36. Caderno de notas de um etnólogo na Grécia – Deuses ctónicos II

Falareconomia1

Selecção e tradução de Júlio Marques Mota

Revisão Flávio Nunes

(continuação)

“A razão da minha demissão, já para os que me conhecem um pouco melhor é evidente. Não posso defender a aplicação de uma política na qual não acredito mais e na qual não posso ter mais nenhuma confiança. Todas os homens e mulheres que conjuntamente tinham apoiado durante os dez últimos anos as acções de SYRIZA, da mesma maneira que, de resto, desde o 25 de Janeiro passado apoiávamos este primeiro governo de esquerda desde a guerra (1940), ei bem, nós todos, sofremos agora uma esmagadora derrota política”.

“A capitulação do governo face ao neoliberalismo não foi somente a consequência da chantagem exercida pela Troika, porque esta capitulação esta na perfeita sequência desta “linha” política, táctica como estratégica da parte da direcção SYRIZA e do governo, e isso, ignorando de maneira intencional tanto o programa do partido como as suas decisões, estabelecidas nas reuniões e nos congressos. Assim, o governo alinhou-se de uma forma progressiva com a lógica dos adversários contra quem se confrontava, esta, a lógica de uma pretensa “ unidade nacional”. Resultado, SYRIZA… enfrenta doravante o seu pior pesadelo: fazer votar e seguidamente fazer aplicar memorandos, em vez de os “rasgar”.”
“Este memorando III é então concretizado da pior maneira, e a sua assinatura foi então uma escolha, oscilante entre o suicídio e a execução sumária, o todo, sob a pressão de um golpe de Estado económico bem singular, de acordo com uma lógica política planificada “pelas instituições”, tanto internas como externas, uma lógica em suma do chamado parêntese de um governo de esquerda”.

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A ruptura SYRIZA. Imprensa do momento, 17 de Agosto

 

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Locais a alugar somente e « Grécia » Atenas. Atenas, Agosto de 2015

 

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Efemérides do momento. Atenas, Agosto de 2015

“Salvo que a Esquerda não pode assinar memorandos tão pesados e tão insuportáveis para as classes laboriosas; o Memorando de esquerda não deve existir. A Esquerda não é esta força de gestão ao serviço do sistema, que irá até à venda dos bens públicos aos fundos especulativos, mas pelo contrário, a esquerda é uma força política da mudança, favorável primeiro que tudo à maioria social. A Esquerda não deve, por conseguinte, investir-se numa melhor gestão, admitindo o fim do história’ ou aceitando a “TINA” neoliberal (não há alternativa)”.

“A esmagadora vitória do “NÃO” ao referendo do 5 de Julho é primeiramente a herança da Esquerda na sua qualidade de força anti sistémica. Com esta dever-se-ia por conseguinte preparar um plano alternativo para nos libertarmos desta situação, contra os memorandos e das políticas de austeridade e certamente para além deles, tendo como única regra enunciada face ao povo grego, a verdade e a defesa dos interesses “das pessoas do ” fundo da escala dos rendimentos “. E como o espero doravante, é tempo para que toda a gente deste mundo de SYRIZA, como para toda a Esquerda, de considerar que não pode haver política que vá no sentido do interesse comum, concebida no quadro dos credores ou no da zona euro.”
“As contra medidas ditas “de alívio” (argumento do governo) são mesmo impossíveis de pôr em prática. A mutação de SYRIZA e do governo ilustra por último o nosso falhanço colectivo. Cada uma e cada um de entre todos nós, deveria doravante, tanto colectivamente como no plano individual, tomar a sua decisão política. No que me diz respeito, fi-lo. É “NÃO”. Nikos Mavromatakos, Rodes.” (imprensa local e rádio 105,5, a 18 de Agosto).

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Os jovens viverão livres. Atenas, Agosto de 2015

 

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Distopia mural. Atenas, Agosto de 2015

 

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Expressão ! Atenas, Agosto de 2015

“Os jovens viverão livres” pode-se ler sobre uma fachada de Atenas neste tempo do distopia e de anacronia, agora galopantes. Nos ares do tempo também existe esta decisão colectiva e oficial da juventude SYRIZA, de resto pouco mediatizada pela imprensa, que se dessolidariza certamente do governo e do memorando Tsipras. É mesmo assim muito importante saber, sabe-se também que os jovens eleitores optaram massivamente pelo “NÃO” no referendo do 5 de julho.

