Crise da democracia, crise da Política, Crise da Economia: o olhar de alguns analistas não neoliberais – 13. Análise do ciclo económico da economia europeia no verão de 2016: nenhuma recuperação em lado nenhum (última parte). Por Heiner Flassbeck

Seleção e tradução de Francisco Tavares, revisão de Júlio Marques Mota

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13. Análise do ciclo económico da economia europeia no verão de 2016: nenhuma recuperação em lado nenhum. Última parte: Construção, retalho, desemprego. Recomendações.

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Por Heiner Flassbeck, publicado por Flassbeck-economics em 24 de Agosto de 2016

 

Na UEM, a produção da atividade de construção tinha também uma tendência decrescente em Junho (ver figura 1). A breve reanimação que tínhamos testemunhado na passagem do ano desapareceu completamente. No total, o volume de construção situa-se aproximadamente 10% abaixo do nível de 2010. A situação é particularmente má em França, onde a construção está 15% abaixo do nível de 2010. O desempenho da Alemanha é melhor, mas não há dúvida que se trate de uma recuperação: a crescente atividade dos primeiros cinco meses do ano acabou.

Figura 1

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Construção na UEM

Na Europa do Sul, Itália incluída, também não se registam alterações (ver figura 2). Itália e Portugal mantêm-se no nível que já tinham atingido em 2014. A Espanha ainda está numa tendência crescent mas muito lenta e permanece mais de 40% abaixo do nível de 2009.

Figura 2

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Construção em Itália, Espanha e Portugal

Torna-se claro quão desastrosa é a situação quando se observa o volume de construção em alguns dos mais importantes países da Europa Central e do Leste (ver figura 3). Em vez de recuperarem, Hungria e Polónia caíram dramaticamente e a República Checa e a Bulgária estão agora numa profunda depressão.

Figura 3

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Construção na Europa do Leste

 

As vendas a retalho na Europa foram durante vários anos o único indicador em sentido ascendente (ver figura 4). Há um movimento ascendente desde 2013. Este movimento está a ser conduzido pela França, enquanto na Alemanha, após um breve surto no ano passado, está de novo a enfraquecer. A Itália rmantém um índice de 95 que é 5% inferior ao nível de 2010.

 

Figura 4

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Vendas a retalho na eurozona e nos principais países

Espanha, Portugal e Grécia estão ainda claramente abaixo dos níveis de 2010. Atualmente, as vendas a retalho na Grécia estão 30% abaixo do nível de (ver figura 5).

Figura 5

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Vendas a retalho em Espanha, Portugal e Grécia

Perante este devastador desenvolvimento económico, o desemprego na eurozona permanece num desastroso nível elevado de mais de 10% (e isto segundo os dados oficiais). Desde meados do ano passado, a Itália e a França praticamente não fizeram progressos na redução do número de desempregados (ver figura 6).

Figura 6

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Desemprego na UEM

 

A evolução dos preços mostra que a zona euro permanece em deflação (ver figuras 7 e 8). Nos principais países, os preços não apresentam uma tendência clara e permanecem perto da linha zero. Os preços na produção recentemente diminuiram ligeiramente menos, mas mantêm-se em menos 3% quando comparados com o ano passado.

Figura 7

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Preços no consumidor em alguns países da UEM

Figura 8

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Preços na produção em alguns países da UEM

 

Consequências para as políticas económicas

As conclusões de política económica que podem ser retiradas são óbvias. A Europa tem de tomar medidas para superar esta estagnação permanente. Comparando a Europa com os EUA desde 2005 (ver figuras 9 e 10) vê-se claramente que a fraca recuperação nos EUA foi incomensuravelmente mais forte do que aquilo que muitos ainda inacreditavelmente referem como um “boom” na Europa.

 

Figura 9

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Produção industrial e PIB real na Europa

 

Figura 10

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Produção industrial e PIB real nos EUA

Contrariamente ao sucedido nos EUA, segundo os dados oficiais do PIB, a Europa conseguiu apenas agora atingir o nível de 2008. Atualmente, em virtude de uma política económica pragmática, os Estados Unidos encontram-se mais de 10% acima do nível de 2008. Estes dois últimos dados mostram também quão problemáticos são os cálculos oficiais do PIB na Europa. Já comentámos esta questão na primeira parte deste texto. Em todos os anteriores ciclos na Europa – e igualmente nos EUA – a produção industrial cresceu mais fortemente do que o PIB desde o início da resuperação.  Isto parece ter-se alterado na Europa após 2013, quando o PIB teve exatamente o mesmo crescimento que a produção industrial.

Os estatísticos europeus têm de explicar que fatores são responsáveis pelo crescimento do PIB que eles apresentam. O impulso não vem da produção industrial porque após 2013 a produção industrial começou a estagnar. E não se trata apenas da Alemanha. Desde o segundo semestre de 2015, a Espanha divulgou também um crescimento regular nos últimos trimestres em relação aos trimestres anteriores de 0,8% e 0,7%, respetivamente. Nenhum dos principais indicadores justifica uma tal taxa de crescimento. Ninguém pergunta de onde vêm estes números.

Já tínhamos dúvidas sobre a veracidade destas estatísticas em 2015. Após a crise financeira, o declínio do PIB de Espanha ficou muito abaixo dos números gregos, embora os indicadores medidos e o crescimento do desemprego indicassem um aproximadamente igual decréscimo. Mas isto não tinha interesse nenhum para o público ou para os políticos. Aceitam-se os dados das estatísticas oficiais sem se perguntar nada desde que os dados encaixem com a história que é considerada politicamente aceitável.

A Europa perdeu mais três anos falando de uma recuperação que na verdade nunca ocorreu.  Nada aconteceu, para além das tentativas sem êxito para estimular a economia através de políticas monetárias. Isto é fatal. As taxas de desemprego extremamente elevadas empurram as pessoas para o desespero e a frustração. Estes são, por sua vez, os terrenos de cultivo do radicalismo e dos movimentos anti-democráticos. Evidentemente que reempregar pessoas após um longo período de desemprego torna-se cada vez mais difícil.

No cerne disto está o mercantilismo germane-holandês, que é responsável juntamente com a governação económica de austeridade. Os meios de comunicação continuam a silenciar completamente qualquer tentativa de questionar esta óbvia insanidade. Até o BCE, que tenta sem êxito enfrentar o mal-estar, é criticado mais e mais pelos fanáticos da austeridade. Mas quanto mais cerram as fileiras estes traficantes da austeridade, mais aberto e alto se torna o criticismo no resto do mundo. É mais do que tempo.

Texto original em: http://www.flassbeck-economics.com/cyclical-analysis-of-the-european-economy-in-the-summer-of-2016-no-recovery-anywhere-part-3-construction-retail-unemploymemt-and-recommendations/

 

 

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