Sobre as razões que estão na base dos focos de tensão entre a China e os Estados Unidos – 23. China não pode converter em armas os seus títulos do tesouro dos Estados Unidos. Por Michael Pettis

Tensão EUA China 0

Seleção e tradução de Júlio Marques Mota

23. China não pode converter em armas os seus títulos do tesouro dos Estados Unidos

michael pettis Por MICHAEL PETTIS

Publicado por Carnegie Michael Pettis em 28 de maio de 2019 (Original aqui)

 

Nota: Esta é uma versão atualizada do texto publicado em janeiro de 2018 neste blog. A versão original pode ser vista aqui.

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Uma série de artigos recentes sugerem que as autoridades chinesas podem reduzir as suas compras de títulos do governo dos Estados Unidos. É muito improvável que a China possa fazê-lo de forma significativa, porque fazê-lo seria quase certamente oneroso para Pequim. E mesmo que a China desse esse passo, isso não teria impacto ou teria um impacto positivo sobre a economia dos EUA.

 

As sugestões de alguns responsáveis chineses de que poderiam reduzir as suas compras de títulos do tesouro dos Estados Unidos mostram a que ponto o mundo compreende mal o que é a balança de pagamentos. Eis o que um recente artigo do Financial Times diz sobre isso:

Foi um dado inquietante para os investidores na semana passada, metido no meio de uma tabela esotérica divulgada pelo governo dos EUA, que acompanha quantos títulos do tesouro os investidores estrangeiros compram e vendem. A China, o maior credor estrangeiro do governo dos EUA, com um total de ativos do Tesouro superior a $1,2 milhões de milhões, vendeu $20 mil milhões de dólares em títulos com uma maturidade superior a um ano em março, de acordo com os dados do governo dos EUA. As vendas totalizaram o maior recuo do mercado chinês em mais de dois anos.

 

O artigo prossegue sugerindo que a redução da detenção pela China de títulos do Tesouro dos EUA pode refletir uma resposta estratégica à escalada do conflito comercial entre Pequim e Washington:

Os dados reacenderam temores de que Pequim possa transformar em armas as suas participações como parte da guerra comercial, causando estragos no maior mercado de títulos do mundo, empurrando as taxas de juros para cima e aumentando o custo de empréstimos do governo dos EUA.

“Se a China começar a despejar os seus títulos do tesouro, isso causará uma enorme instabilidade financeira”, disse Mark Sobel, ex-funcionário do Departamento do Tesouro que passou quase quatro décadas na agência, acrescentando que considerava esse cenário improvável.

Em janeiro de 2018, expliquei neste blog porque razão a China não pode “transformar em armas” os seus títulos do governo dos EUA. Não é porque, como muitos observadores parecem pensar, a venda ao desbarato dos títulos causaria estragos no mercado e, ao fazê-lo, minaria o valor das próprias participações da China. Isso é muito improvável. Em primeiro lugar, a Reserva Federal poderia facilmente agir para superar qualquer volatilidade temporária. Em segundo lugar, como em outro artigo na mesma edição do Financial Times aponta, a crescente incerteza está a fazer com que os investidores aumentem as suas compras de títulos do governo dos EUA:

Os rendimentos dos títulos do Tesouro dos EUA mergulharam para o seu nível mais baixo desde 2017 e as ações caíram mais de 1 por cento na quinta-feira, à medida que o aprofundamento da disputa comercial entre os EUA e a China aumentou as preocupações sobre o crescimento económico global.

A corrida para a segurança relativa da dívida pública levou o rendimento das obrigações do Tesouro dos EUA a 10 anos para um nível aproximadamente igual ao de quando a Reserva Federal começou a aumentar as taxas de juro em 2015. As taxas de longo prazo caíram abaixo das de curto prazo, uma inversão da curva de juros que é vista por muitos operadores como uma indicação de uma desaceleração económica iminente.

