Al Gore: o criminoso de oito guerras, vendedor do ecologismo. Por Nazanín Armanian

Espuma dos dias Ecologia e negocios de guerra

Seleção e tradução de Francisco Tavares

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Estamos uma vez mais perante um excelente e certeiro artigo de Nazanín Armanian que desmascara a mistificação da realidade levada a cabo pelos poderes do capitalismo dominante. Não sendo personagem único no seu género, não posso deixar de sublinhar que Al Gore fez parte da cúpula de poder da maior potência mundial, os EUA, durante a presidência Clinton (1993-2001). Assim, para além dos factos que são anteriores e posteriores a esse período, cabe recordar que nos eventos abrangidos pela administração Clinton ele atuou sempre em estreita ligação com Bill Clinton (então presidente) e Madeleine Albright (como Secretária de Estado).

Obrigado a Nazanín Armanian e ao Público.es

FT

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Al Gore: o criminoso de oito guerras, vendedor do ecologismo

Nazanín_Armanián Por Nazanín Armanian

Editado por publico es es , em 13 de dezembro de 2019 (ver aqui)

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O exvicepresidente estadounidense e Premio Nobel da Paz, Al Gore, na COP25, em Madrid. REUTERS/Sergio Perez

 

Dizem que quem mata uma pessoa é um assassino, quem mata milhares na guerra é um herói, e se ainda por cima se apresenta como Verde, então é o Super-Homem. Na Cimeira do imperialismo verde de Madrid 2019 não podia faltar Albert “Al” Gore, o promotor do negócio Big Green, vice-presidente do governo de Bill Clinton (1993-2001) e Prémio Nobel da Paz por sua defesa do meio ambiente, o mesmo galardão que Henry Kissinger recebeu pelo seu pacifismo e os seus esforços pelos direitos humanos dos oprimidos.

Porque “apagar a memória histórica” dos cidadãos é essencial para que o sistema atual continue a funcionar tranquilamente, também é essencial tirar o pó aos dois aspetos da história perversa do Herói Verde para aqueles que pretendem mudá-la: 1) Como o homem da destruição bélica em massa do Afeganistão, Iraque, Jugoslávia, Albânia, Sudão, Libéria, Haiti e Congo, e 2) O falso ambientalista, fabricado pelo imperialismo verde, que com a sua fama protege a destruição do meio ambiente em favor dos seus próprios negócios e dos da sua espécie. É um dos falcões mais agressivos do Partido Democrata, um personagem especialmente oportunista, que durante a sua carreira tentou com os seus discursos contraditórios ganhar o voto dos ultraconservadores e também dos progressistas, e depois usá-lo para os interesses mais sinistros dos EUA no mundo.

O currículo de guerra de Al Gore

Um férreo defensor das guerras de pilhagem e da expansão colonialista dos EUA, Al Gore atacou aqueles que recorriam à “Síndrome do Vietname” e à morte de milhares de soldados para evitar novas guerras: “Temos interesses no mundo que são suficientemente importantes para defendê-los. E não devemos estar tão queimados pela tragédia do Vietname que não reconheçamos a necessidade do uso da força para os nossos interesses”. O leitor já fez algum estudo para determinar os danos procados pelas guerras (o uso do Agente Laranja, por exemplo!) ao meio ambiente?

