

É somente quando os governos introduzem a incerteza política, e passam a defender que a austeridade é necessária quando a economia ainda não está totalmente recuperada – e a confiança permanece muito baixa-  então esse  pessimismo aumenta e domina a poupança privada.

Conclusão

O leitor pode ver a contradição entre o artigo de Skidelsky no Guardian UK e a carta ao FT que ele assinou.

Não vou tentar especular sobre o que estava na sua cabeça em ambos os casos.

Mas o BCE deve seguir os nossos conselhos e o mal-estar da zona euro acabaria muito rapidamente.

Bill Mitchell, ECB should start funding government infrastructure and cash handouts. Texto disponível em: http://bilbo.economicoutlook.net/blog/?p=30527 . Edição autorizada pelo autor.

Publicação autorizada pelo autor.

That is enough for today!

(c) Copyright 2015 William Mitchell. All Rights Reserved.

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Para ler a Parte II deste texto de Bill Mitchell, publicada ontem em A Viagem dos Argonautas, vá a:

O BCE DEVERÁ COMEÇAR A FINANCIAR AS INFRAESTRUTURAS PÚBLICAS E AS SUAS NECESSIDADES DE TESOURARIA – por BILL MITCHELL – II

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