Da necessidade de uma política de saúde pública forte e transparente à desonestidade na Grande Indústria Farmacêutica -alguns elementos de análise. Por Júlio Marques Mota

 

15 m de leitura

Por Júlio Marques Mota

Coimbra, em 14 de Janeiro de 2022

 

Na sequência dos artigos publicados em torno das vacinas (“As vacinas ARNm contra o Covid e a sua aplicação nas crianças”, ver aqui, aqui, aqui, aqui e aqui) voltamos ao tema tomando como vetores de analise os ziguezagues da política de saúde pública face à pandemia e a questão sempre presenta da falta de honestidade de muitos dos operadores da Grande Indústria Farmacêutica (BIG-PHARMA), um cesto onde não abundam as maçãs boas, para utilizar a expressão irónica de um jornal americano.

 

1. A vacinação das crianças

O ciclo vacinal da minha família concluiu-se com a vacinação da minha neta mais pequena-9 anos. Este último ato vacinal custou-me a engolir enquanto os outros desejei-os e o mais rapidamente possível, mas a decisão não era minha mas sim dos pais. Fica aqui uma certeza: não sou negacionista para que se entenda o que abaixo se escreve.

No fundo, na base da minha relutância está a complicada e velha questão de vacinar as crianças quando os ganhos com estas vacinas em crianças são mínimos, com exclusão dos que sofrem de morbilidade, onde um risco mínimo se pode traduzir em fatalidade e com facilidade.

Eram-me dados alguns argumentos, a saber:

  1. Sendo os efeitos Covid sobre as crianças de risco mínimo, com exceção das crianças com problemas graves de saúde, era-me dito o seguinte: como ninguém sabe a totalidade das crianças com morbilidades, então para os proteger devem-se vacinar todas as crianças e assim estamos certos de que se vacinam todas as crianças com morbilidades. Não gastemos latim contra este argumento supostamente muito democrático que me foi apresentado por um ilustre catedrático desta praça, a Universidade de Coimbra.
  2. Devem ser vacinadas todas as crianças porque assim se reduz a cadeia de transmissão. Bom trata-se então de proteger os adultos do contágio das crianças, mas se é para proteger os adultos, estes que se vacinem. Dito de outra maneira, pretende-se que as crianças sejam solidárias com os mais velhos, quando deve ser o contrário.
  3. As vacinas são seguras, é o que nos garantem, portanto não há que levantar qualquer dívida quanto à vacinação. Não duvido que sejam seguras do ponto de vista de ataque ao Covid mas também é certo que não se pode garantir serem seguras do ponto de efeitos colaterais para crianças com todos os seus órgãos ainda em formação. Só o tempo é que o pode garantir, esse tempo não se produz em laboratório, nem se compra no mercado, espera-se que ocorra.
  4. Dizem-me e o argumento é sólido; são mais perigosas as miocardites em crianças não vacinadas do que em crianças vacinadas. Parece-me que o argumento só é valido se compararmos crianças saudáveis com vacina e sem vacina e ninguém me diz que a comparação tem sido feita assim.
  5. A reforçar a minha posição sobre a vacina em crianças, veja-se o que nos diz o CDC pela mão de um seu diretor, Rochelle P. Walensky, em 30 de julho de 2021:

Hoje, alguns (…)  dados foram publicados no Relatório Semanal de Morbilidade e Mortalidade (MMWR) do CDC, demonstrando que a infeção por Delta resultou em cargas virais igualmente elevadas do SRA-CoV-2 em pessoas vacinadas e em não vacinadas. Cargas virais elevadas sugerem um risco acrescido de transmissão e suscitam a preocupação de que, ao contrário de outras variantes, as pessoas vacinadas infetadas com Delta possam transmitir o vírus. Esta descoberta é preocupante e foi uma descoberta fundamental que levou à recomendação de máscara atualizada do CDC. A recomendação de máscara foi atualizada para garantir que o público vacinado não transmitiria o vírus a terceiros sem o saber, incluindo os seus entes queridos não vacinados ou imunodeprimidos”. Fim de citação

 

De tudo isto parece-me lógico concluir que, vacinadas ou não, as crianças podem sempre contagiar e com risco mínimo para elas. Protejamos então os outros, os adultos, vacinando-os a eles e não às crianças, deixemos de estar a sacrificar as crianças no altar da nossa comodidade. Aprofunde-se então cientificamente este problema em vez de se estar a impor decisões que eventualmente poderão ser apressadas.