  • Em 1978, o nosso ganhador do Prémio Nobel opôs-se aos novos regulamentos federais sobre armas de fogo para agradar aos seus eleitores das áreas rurais.
  • Em 1979 ele defendeu o patrocínio de Reagan ao grupo terrorista Contra na Nicarágua, e financiado com cocaína (a CIA paga aos “jihadistas” do Afeganistão com dinheiro do ópio, cujo cartel obriga os agricultores a cultivar papoulas em vez de batatas e trigo).
  • Em 1983, ele apoiou o envio de tropas ao Líbano, onde um ataque matou 241 soldados americanos, 58 paraquedistas franceses e 6 civis libaneses. O que perderam os EUA no Líbano?
  • Em 1983, aplaudiu a invasão norte-americana da pequena ilha de Granada, de 90.000 habitantes, por representar uma “ameaça aos EUA” de 300 milhões de almas e dotada de 5.113 ogivas nucleares. A verdadeira razão? Ser governada pelos socialistas e um aliado de Cuba e da URSS.
  • Em 1986 celebrou o bombardeamento da Líbia por Reagan.
  • Em 1991 o falcão Gore votou a favor da decisão de Bush de atacar o Iraque, uma guerra que causou um grande desastre ecológico no Golfo Pérsico. Depois criticou Bush por ser “demasiado brando” com Saddam Hussein!
  • Em 1991, o mesmo Gore, que estava muito preocupado porque as crianças americanas “pudessem ter tumores e cancro causados por químicos usados nos pijamas de dormir”, aprovou o embargo mais criminoso da história da humanidade contra o povo iraquiano, que matou 1,5 milhões de pessoas, quase metade delas crianças. Em 29 de junho de 2000, quando Gore dava uma palestra em Chicago sobre “incentivos de política energética para as cidades”, o diretor de Vozes do Deserto, Danny Muller, perguntou-lhe: “Porque razão alguém deveria votar numa administração que mata 5.000 crianças inocentes por mês com as sanções ao Iraque?” Gore não respondeu, e os seus capangas levaram-no para fora da sala. O embargo proibia a venda de produtos como o cloro para tornar a água potável, equipamento sanitário como seringas e uma grande variedade de medicamentos, equipamento de oxigénio para hospitais, papel e lápis ou leite em pó, no contexto de uma guerra genocida total. Milhares de crianças nasceram com deformações terríveis, vítimas de toneladas de bombas, incluindo urânio empobrecido. A pintor e diretora do Museu Nacional de Arte do Iraque, Leila al-Attar, e o seu marido foram mortos num desses bombardeamentos.
  • Em 1993, após a queda do regime de Siad Barre na Somália, que passou de maoísta a aliado de Washington no estratégico Corno de África, Gore-Clinton organizaram uma das suas “invasões humanitárias”. Enquanto a morte de milhares de somalis foi considerada “dano colateral” dos seus infames interesses, a “Batalha de Mogadíscio”, na qual a guerrilha somali enfrentou as tropas americanas ao matar pelo menos 70 fuzileiros, tornou-se a segunda derrota dos EUA numa guerra depois do Vietname.
  • Em 1994, ele autorizou a CIA a sequestrar cidadãos de outras nações que ele considerava uma ameaça aos interesses dos EUA, revela Richard Clarke, assessor de segurança do Estado, crítico da política antiterrorista dos EUA.
  • Em 1994, a ONU e o governo de Clinton-Al Gore-Albright sabiam que o responsável pelo massacre dos muçulmanos num mercado em Sarajevo era um grupo muçulmano de extrema-direita, mas ainda assim culparam o governo da Federação Jugoslava, a que os meios de comunicação ocidentais chamavam “governo sérvio” para enfrentar os grupos étnicos que compunham o país, desmantelando assim o último Estado europeu a declarar-se socialista mesmo depois do fim da URSS. O apoio encoberto do regime Clinton à Al Qaeda na Bósnia e no Kosovo (como a equipa de Carter-Brzezinski fez em 1978 no Afeganistão para destruir o governo socialista do país) transformou a Bósnia numa base para o “jihadismo” a que chegaram milhares de indivíduos recrutados pela “Rede Islâmica Militante” coordenada pelo Pentágono. O massacre de centenas de milhares de civis jugoslavos foi batizado como “Intervenção Humanitária” da NATO e esse país foi quebrado para que, entre outros propósitos, os EUA instalassem no coração da Europa, no Kosovo, a sua segunda maior base militar do mundo chamada Camp Bondsteel (a primeira também está na Europa: Stuttgart!). A base inclui uma mini Baía de Guantánamo, conforme revelado em 2005 pelo Comissário dos Direitos Humanos do Conselho da Europa, Álvaro Gil Robles. Kosovo “por acaso” é outra escola do Estado islâmico: Blerim Heta, o kosovar que em 24 de março de 2014 matou 52 pessoas num ataque no Iraque trabalhou nesta base. Porque razão os EUA pretendem causar caos no Iraque?
  • Em 1998, ele bombardeou o laboratório farmacêutico Al-Shifa no Sudão para desviar a opinião pública do escândalo Lewinsky. O Afeganistão também recebeu toneladas de bombas nessa data e durante todo o mandato do trio criminoso Clinton-Al Gore-Albright. Dezenas de milhares de afegãos morreram sob as bombas ou devido à contaminação da sua água, solo e ar. Afeganistão, porquê?
  • Em 2000, ele propôs ataques militares rápidos e eficazes contra os “Estados rebeldes”, por representarem “uma ameaça emergente para o nosso país”, rindo dos tratados internacionais sobre o assunto e da própria ONU.
  • Em 2002, Al Gore também apoiou a guerra “preventiva” de Bush contra o Iraque e, diante das “dúvidas” sobre a existência de armas de destruição em massa de Saddam, oferece-lhe outro pretexto: “O Iraque representa uma séria ameaça à estabilidade do Golfo Pérsico e devemos organizar uma coligação internacional para eliminar o seu acesso às armas de destruição em massa”, insistindo na “natureza excepcional dos Estados Unidos e que nenhum direito internacional pode impedir este país de tomar medidas para proteger os seus interesses vitais”.