 

Eu pensei que faria sentido revisitar e atualizar o meu post de janeiro de 2018. Como expliquei nesse texto, a verdadeira razão pela qual a China não pode vender os seus títulos do governo dos EUA é porque as compras chinesas não foram feitas para acomodar as necessidades dos EUA. Em vez disso, a China fez essas compras para acomodar uma deficiência de procura interna na China: As exportações de capital chinesas são simplesmente o outro lado do excedente da conta corrente do país, e sem o primeiro, eles não poderiam manter a moeda o suficiente para permitir o segundo.

Para ver porque razão qualquer ameaça chinesa de retaliar contra a intervenção comercial dos EUA iria realmente minar a própria posição da China nas negociações comerciais, considere todas as maneiras pelas quais Pequim pode reduzir as suas compras de títulos do governo dos EUA:

  1. Pequim poderá comprar menos títulos do governo dos E.U. e mais outros ativos americanos, de modo que os fluxos líquidos de capital da China para os E.U. permaneçam inalterados.
  2. Pequim poderia comprar menos ativos do governo americano e de outros ativos americanos, mas outras entidades chinesas poderiam, por sua vez, comprar mais ativos americanos, de modo que os fluxos líquidos de capital da China para os Estados Unidos permanecessem inalterados.
  3. Pequim e outras entidades chinesas poderiam comprar menos ativos dos EUA e substituí-los por uma quantidade equivalente maior de ativos de outros países desenvolvidos, de modo que os fluxos líquidos de capital da China para os Estados Unidos seriam reduzidos, e os fluxos líquidos de capital da China para outros países desenvolvidos aumentariam na mesma quantidade.
  4. Pequim e outras entidades chinesas poderiam comprar menos ativos dos EUA e substituí-los por uma quantidade equivalente maior de ativos de outros países em desenvolvimento, de modo que os fluxos líquidos de capital da China para os Estados Unidos seriam reduzidos e os fluxos líquidos de capital da China para outros países em desenvolvimento aumentariam na mesma quantidade.
  5. Pequim e outras entidades chinesas poderiam comprar menos ativos dos EUA e não os substituir por uma quantidade equivalente maior de ativos de outros países, de modo que os fluxos líquidos de capital da China para os Estados Unidos e para o mundo seriam reduzidos.

Estas cinco hipóteses cobrem todas as formas possíveis para que Pequim possa reduzir as compras oficiais de títulos do governo dos EUA: A China pode comprar outros ativos dos EUA, outros ativos de países desenvolvidos, outros ativos de países em desenvolvimento ou ativos domésticos. Nenhuma outra opção é possível.

As duas primeiras formas não mudariam nada, nem para a China nem para os Estados Unidos. As segundas duas maneiras não mudariam nada para a China, mas fariam com que o défice comercial dos E.U. diminuísse, seja de forma a reduzir o desemprego americano ou de forma a reduzir a dívida americana. Finalmente, a quinta maneira também faria com que o défice comercial dos E.U. diminuísse de maneira que provavelmente reduziria o desemprego nos E.U. ou reduziria a dívida dos E.U.; mas isto aconteceria à custa de fazer com que o excedente comercial chinês diminuísse de modo que aumentaria o desemprego chinês ou a dívida chinesa.

Por outras palavras, ao comprar menos títulos do governo dos E.U. Pequim deixaria os Estados Unidos inalterados ou em melhor situação, enquanto isso também deixaria a China inalterada ou em pior situação. Isto não me soa como uma política que seja provável que Pequim persiga ardentemente, e Washington certamente não se oporia a ela. Vamos considerar cada possibilidade por sua vez.

 

1) Pequim poderá comprar menos títulos do governo dos E.U. e mais outros ativos americanos, de modo que os fluxos líquidos de capital da China para os E.U. permaneçam inalterados.

Isto seria um não-acontecimento. Pequim, de facto, simplesmente redirecionaria as suas compras de títulos do governo dos E.U. para outros ativos dos E.U.. Naturalmente, o vendedor desses outros ativos seria então forçado a aplicar os lucros das vendas em outro lugar, de modo que, direta ou eventualmente, os lucros seriam usados para comprar os títulos do governo dos EUA que Pequim vendeu. A única coisa que poderia mudar, neste caso, é que Pequim teria trocado ativos sem risco dos EUA por ativos americanos com risco.

