O calendário, rolando com trabalho os dias, chegou de novo a 25 de Julho. Mais um, de trabalho rotineiro, entre manhãs curtas faltas de ar, sem sombras na tarde abrasadora, após e antes de noites eternas de calor insone.
As cidades castelhanas valeiram-se. A Espanha vazia, ao sol inclemente e carregada de tormentas, recupera um pouco de pulso e vida a força de veraneantes, trânsito de retornados, maratonas de festivos populares e peripécias familiares.
Vão seis anos do acidente ferroviário de Angrois, acontecido no decurso de uma dessas migrações estivais, que por nada apanha ao que isto escreve, que safou, por falha de dias de férias, como hoje, num ano em que ia cada fim de semana e véspera de festivo, ida e volta, nesse mesmo comboio. Mas esse dia não. Por isso dói. Com pesadelo. Passam os anos e a memória dos mortos e as tragédias dos feridos acumulam-se em forma de dramas pessoais e reclamações acarão dos expedientes de desaparecidos nas valas comuns que balizam o território, entre tantas capas arqueológicas de barbárie, inaptidão, silêncios administrativos e vuelva usted mañana, no mapa do oriente peninsular.
A crise económica passou de moda nos mass media, isso que tornou endêmica nas classes populares e está a ser um negócio, como habitual, para os mais favorecidos. A crise televisiva hoje é a da habitação popular urbana, que não se relaciona, diretamente, com a desaparição dos pequenos núcleos de população, desconectados e sem serviços.
Os comboios cada vez são menos populares, menos efetivos, menos frequentes e mais caros. Apenas Madrid existe em quanto a transporte público. Tudo são carros particulares e mais ruído, num trânsito continuado e horas pontas que destacam o prolongado da jornada laboral, e definem a vida nas absurdas urbanizações das periferias urbanas, suburbanas e nos agigantados topônimos que perto dos núcleos urbanos, clonam a escala o disparatado modelo metropolitano.
A Espanha “provincial” murcha, a rural extingue-se, as capitais crescem sem planificação e Madrid medra numa dissimetria parasitária exponencial, por riba das suas possibilidades e das de todo o Estado. A direita oligárquica e caciquil de sempre e a liberal e progressista continuam apostando no pelotaço urbano concentrado e centralista; a esquerda, deslumbrada pelas lumières parisiens da movida madrilena, e os mitos das grandes urbes do XIX, não compreende que a única fronte lógica e possível seria fundar Menos Madrid e apostar por modelos abertamente descentralizados e distribuídos.
Debate-se no parlamento arredor do mesmo e de nada, Espanha uma, Catalunha jamáis, numa vacuidade sonora e tremendista, retransmitida, minuto a minuto, com moviola (permitam o arcaísmo) de momentos, gestos e hiper-representações, necessários na lógica comunicativa das redes sociais e do reality show. Seguramente por conselho de algum spin doutor, ou estilista desses que têm, todos os presidenciáveis espanhóis, também clones assertivos de guapo de Madrid, vão fardados em azul, gravata discreta à moda e camisa branca, como se fossem vendedores do Corte Inglês.
Galiza caminha, neste conjunto, de periferia decadente cara a inexistência programada, postergada, ausente, sem representantes, sem voz, sem projeto, nem energia económica. E, por primeira vez na história, sem população, nem outro futuro às vistas, que esta assimilação à Castela vazia e veraneante.