Conclusão: Al Gore nunca participaria numa cimeira antimilitar.

O currículo ecológico de Al Gore

  • Em 1979, o deputado Al Gore defendeu a construção de uma barragem no rio Pequeno Tennessee sem que ela fosse utilizada para o controle de inundações ou geração de energia; ele simplesmente queria encher os bolsos das construtoras, lembra o diário Counterpunch. Quando ambientalistas (os verdadeiros!) protestaram que a represa ia matar várias espécies protegidas, Al Gore e os seus companheiros chantagearam inclusive o presidente Carter por que, se vetasse a lei, negariam o apoio democrata ao Tratado do Canal do Panamá. Isso lançou as bases para que os empresários contornassem a Lei de Espécies Ameaçadas de Extinção em outras regiões do país, diz o ambientalista David Brower.
  • Ele costuma afirmar que “Somos todos responsáveis” pela catástrofe ecológica, escondendo o facto de que 80% das agressões contra o meio ambiente são cometidas por grandes corporações ou que o consumo de energia de um cidadão médio do Primeiro Mundo é 70 vezes maior que um cidadão médio nos países em desenvolvimento: ele apaga intencionalmente as linhas que separam os ricos dos pobres, os comerciantes dos consumidores.
  • Foi a Climate Protection Alliance Foundation de Al Gore que propôs o uso do biocombustível, como uma energia renovável, fabricando “Eco-carros”. O novo negócio para o setor energético foi uma tragédia para milhões de pobres, cujos alimentos básicos são à base de batatas, arroz e trigo, e agora foram expulsos das suas terras pelos grandes produtores do “Bio”. Mesmo o que viviam do milho e da soja, já convertidos em agrocombustíveis, foram afetados pela invenção: os protestos sociais de 2007 no México contra o aumento do preço do milho, usado para produzir etanol nos Estados Unidos desmascarava as soluções de classe para supostamente salvar o planeta, um negócio que tem causado a desertificação de grandes áreas, o corte de milhões de árvores e a destruição de pastagens. Além disso, a erosão dos solos devido à sobreexploração, entre outras razões, desmente que este tipo de energia seja tão renovável num curto espaço de tempo: acelerará o aquecimento global.
  • Depois do fracasso dos agrocombustíveis, agora eles querem vender-nos produtos “inteligentes” para um “Planeta Mais Inteligente”, e a sua lavagem verde tomando a Terra e os seus habitantes por tolos.
  • Um ativismo a favor do próprio negócio: “Você acha que há algo errado em ser ativo nos negócios neste país”, respondeu Gore àqueles que o criticam por usar a sua posição e influência para engordar a sua conta bancária. O nosso ecologista é parceiro de várias empresas de “produtos inteligentes de economia de energia”, como a Silver Spring, que fabrica software para tornar a rede elétrica mais eficiente e recebe parte dos US$ 3,4 milhares de milhões em subsídios do Departamento de Energia dos EUA. Quando ele deixou o governo em 2001, Al Gore tinha um património de 1,7 milhões de dólares. Graças ao seu negócio “verde”, consultoria, conferências verdes ($100.000 por palestra), os direitos dos seus filmes e livros verdes, investindo em empresas como Apple, Google, painéis solares e até mesmo urinóis sem água, o seu património disparou: em 2003 ele tinha $200 milhões, segundo a agência Bloomberg. A este ritmo, quanto teria hoje?