Nesse caso, não haveria impacto líquido sobre as taxas de juros dos EUA em geral e um impacto muito pequeno sobre as taxas de juros relativas. Como esse resultado representa não mais do que uma troca por Pequim de ativos de menor risco por ativos de maior risco, sem mudança líquida na procura de ativos dos EUA, o resultado pode ser, no máximo, um pequeno aumento nos rendimentos de ativos sem risco, acompanhado por um aperto equivalente dos spreads de crédito.

Não haveria nenhuma alteração no investimento geral dos E.U., exceto na medida em que o aperto dos spreads de crédito causaria um pequeno aumento nos investimentos americanos de risco. Além disso, a decisão de Pequim deixaria o excedente da conta de capital dos EUA inalterado, de modo que não poderia ter um impacto sobre a conta corrente ou os défices comerciais dos EUA. Finalmente, a decisão de Pequim deixaria o défice da conta de capital chinesa inalterado, de modo que não poderia ter um impacto sobre a conta corrente ou os excedentes comerciais chineses.

2) Pequim poderia comprar menos ativos do governo dos E.U. e outros ativos americanos, mas outras entidades chinesas poderiam, por sua vez, comprar mais ativos americanos, de modo que os fluxos líquidos de capital da China para os E.U. permanecessem inalterados.

Mais uma vez, isto seria, em grande parte, um não acontecimento. O volume de fluxos de capitais chineses para os Estados Unidos não seria afetado, mas haveria pequenas mudanças na composição dos ativos para os quais os fluxos são direcionados. Tal como no caso anterior, não haveria impacto líquido nas taxas de juro globais dos EUA e um impacto muito pequeno nas taxas de juro relativas. Mais uma vez, o resultado poderá ser, no máximo, um pequeno aumento das taxas de rendibilidade dos ativos sem risco, acompanhado por um aperto equivalente dos spreads de crédito.

Mais uma vez, como no caso anterior, não haveria alteração no investimento global dos EUA, exceto na medida em que o aperto dos spreads de crédito causa um pequeno aumento nos investimentos de risco dos EUA. A decisão de Pequim também deixaria o excedente da conta de capital dos EUA inalterado, de modo que não poderia ter qualquer impacto sobre a conta corrente ou os défices comerciais dos EUA. Finalmente, a decisão de Pequim deixaria o défice da conta de capital chinesa inalterado, de modo que não poderia ter qualquer impacto sobre a conta corrente chinesa ou os excedentes comerciais.

 

3) Pequim e outras entidades chinesas poderiam comprar menos ativos dos EUA e substituí-los por uma quantidade equivalente maior de ativos de outros países desenvolvidos, de modo que os fluxos líquidos de capital da China para os Estados Unidos seriam reduzidos, e os fluxos líquidos de capital da China para outros países desenvolvidos aumentariam na mesma quantidade.

Neste caso, o défice global da balança de capital e o excedente da balança corrente da China manter-se-iam inalterados, mas haveria uma redução do défice bilateral da balança de capital e do excedente da balança corrente com os Estados Unidos e um aumento dos défices da balança de capital e dos excedentes da balança corrente com o resto do mundo desenvolvido. A redução do défice em conta corrente dos EUA significaria uma redução do excesso de investimento dos EUA sobre a poupança dos EUA. Se o investimento dos EUA fosse restringido por uma incapacidade de acesso à poupança, esta redução ocorreria na forma de um menor investimento dos EUA. Porque este não é o caso. Dado que as empresas americanas têm acesso fácil a tanto capital quanto precisam para financiar investimentos, o ajuste ocorreria na forma de maiores poupanças dos EUA.

As poupanças podem ser aumentadas de muitas formas diferentes, quase sempre com menos dívida ou menos desemprego. Por exemplo, uma redução nos influxos de capital pode deflacionar as bolhas de ativos e, assim, desencorajar o consumo através de efeitos de riqueza, uma tal redução pode reduzir o consumo através do aumento das taxas de juro do crédito ao consumo, ou esta redução pode mesmo ter lugar através da promoção de normas mais rigorosas de crédito ao consumo. Uma redução dos influxos de capital pode também aumentar a poupança através da redução do desemprego. De uma forma ou de outra, em economias como a dos Estados Unidos, que não sofrem com o fraco acesso ao capital, uma redução nos influxos de capital estrangeiro aumentará automaticamente a poupança interna.