 

2. Os Ziguezagues da Política de Saúde Pública

Ainda a questão das vacinas. Volto a assinalar aqui que já tomei as duas doses de vacina AstraZeneca e a dose de reforço da Pfizer. Claramente não sou um negacionista. Acredito na comunidade científica, no seu conjunto, no que não o acredito, e isso REAFIRMO, é na honestidade de muitas das entidades que comercializam os produtos concebidos por essa mesma comunidade científica.

Se estamos perante situações de conflito de interesses ou não, entre agentes do Estado e a BIG PHARMA, não sei, mas sei historicamente qual é o sentido da força do dinheiro, o de vergar aqueles que se opõem à sua marcha e no seu processo de acumulação de lucros. Um olhar para os dinheiros gastos pela BIG PHARMA em publicidade/marketing versus investigação é bem elucidativo da força que o seu dinheiro pode fazer mexer:

Elucidativo do que pode movimentar a BIG PHARMA e pode-se imaginar em quê.

Diz-nos um programa inglês, ao qual a Pfizer reagiu moderadamente, que as vacinas Moderna ou Pfizer custam cerca de 20 vezes mais que a vacina AstraZeneca. No entanto, as vacinas AstraZeneca desapareceram do mercado sem que nada nos seja dito sobre isso e os governos estarão agora a pagar, segundo o mesmo programa, cerca de 22 dólares por uma vacina que poderá custar pouco mais que um dólar. Isto diz-nos uma coisa: muitos milhões de dólares poderão estar disponíveis para convencer os mais renitentes à sua utilização. Situo-me no plano formal, sublinho, mas os exemplos de desonestidade pela BIG PHARMA são muitos.

Um deles, ligado à pandemia tem a ver com a compra pelos Estados do medicamento Remdesivir. Em Maio de 2020, sobre este medicamento escrevia Victor Hill:

Remdesivir, desenvolvido pela Gilead Sciences (NASDAQ:GILD) para combater o Ébola, atua no organismo impedindo que os genes de um vírus se reproduzam se forem constituídos por ARN (uma variante de ADN). Em 2015, o Remdesivir funcionou contra o Ébola em macacos – mas não ajudou os doentes com Ébola no Congo em 2018. Recentemente, descobriu-se que tinha curado gatos de uma infeção por coronavírus. Lord Ridley pensa que o Remdesivir funciona melhor se administrado cedo, através de um gotejamento intravenoso – embora tenha graves efeitos secundários.

Na quarta-feira (29 de Abril), o NASDAQ aumentou 3,5% após o Dr. Anthony Fauci, conselheiro de saúde da Casa Branca, ter anunciado que um ensaio de medicamentos Remdesivir, que envolveu cerca de 800 pacientes, mostrou uma notícia bastante boa. Falando numa conferência de imprensa da Casa Branca, o Dr. Fauci disse que os dados do ensaio mostraram um “claro efeito positivo na diminuição do tempo de recuperação” [ver aqui]. Fim de citação.

Um remédio bom para macacos! Gastaram-se somas consideráveis, a farmacêutica Gilead ficou a ganhar e os contribuintes ficaram a pagar. A União Europeia terá gasto um milhar de milhões de euros num remédio bom para macacos! Um espanto. Podemos imaginar que na confusão os estados procuraram todos os meios imagináveis para responder à crise, mesmo os não garantidos. Mas dizer isto é considerar que os Estados com todos os seus Institutos de Ciência se comportam como uma aldeã da minha terra que desenganada dos médicos face a uma doença terminal vai a um curandeiro à procura da cura milagrosa. E morre a seguir.

