A GALIZA COMO TAREFA – adeus aznarismo, adeus, 1 – Ernesto V. Souza

mariano-rajoy-con-jose-maria-aznar-ppPela calada e devagarinho o Presidente Rajoy foi afastando-se, anulando, eliminando a presença e legado  de José Maria Aznar, o seu antecessor no PP e na fação conservadora do Governo da Espanha.

Sem o declarar -mas é hoje evidente, após os resultados nas últimas convocatórias eleitorais – o PP tem protagonizado uma das maiores viradas de narrativa e modos da política espanhola na última década.

Se bem é verdade que cada líder deixa uma forte impronta em partidos tão “cesaristas” como são os da Espanha, não é menos certo que a pegada afinal é menos profunda do que parece. O aznarismo há uns anos evidente hoje é residual no discurso político. Associado à corrupção, ao ultranacionalismo liberal e à aliança com os USA para a nefasta guerra do Iraque, o modelo conservador proposto, teorizado e promovido pela FAES, foi ficando marginal até que nesta mesma semana anunciou a sua independência do PP.

O aznarismo com o seu discurso bronco, ultra-nacionalista espanhol, centralista e de modos combativos e exagerados, deixou um legado político conflituoso e uma sociedade muito fragmentada. Parece evidente que a estratégia de confronto nacionalista de Aznar e do PP na altura gerou por uma banda uma nova esquerda social (também patriótica e nacionalista) permanentemente mobilizada e por outra ativou a questão catalana em forma de processo independentista.

Resulta neste sentido muito interessante a evolução discreta do liderado de Mariano Rajoy à cabeça dos conservadores espanhóis.  Sem mudar muito, apenas na ostentação discursiva, a prática ultra-liberal e de desmatelamento do estado social e de direito, Mariano Rajoy  tem ido consolidando a sua figura e o seu estilo no Partido Popular.

É interessante lembrar que Rajoy não era o candidato preferido nem pelos mais dos votantes do PP, muito radicalizados na altura, nem pelas mais destacadas figuras políticas de época Aznar. Como sabemos Rodrigo Rato e Mayor Oreja eram os preferidos e entre os aspirantes figuravam Esperanza Aguirre ou Ruiz Gallardón.

Candidato no PP, após a renúncia de Aznar e após a desastrosa gestão política dos atentados do 11 M/2004, a sua foi uma figura mais que questionada, da que os opinadores políticos, tertulianos e simpatizantes do PP não esperavam mais que a cada passo a sua renúncia.

Porém, da oposição contra Zapatero até a volta do PP ao poder em 2011 passaram duas legislaturas, a segunda em suspenso e prolongada e a crise económica percorreu uma assustadora primeira fase, que começou com ajustes económicos e se revelou uma verdadeira involução política e social a escala europeia.

Internamente, porém o candidato inoportuno foi desenvolvendo em fases uma estratégia de consolidação do seu poder. Profissional da política, subiu desde abaixo mas desde dentro, discretamente com aparência de segundo, manifestando-se porém como um líder resistente, capaz de jogar bem com os tempos, homem mais de atos discretos que de gestos e de trabalhar devagarinho foi preparando pela calada a grande virada.

Arredor dele, aguentando as críticas e ataques, deixando fazer e deixando opinar sem intervir, soube se construir um aparato, aos poucos mas à medida entanto a velha guarda aznariana ia desaparecendo ou cometendo erros. Rodeou-se também de figuras dramáticas e exageradas que como o ministro Wert e Ruiz Gallardón serviram de pantalhas e concentravam as imagens e a oposição, para livre dos focos desenvolver uma selvagem política económica em segundo plano.

A imagem de ausente, despistado e político quase acabado resultou ser tremendamente enganosa, em especial para a oposição interna que o subestimou e para a externa que não terminou de o avaliar como o temível, tenaz e implacável inimigo que em realidade é.

Com um conhecimento profundo do sistema político e parlamentário espanhol, o Presidente Rajoy tem ido deslocando o debate contra a Catalunha do plano do debate simbólico e dos direitos; reduzindo o debate constantemente a questões legais e administrativas; para ao mesmo tempo policial, economica e diplomaticamente envolver-se em uma dura campanha a contra.

Mas deixemos a Catalunha, o processo catalão encontra-se talvez numa fase muito avançada para que as estratégias de Rajoy tenham efeito. Mas como afeta isto tudo à Galiza?

Consideremos que desde 1997 o nacionalismo espanholista de Aznar, gerou também na Galiza uma movimentação reativa que tomou forma num aumento das forças e visibilidade do nacionalismo galego, que após uma fase de incremento eleitoral chegou entre 2005 e 2009 a formar parte do Governo da Xunta.

A perda em 2009 da Xunta em favor do PP de Nuñez Feijó, ainda acontece com um PP de liderado hesitante, e com o discurso nacionalista espanhol e modos aznarianos muito evidentes. Curiosamente será da Galiza que o PP tome jeitos, modos, poder e quadros.

Num partido onde ainda o peso e políticas do Fraguismo eram notórios, mais o eram na Galiza, onde após uma desapiadada luta pelo poder, houvera uma aparente submissão aos modos da cúpula dirigente em Madrid. De um modo paralelo à evolução de Rajoy, fingimento, situação, consolidação, poder, o PP na Galiza tem percorrido um caminho não evidente do aznarismo até o presente.

Liberados progressivamente, Rajoy, Feijó e o PPG da pressão do aznarismo e do discurso ultra espanholista, castelhanista, unitarista e centralista, e necessitados da estrutura caciquil para apanhar o voto local galego, o PPG com o vento a favor da mudança na própria cúpula de poder tem-se re-galeguizado ou está a recuperar alguns dos modos e modelos dos tempos de Manuel Fraga.

Volta o discurso regionalista, ou a manifestar-se o nacionalismo espanhol ao modo galego, tão diferente do de Aznar (mas talvez muito mais perigoso) e no que o partido, na Galiza, está mais cómodo; neste processo foi desaparecendo o peso da FAES e dessa imitação regional que foi Galicia Bilingue e o discurso supremacista pro-castelhano.

E não apenas, o processo ou o sentido dos atos de Rajoy, opacos para os mais dos analistas espanhóis, foram mais que claramente percebidos na Galiza, não apenas pelos votantes e simpatizantes do PP, quanto também pela oposição de esquerda.

Provavelmente também é a esquerda galega a primeira que soube perceber a virada e a perca de espaço do aznarismo. Mais nacionalismo espanhol discursivo gerou mais nacionalismo galego em oposto. Sem a sombra de Aznar outros discursos, mais focados na questão económico social, emergiram.

Com efeito, seguindo a moda que marca Madrid pode-se entender a política última e estratégias dos principais partidos da Galiza, a fim de contas, a Villa y Corte, há muito tempo que é a capital da Galiza e destino dos galegos “listos”.

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