A atual presidente do Congresso dos Estados Unidos, Nancy Pelosi, também presente na Cimeira de Madrid, é outra das grandes empresárias dos produtos Bio.

  • Oferecer soluções ridículas e inúteis para defraudar o público: usar menos água quente, diz Al Gore, o que significaria 700 mil galões de gasolina por dia nos Estados Unidos, que representam apenas 0,15% do consumo diário de combustível do país. Segundo a FAO, a cada minuto, o capitalismo selvagem destrói uma área de floresta equivalente a 40 campos de futebol, cerca de 13 milhões de hectares por ano. Ele também propôs multar as empresas de carbono e com isso plantar árvores (de “ter filhos e escrever livros” se encarregará Al Gore). Ele sabe que não crescem urtigas em terras contaminadas. Na Nigéria, a companhia petrolífera anglo-holandesa Shell foi acusada de “cumplicidade no assassinato, estupro e tortura” de nigerianos nos anos 90: a companhia petrolífera tinha criado uma unidade de espionagem secreta, que passou informações sobre os incómodos ambientalistas para a agência de segurança nigeriana, ao mesmo tempo que pedia ao presidente general Sani Abacha que “resolvesse o problema”. E ele fê-lo: enforcou 9 líderes ecologistas, matou mais de 1.000 manifestantes e destruiu cerca de 30.000 casas na implementação da política “Terra Queimada”. Assim, a Shell poderia levar um milhão de barris de petróleo por dia e contaminar o meio ambiente com paz de espírito. E depois perguntam: “Porque é que os nigerianos se atiram ao mar em barcos deixando as suas casas?”

Esperem e verão que pessoas como Al Gore aparecerão numa cimeira para apresentarem bombas inteligentes e verdes que não poluem: só matam pessoas, e só os pobres, que são os únicos que não podem fugir de uma zona de guerra.

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A autora: Nazanín Armanian: (1961-), é uma escritora e politóloga iraniana exilada em Espanha desde 1983. Licenciou-se em Ciências Políticas pela Universidade Nacional de Educação à Distância (UNED), onde lecionou de 2009 a 2013. De 2007 a 2012 foi também professora de questões islâmicas de cursos complementares da Universidade de Barcelona. Em 2015 ministra a cadeira de Relações Internacionais na UNED. É tradutora oficial de persa/farsi para espanhol. A sua área de investigação é o mundo islâmico, o islão político, a geopolítica do Médio Oriente e Norte de África e os direitos das mulheres. Colabora em diversos meios de comunicação espanhóis e mantém uma coluna semanal no blog Punto y Seguido do diário Público.

 

1 Comment

  1. *As máscaras também caem .* *Inacreditável a imensidão de autênticos crimes de guerra .* *Lamentável o mediatismo de Al Gore em Portugal .*

    *Maria *

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