Pode ser mais difícil do que pensamos para a China redirecionar os fluxos de capital dos Estados Unidos para outras economias desenvolvidas. A Europa Continental, o Japão e o Reino Unido são as únicas economias desenvolvidas suficientemente grandes para absorver uma mudança significativa no volume de fluxos de capital, mas nenhuma delas está ansiosa por absorver as implicações da conta corrente. Alguns economistas, compreendendo mal a natureza da identidade da conta que vincula os fluxos líquidos de capital à lacuna entre investimento e poupança, argumentarão sem dúvida que esses fluxos fariam aumentar o investimento na Europa, Japão e Reino Unido, mas isso está errado. Só seria verdade se o investimento nestas economias tivesse sido anteriormente restringido pela escassez de poupanças, mas como tal não é claramente o caso no ambiente atual, o impacto de maiores influxos de capital nas economias desenvolvidas só poderia ser o de reduzir a poupança interna.

Por outras palavras, para as economias desenvolvidas, influxos de capital significativamente maiores do exterior fariam com que a poupança diminuísse à medida que os influxos fortalecessem as suas moedas e reduzissem as exportações – causando o aumento do desemprego ou do consumo – ou, se os seus bancos centrais agissem para esterilizar os influxos, para aumentar as importações aumentando a dívida do consumidor. Se a Europa continental, o Japão e o Reino Unido não estiverem dispostos a aceitar um maior desemprego ou uma maior dívida, não estarão dispostos a permitir o acesso ilimitado da China ao investimento interno e poderão rapidamente tomar medidas para retaliar ou redireccionar os fluxos para os Estados Unidos.

Neste último caso, é claro que, mais uma vez, estaríamos perante um não acontecimento. Na medida em que os países desenvolvidos não redirecionem os fluxos de capitais chineses para os Estados Unidos, no entanto, as vendas chinesas de títulos do governo dos EUA afetariam a economia dos EUA, mas em grande parte de forma positiva. Primeiro de tudo, e ao contrário da perceção popular, uma redução dos fluxos de capital chinês para os Estados Unidos não faria com que as taxas de juros dos EUA subissem, exceto na medida em que levaria à retomada do crescimento económico dos EUA. Como a redução do excedente da conta de capital dos EUA resultaria num aumento da poupança dos EUA, isso corresponderia totalmente à redução da poupança chinesa que havia sido importada anteriormente pelos Estados Unidos. Esta é apenas a consequência lógica das condicionantes da balança de pagamentos.

Não haveria nenhuma mudança direta no investimento geral dos E.U., e haveria um aumento na poupança dos E.U., impulsionado por um menor desemprego ou uma redução na dívida do consumidor. Poderá haver uma mudança indireta no investimento dos E.U.A. eventualmente com o défice comercial americano caindo. Lembre-se que, como a decisão de Pequim reduziria o excedente geral da conta de capital dos EUA, também reduziria automaticamente os défices da conta corrente e do comércio dos EUA, por razões que discuti em texto anterior no blog. Finalmente, como a decisão de Pequim deixaria o défice da conta de capital chinesa inalterado, ela não teria impacto sobre a conta corrente ou os excedentes comerciais chineses.

 

4) Pequim e outras entidades chinesas poderiam comprar menos ativos dos EUA e substituí-los por uma quantidade equivalente maior de ativos de outros países em desenvolvimento, de modo que os fluxos líquidos de capital da China para os Estados Unidos seriam reduzidos, e os fluxos líquidos de capital da China para outros países em desenvolvimento aumentariam na mesma quantidade.

Neste caso, tal como no anterior, o défice global da balança de capital e o excedente da balança corrente da China manter-se-iam inalterados, mas haveria uma redução do défice bilateral da balança de capital e do excedente da balança corrente com os Estados Unidos e um aumento dos défices da balança de capital e dos excedentes da balança corrente com o mundo em desenvolvimento. Como explicado acima, a redução do défice em conta corrente dos EUA ocorreria por meio de um aumento da poupança dos EUA.

