CARTA DE BRAGA – “Post-it na tampa do computador” – por ANTÓNIO OLIVEIRA

 

 

A Comissão Europeia afirma que Portugal tem mais de 700.000 trabalhadores com contratos a prazo ou ainda mais precários, apesar de estarem ‘involuntariamente’ nessa situação! (muito espanta este ‘involuntariamente’, vindo de onde vem!)

Espanto fundamentado pois a notícia acrescenta que a Comissão até salientava que “os contratos temporários continuam a ser a norma para os desempregados encontrarem trabalho“, mais destacando ser essa uma luta antiga de Bruxelas, que “gostaria de ver o despedimento individual mais facilitado”!

Não sou especialista neste campo mas sei, até por mim e há muitos anos, que as pessoas na minha situação, os reformados, também são vistos, mais os tais ‘involuntários’ como os responsáveis principais de tudo o que de mal tem acontecido por cá, nas finanças do Eucaliptal.

Aliás, as primeiras normas que a tal Comissão e o FMI, o outro dono das finanças, aqui impuseram, não se esqueceram de mencionar salários e reformas como alvos para abater!

Para além dos dramas individuais e colectivos que tais situações implicam e, por tudo o que sabemos, parece mesmo que não querem resolver, uma nova palavra ataca agora em tudo quanto é escrevedura, o burnout ou o burn-out (já a vi exposta destas duas maneiras).

Recorrendo à Wikipédia para uma eventual explicação, leio que se trata de “um estado de esgotamento físico e mental cuja causa está intimamente ligada à vida profissional“.

Ninguém duvida, por sabermos bem, que o trabalho ocupa o lugar mais importante da vida do cidadão, a começar pelas relações sociais, mas a influir também com a desejável ligação à natureza e ao ambiente em que desenrola toda a sua vida, tanto privada como colectiva.

E nestes tempos, onde a urgência é já e também uma instituição, damos conta das pressões enormes que sujeitam o trabalhador, porque a partir da industrialização e, depois com a globalização, o conceito de ‘tempo’ saltou dos ciclos ligados à agricultura para quem tem o domínio e controlo dos meios de produção e, consequentemente, para a tirania do relógio.

Aqui e agora, para o trabalhador tudo é ‘tempo’ e ‘preço’, desde o perdido no caminho entre a casa e o lugar de trabalho, até à ‘concorrência’ da automação e mesmo do ‘trabalho’, aquele que as empresas já impõem ao consumidor (abastecimentos, self services, compras, banco online e outros), fazendo dele mais um trabalhador em tempo parcial, dando ‘grátis’ muito do seu para substituir alguns dos que foram ‘desactivados’!

Convém adiantar que, se escrutinarem os projectos de trabalho e investimento de corporações e empresas, poderão ver que lá estão bem integradas, com este ou outros nomes, aquelas ‘inversões desinteressadas’ dos consumidores.

Ultimamente, também se fala muito de teletrabalho, a negação total do conceito de ‘tempo próprio’, exclusivo e privativo, hoje já quase consumido pelo colectivo das redes sociais, elas também e como se sabe, mais umas e boas fontes de poder para potentados financeiros.

A propósito, a especulação financeira fomentada e sustentada quase totalmente pela industrialização e pela globalização, arrasta e encaminha para a desigualdade, a que muitas análises afirmam também levar à estatuição e validação da injustiça – a vida folgada dos donos dos recursos financeiros, frente à modéstia e à precaridade dos que só têm trabalho para produzir bens e serviços para consumo de toda a gente.

E, também por isto, viremos a aprender algum dia, que o trabalhador tem de ‘compreender e saber’ que usar o ‘tempo livre’, quando o tem, em proveito próprio, é cada vez mais urgente?

Não consigo passar sem lembrar Tony Bennett que, li algures, disse um dia “a vida, se tiveres tempo, até acaba por te dar tranquilidade” mas, ajunto agora eu, só se evitares voltar para casa com alguns ‘post-it’ na tampa do portátil, se o tiveres!

António M. Oliveira

 

Não respeito as normas que o Acordo Ortográfico me quer impor

1 Comment

  1. Na verdade, ja não nos safamos de alguns ” post – it”, mas começámos a perceber que o “tempo” ganhou nova perspectiva. é tudo na hora e não há horas para, livremente, vermos, calmamente, passar o tempo…
    Obrigada, amigo!!GOSTO DE TE LER!!!

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