Uma nova série sobre as novas tempestades que se vislumbram já no horizonte
Seleção e tradução de Júlio Marques Mota
Parte I – 1. Will Rogers a falar sobre a economia “trickle up”
Publicado em 30 de janeiro de 2015 por Kathy E. Gill


Há uma ideia viral a difundir-se rapidamente pelo Facebook esta semana. Trata- se da seguinte citação de Will Rogers do sentido a economia “trickle up”:
O dinheiro foi todo apropriado pelos mais ricos, na esperança de que transbordaria e escorreria para os necessitados. O Presidente Hoover não sabia que o dinheiro pode escorrer para cima. Dêem dinheiro às pessoas de mais baixos rendimentos e as pessoas no topo da escala de rendimentos tê-lo-ão de volta antes da noite chegar, de toda a maneira. Mas pelo menos passará pelas mãos dos mais pobres (fonte mais antiga que eu encontrei, 22 de março de 2012).
Esta ideia não é nova (terá pelo menos quase três anos), mas a citação é sobretudo precisa. No entanto, também está aqui a faltar um contexto importante, contexto este que faz desta observação uma pequena bofetada atirada no centro da Grande Depressão (para falar um pouco como Will Rogers).
Aqui está a citação na íntegra:
Esta eleição foi perdida há já quatro a seis anos atrás, não neste ano. Eles [os republicanos] não começaram a pensar no velho colega comum senão quando começou a campanha eleitoral. O dinheiro foi todo apropriado pelos mais ricos, na esperança de que transbordaria e escorreria para os necessitados. O Presidente Herbert Hoover [Republicano] era um engenheiro. Ele sabia que a água escorre, de cima para baixo. Coloquem-na numa colina e deixem-na ir e ela chegará até ao local mais seco, por mais pequeno que este seja. Mas ele não sabia que o dinheiro poderia escorrer de baixo para cima. Dêem dinheiro às pessoas de mais baixos rendimentos e as pessoas no topo da escala de rendimentos tê-lo-ão de volta antes da noite chegar, de toda a maneira. Mas pelo menos passará pelas mãos dos mais pobres . Eles salvaram os grandes bancos, mas os pequeninos foram mandados pela chaminé acima.
O trabalho de Will Rogers era uma coluna semanal regular.
Número 518, publicado no St. Petersburg Times em 27 de novembro de 1932:
O que é que está a acontecer no país?
- Em 3 de novembro, Franklin D. Roosevelt acabou de ser eleito presidente, por um deslizamento de terras quer no campo popular quer no voto do colégio eleitoral. Ele derrotou o presidente republicano Herbert Hoover.
- A questão eleitoral chave foi a Grande Depressão; O mercado de ações tinha colapsado em 1929.
- Em 1932, 34 milhões de americanos viviam em família que não tinha nenhum assalariado a tempo integral. A população do país era de cerca de 125 milhões.
Contudo, Will Rogers visou muito mais longe do que o presidente Hoover, como se pode ler mais abaixo.
Transcrevi o texto do arquivo de jornal do Google. Adicionei a pontuação moderna em algumas frases, mas isso é escrito principalmente como foi publicado (veja-se imagem do texto original no final). Adicionei algumas ligações e um ou outro comentário (relacionado com a Grande Recessão), e coloquei em destaque algumas frases por mim selecionadas.
E eis como tudo aconteceu
em 26 de novembro de 1932, St. Petersburg Times
Por Will Rogers
Bem, tudo o que sei é exatamente o que leio nos jornais ou o que vejo enquanto ando de um lado para outro. Com a eleição presidencial terminada parece que toda a gente se instalou num argumento fixo.
Os velhos republicanos inflexíveis ainda pensam que estamos todos à beira do fim do mundo, e cada um de nós pode amavelmente perceber o ponto de vista deles, porque eles têm governado durante todos estes anos.
Há já alguns dias recebi uma carta de um empresário muito importante em Los Angeles, o Sr. Frank Garbutt, o homem que fez do funcionamento dos clubes uma ciência e não apenas um negócio. Ele possui todo o tipo de clubes, desde o clube de atletismo da grande Los Angeles até aos clubes de praia, clubes de golf e clubes de polo. Ora, Frank é o líder mais longevo que alguma vez se viu. E, no entanto, disse que não haveria nenhum banco aberto passados cinco meses após a tomada de posse de Roosevelt. Não sei o que esses tipos acham que os democratas vão fazer com o país.
Poder-se-ia pensar que muita gente teria reservado a sua viagem para ir viver numa qualquer terra estrangeira até à próxima eleição, quando eles poderiam reenviar esses democratas de volta para o desemprego. Porque eles estiveram aqui oito anos e não foi há muito tempo atrás, foi de 1912 a 1920. Claro, eu não passava de ser um menino e não me lembro de coisas tão longínquas, mas ainda me recordo de ter ouvido o meu velhote dizer que houve alguns muito bons momentos, incluindo uma guerra lançada em nome de uma boa causa.
Pessoalmente eu nunca consegui ver muita diferença entre os dois “gangs”. Eles costumavam ser reconhecidos e diferenciados pela questão do protecionismo, da aplicação de uma pauta aduaneira. A pauta aduaneira era originalmente suposto ser criada para ajudar as pessoas que fabricavam coisas. Bem, os democratas daqueles dias não fabricavam nada além de argumentos, de modo que eles estavam contra as tarifas, mas o Sul acordou um dia e viu alguns teares de fiação rotativos anunciados nos cartazes de Montgomery Ward e, assim, logo que estes teares chegaram, compraram alguns e começaram a fiar o seu próprio algodão.