Não há diferença entre este caso e o anterior no que respeita ao seu impacto nos Estados Unidos ou na China. As taxas de juros em ambos os países permaneceriam inalteradas, o défice comercial dos EUA diminuiria e o excedente comercial da China permaneceria inalterado.

Há, no entanto, uma diferença importante para a economia global. Uma vez que o investimento nos países em desenvolvimento é muitas vezes limitado pela dificuldade de acesso à poupança global, uma reorientação do capital chinês dos Estados Unidos para os países em desenvolvimento impulsionaria o investimento nesses países. Isso aumentaria o crescimento global e beneficiaria tanto as economias desenvolvidas como as economias em desenvolvimento, incluindo os Estados Unidos. Mas a razão pela qual é improvável que isto aconteça em grande medida é que a China tem tido uma experiência muito má com os seus investimentos em países em desenvolvimento e pode não estar ansiosa por aumentá-los significativamente mais do que já planeou.

5) Pequim e outras entidades chinesas poderiam comprar menos ativos dos EUA e não os substituir comprando uma quantidade equivalente maior de ativos de outros países, de modo que os fluxos líquidos de capital da China para os Estados Unidos e para o mundo reduzir-se-iam.

Finalmente, a China poderia reduzir o seu défice global da balança de capital reduzindo o montante de capital dirigido aos Estados Unidos e não o substituindo por capital dirigido a outros países. A China, em outras palavras, exportaria menos capital para o exterior. Isso significaria, por definição, que a China deveria reduzir a poupança interna ou aumentar o investimento interno. Isto significaria também, naturalmente, que Pequim teria de reduzir a balança de transações correntes e os excedentes comerciais.

Uma forma de as poupanças poderem diminuir rapidamente é se uma queda nas exportações provocar um aumento do desemprego. A única outra forma é se houver um aumento da dívida do consumidor. Para que o investimento aumente rapidamente, é quase certo que tem de haver ou um aumento dos estoques não vendidos à medida que as exportações caem ou um aumento dos investimentos não produtivos em infraestrutura. Em ambos os casos, isso significaria um aumento do peso da dívida.

Como nos dois casos anteriores, não haveria mudança direta no investimento geral dos E.U.A., e haveria um aumento na poupança dos E.U.A., este último impulsionado por um menor desemprego ou uma redução na dívida do consumidor. Pode haver uma mudança indireta no investimento dos E.U.A. eventualmente com a diminuição do défice comercial americano. Isto porque, como a decisão de Pequim reduz o excedente geral da conta de capital dos E.U., também reduziria automaticamente a conta corrente e os défices comerciais dos E.U.. Mais importante para a China, a decisão de Pequim reduziria o défice da conta de capital chinesa e, portanto, também resultaria necessariamente numa redução na conta corrente chinesa ou nos excedentes comerciais.

CONCLUSÃO

Mesmo que Pequim forçasse instituições como o Banco Popular da China a comprar menos títulos do governo dos EUA, tal medida não pode ser vista credivelmente como uma retaliação significativa contra o crescente protecionismo comercial nos Estados Unidos. Como já mostrei, a decisão de Pequim não teria qualquer impacto sobre a balança de pagamentos dos EUA, ou teria um impacto positivo. Teria quase nenhum impacto sobre as taxas de juros dos EUA, exceto na medida talvez de um ligeiro estreitamento dos spreads de crédito para equilibrar um ligeiro aumento das taxas sem risco.

Também não teria qualquer impacto na balança de pagamentos chinesa, caso não afetasse a balança de pagamentos dos EUA. Na medida em que isso resultaria em um défice comercial mais estreito nos EUA, há apenas três formas possíveis de afetar a balança chinesa.

Em primeiro lugar, a China poderia exportar mais capital para os países desenvolvidos, caso em que a decisão não teria impacto imediato na balança de pagamentos global da China, mas correria o risco de irritar os seus parceiros comerciais e de provocar retaliações. Em segundo lugar, a China poderia exportar mais capital para os países em desenvolvimento, caso em que a decisão não teria um impacto imediato na balança de pagamentos global da China, mas correria o risco muito elevado de aumentar as suas perdas de investimento no estrangeiro. Ou terceiro, a China poderia simplesmente reduzir as suas exportações de capital para o exterior, caso em que seria forçada a ter um excedente comercial menor, que só poderia ser combatido, no caso da China, com maior desemprego ou um aumento muito mais rápido da dívida.