Nestes últimos tempos enfim, que se tornaram tempos de operações politiqueiras, iniciadas ou preparadas, anunciadas e às vezes imediatamente adiadas pelo Tsipriotas. Uma vez mais e demasiado, a Constituição é maltratada, ou mesmo violada, e o funcionamento “do Parlamento” fica mais que irregular, respeitando primeiro que tudo o calendário da Troika.
Assim, Alexis Tsipras, regressado depois de uma curta estada em Cyclades (Milos et Sikinos), rapidamente anunciou (na desordem): o encerramento do Parlamento e o seu funcionamento doravante via as sessões de verão (grupos de eleitos numericamente restritos), uma reunião plenária da Câmara na eventualidade de um voto de confiança por iniciativa do governo, o estabelecerem-se eleições legislativas antecipadas para o mês de Setembro, seguidamente para o mês de Outubro… ou para o mês de Novembro. Anúncios imediatamente desmentidos ou adiados, os Tsipriotas de “Maximou acordam então entre si alguns dias de reflexão” relatou a notícia da semana.

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Alexis Tsipras em Milos e em Sikinos. Agosto de 2015

A sombria realidade é simples: como os deputados do “ NÃO”, essencialmente os da Plataforma de esquerda fazem ainda oficialmente parte de SYRIZA, e como a constituição de grupos ditos de verão no Parlamento é um procedimento totalmente controlado pelos chefes dos grupos parlamentares, estas sessões assim e por bem estivais que elas sejam, acabarão sem dúvida por para adoptar o essencial das medidas do memorando III em algumas semanas apenas, sem debate e sem… aventuras.
Acessoriamente, a não-constituição autorizada de um grupo separado depois da cisão (sempre não oficial), privaria muito provavelmente os eleitos da Plataforma de esquerda de certos direitos, nomeadamente a atribuição de um certo tempo radiofónico e televisivo, sempre na eventualidade do comportamento de um voto legislativo antecipado.

O jogo político sendo essencial e decididamente nas mãos dos Troïkanos (consequentemente de Berlim e Bruxelas), os Tsipriotas entregam-se então a um jogo polítiqueiro, exactamente da mesma maneira que os politiqueiros da Nova Democracia e o PASOK… mutação obriga!

Contra toda a deontologia política, Nikos Pappás, conselheiro muito próximo de Alexis Tsipras e ministro junto do Primeiro-ministro, acaba de declarar (aos jornalistas “do Diário dos Editores”) que “a Plataforma de esquerda, propõe ao mesmo tempo o dracma e o memorando”. Recordo-me que aquando de certas discussões nestes últimos meses, os meus interlocutores e membros da Plataforma de esquerda, qualificavam frequentemente Nikos Pappás, “de grande arrivista, muito simplesmente”, aí está como está o ambiente… neste (último?) momento Syrizista.

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O imóvel onde viveu Maria Callas nos anos 1930-1940. Atenas, Agosto 2015

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Alegorias, Museu da Acrópole, Agosto de 2015

 

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Estela mencionando os dracmas dos tempos antigos. Época clássica, museu da Acrópole, Agosto de 2015.

As melodias gregas do momento são sobretudo melodias tristes e Maria Callas não está em condições de observar a ruína do edifício onde morou quando aqui realizava os seus primeiros passos na sua arte.

(continua)

36. Caderno de notas de um etnólogo na Grécia – Deuses ctónicos I

 

Uma colectânea de alguns dos textos publicados por Panagiotis Grigoriou
Tradução Júlio Marques Mota
Revisão Maria Cardigos
Texto original publicado pelo sítio greek crisis
Panagiotis Grigoriou, Carnet de notes d’un ethnologue en Grèce, une analyse sociale journalière de la crise grecque. Texto disponível no site greekcrisis, cujo endereço é : http://www.greekcrisis.fr/

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