Bem, eles tinham energia hidráulica barata, carvão barato, mão-de-obra barata, e os Yankees começaram a mudar os seus negócios do norte para o sul. Ora, os democratas acordaram um dia com um problema tarifário nas mãos. O Sul tinha-se industrializado em grande escala. Bem, eles começaram a falar de tarifas em tons mais fortes que o Norte, de modo que o Sul, que agora tinha chaminés industriais onde antes só tinha estábulos, para que é que haviam de estar a tarificar-se a si próprios até ao sufoco? Assim, a principal linha de demarcação entre um partido e o outro, entre Democratas e Republicanos, foi completamente reduzida a nada. Agora não se consegue distinguir um do outro. É claro que durante os últimos anos sob a Presidência de Coolidge e Herbert Hoover, difundiu-se a velha ideia original sobre o Partido Republicano, que era o Partido dos ricos. E acho que foi isso que mais contribuiu para a sua derrota.
Penso que o comportamento geral das pessoas foi bem melhor que isto. Nos velhos tempos, eles podiam desembaraçar-se da situação mas nestes últimos anos, os ricos viram o seu número diminuir de tal forma que o seu poder de voto não era já suficiente para manter o poder com uma votação minoritária. Esta última eleição foi uma revolta de sentimentos sobre os tempos bem difíceis que as pessoas passaram e que vêm de muito longe. O candidato Herbert Hoover teve como prémio o benefício da arrogância do partido quando este era poderoso.
Porquê, depois das eleições de 28, porque é que não havia como segurá-los. Eles realmente pensaram que tinham encurralado os “tempos difíceis” de uma vez por todas. Fusão em cima de fusão. Obter e juntar duas coisas não pagas e, em seguida, emitir mais ações para o público. Consolidação e holdings! Essas são as “invenções” que todos os eleitores compraram naqueles loucos tempos e com as quais eles se queriam fazer eleger nesta última eleição.
Isto soa-me tanto aos mercados de produtos derivados que levaram ao colapso de 2007-2008 que até me dá arrepios. ~@kegill
Dizer que toda a grande massa de votos foi apenas contra os tempos difíceis não é bem assim. Os eleitores votaram contra o facto de não terem sido avisados de que todos esses empréstimos concedidos ao estrangeiro não eram muito sólidos. Os eleitores votaram porque nunca tinham sido informados ou advertidos do contrário, de que toda e qualquer grande consolidação pode não ser exatamente o melhor investimento. Toda a gente conhece o olhar gentil das pessoas do nosso governo a aconselhar-nos, a aconselhar-nos muito gentilmente. Muitos velhos pássaros ficaram na verdade doridos com Coolidge, mas só tinham como saída o candidato Hoover. As grandes empresas seguramente aumentaram o seu poder, mas alcançaram-no não com a venda dos seus produtos mas sim com a venda das suas ações. Nenhum esquema foi bloqueado pelo governo desde que alguém comprasse as ações. Poderia ter sido um plano [um grande investimento] para aprofundar o Oceano Atlântico e isso teria tido o aval do departamento apropriado em Washington, e as ações teriam sido vendidas no mercado.
Isto soa tão parecido com a vigarice que foi feita com os créditos hipotecários, que até me dá arrepios. ~@kegill
Esta eleição foi perdida há já quatro a seis anos atrás, não neste ano. Eles [os republicanos] não começaram a pensar no velho colega comum senão quando começou a campanha eleitoral. O dinheiro foi todo apropriado pelos mais ricos, na esperança de que transbordaria e escorreria para os necessitados. O Presidente Herbert Hoover [Republicano] era um engenheiro. Ele sabia que a água escorre, de cima para baixo. Coloquem-na numa colina e deixem-na ir e ela chegará até ao local mais seco, por mais pequeno que este seja. Mas ele não sabia que o dinheiro poderia escorrer de baixo para cima. Dêem dinheiro às pessoas de mais baixos rendimentos e as pessoas no topo da escala de rendimentos tê-lo-ão de volta antes da noite chegar, de toda a maneira. Mas, pelo menos, passará pelas mãos das pessoas pobres. Eles salvaram os grandes bancos, mas os pequeninos foram mandados para a chaminé acima.
Um outro eco da “Grande Recessão” — salvaram-se os gigantes financeiros, os que nos meteram num caos. ~@kegill
Não senhor, o zé povinho sentiu que nunca tinha tido uma oportunidade, e não a teve até 3 de novembro, e iria ele agarrar essa possibilidade? Toda a ideia de apoio do governo durante estes últimos anos tem sido a de emprestar a alguém mais dinheiro, para que ele possa endividar-se mais. Não é grande alívio estar apenas a transferir as suas dívidas de uma parte para outra, acrescentando um pouco mais na barganha. Não, eu acredito que os “rapazes” acabaram por merecer levar na cara com tudo o que tinham e não tinham feito.
Captura de écran do arquivo do Google Newspaper.
Texto disponível em http://wiredpen.com/2015/01/30/will-rogers-trickle-economics/