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O autor: Michael Pettis

Formação: MBA em Finanças, pela Universidade de Columbia e Master em International Affairs, Desenvolvimento Económico, pela Universidade de Columbia.

Michael Pettis é membro senior do Programa Carnegie Ásia sedeado em Pequim. Especialista em economia da China, Pettis é professor de finanças na Escola de Gestão Guanghua da Universidade de Pequim desde 2004, onde se especializou em mercados financeiros da China, comércio internacional e fluxos de capitais e banca central.

Entre 2002 e 2004, lecionou na Escola de Economia e Gestão da Universidade de Tsinghua e, entre 1992 e 2001, na Faculdade de Gestão da Universidade de Columbia. Na China esteve também três anos como diretor de estratégia da subsidiária em Hong Kong da corretora chinesa Shenyin Wanguo.

É membro do Conselho Consultivo do Instituto de Estudos Latino Americanos da Universidade de Columbia, bem como do Conselho Consultivo do Reitor da School of Public and International Affairs.

Antes de se mudar para a China em 2002, Michael Pettis trabalhou 16 anos em Wall Street em investimento financeiro, mercados de capitais e financiamento de empresas.

De 1997 a 2001, Pettis trabalhou no Bear Stearns, onde era director executivo das equipas dos mercados de capitais latino americanos e de gestão de passivos. Trabalhou também como sócio de uma loja de banca de negócios que se especializou na securitização de ativos latino americanos e no Credit Suisse First Boston, onde chefiou a equipa de negociação em mercados emergentes.

Iniciou a sua carreira em 1986 quando se juntou à equipa de negociação de dívida soberana do Manufacturers Hanover (agora JPMorgan).

Além dos mercados de investimento e de capitais, Pettis esteve envolvido em serviços de consultadoria soberana, nomeadamente para o governo mexicano na privatização do seu sistema bancário, para a República da Macedónia na reestruturação da sua dívida bancária internacional, e para o ministro das finanças sul-coreano na reestruturação da dívida da banca comercial do país de 1998.

Publica o blog China Financial Markets que foi classificado pelo Wall Street Journal como um dos quinze melhores blogs em todo o mundo, e é um dos motivos citados pela Bloomberg-BusinessWeek para o incluir na sua lista de 2016 das 50 pessoas mais influentes no mundo da finança. Tem extensa obra publicada em Foreign Affairs, Foreign Policy, World Policy Journal, Far Eastern Economic Review, Columbia Journal of World Business, Harvard Business Review, Wilson Quarterly, Financial Times, The Wall Street Journal, Newsweek, Caijing, e várias outras revistas de referência. O seu mais recente livro Avoiding the Fall: China’s Economic Restructuring, (Carnegie Endowment for International Peace, 2013), foi selecionado pelo Financial Times como um dos dez melhores livros sobre negócios e economia de 2013.

Nesse mesmo ano publicou o livro The Great Rebalancing: Trade, Conflict, and the Perilous Road Ahead for the World Economy (Princeton University Press, 2013), que em 2018 foi selecionado pela Barron como um dos 7 melhores livros sobre a crise financeira.

É ainda autor dos seguintes livros: After the Fall: The Future of Global Cooperation, (Geneva: ICMBS, 2012, em co-autoria com Jeffrey Frieden, Dani Rodrik e Ernesto Zedillo); Is China Vulnerable? The Causes and Consequences of Financial Fragility (Tsinghua University Press, 2003); The Volatility Machine: Emerging Economies and the Threat of Financial Collapse (Oxford University Press, 2001), e Managing Sub-Investment Grade Sovereign Risk (Euromoney Press, 1997).

Em setembro de 2019, a Yale University Press publicará o seu livro, Trade Wars are Class Wars.

Fonte: Michael Pettis e http://carnegieendowment.org/experts/444

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