Com os diabos, exige-se mais do que a crendice, exige-se muito mais das sociedades modernas. Mas este argumento de que compraram na confusão e na desorientação da pandemia não pega: basta ver o que se passou com a cloroquina e o artigo de Lancet. Um artigo que era uma verdadeira vigarice foi publicado pela Lancet, mas com base nesse artigo e partindo dele bloquearam-se imediatamente todos os estudos sobre esta hipótese de tratamento.

Um outro caso: a Ivermectina. Este medicamento ficou sujeito a silêncio absoluto e isto quando se sabe que nos países onde este produto é distribuído como antiparasitário a incidência Covid é menor. Não mereceria isto um estudo aprofundado? Alguém o fez? Que eu saiba naquela altura ninguém. Hoje, exigir-se-ia estudos independentes sobre o tema e digo independentes porque os montantes em jogo são de tal forma importantes que muita coisa pode vergar ao seu peso e isto nada tem a ver com a comunidade dos cientistas mas sim com a ética daqueles que comercializam as suas descobertas, a Grande Indústria Farmacêutica, e o caso dos opiáceos aí está a reavivar-nos a memória.

Em Dezembro de 2020 o jornal de medicina   afirmava (original aqui):

Ivermectina – o medicamento milagroso

A Ivermectina é amplamente utilizada na África subsariana para o tratamento de várias Doenças Tropicais Negligenciadas (DTN) incluindo oncocercose e filariose linfática. A atividade inibitória da ivermectina na replicação de alguns vírus RNA de cadeia única como o vírus do dengue, o vírus Zika ou o vírus da febre amarela está largamente documentada e é de facto considerada como um possível medicamento para a SRA-CoV-2 [43]. De facto, ao inibir a importação nuclear mediada por IMPa/ß1, a ivermectina pode reduzir a carga viral da SRA-CoV-2 [44]. Dois ensaios clínicos recentes de ivermectina-doxycycline (n=60) VS Hydroxy chloroquine-Azithromycin (n=56) e ivermectina (n=173) VS padrão de cuidados (n=107) encontraram um melhor sucesso no alívio dos sintomas, uma redução da duração da recuperação e uma menor mortalidade no grupo tratado com ivermectina [45,46]. No entanto, um relatório farmacocinético estimou que as doses rotineiramente utilizadas para o controlo de doenças parasitárias são menos suscetíveis de levar à inibição doSARS-CoV-2 [47]. Esperam-se os resultados de grandes ensaios clínicos em curso controlados e aleatorizados em curso para compreender melhor o possível efeito da ivermectina de rotina na SSA. Em 2019, cerca de 212 milhões de pessoas foram tratadas com ivermectina em África e principalmente em zonas rurais onde o vírus menos se espalhou” Fim da citação.

Por seu lado aqui temos um gráfico da John Hopkins, publicado por KBirb no Twitter em 27 Ago 2021 , baseado nos dados do estudo sobre Ivermectina, assinado por Hisaya Tanioka, Sayaka Tanioka e Kimitaka Kaga e datado de 26 de Março de 2021 (original aqui). É um gráfico altamente perturbador:

 

Face a este gráfico, Paul Craigs Roberts comenta no seu blog da seguinte forma: “I suppose Fauci will say Ivermectin only works for blacks”.

Vejamos o que nos dizem Hisaya Tanioka, Sayaka Tanioka e Kimitaka Kaga no seu estudo sobre Ivermectina de 26 de Março de 2021 (acima citado), – os autores avisam no início do seu estudo: “Este artigo é uma pré-impressão e ainda não foi revisto por pares … Relata novas investigações médicas que ainda não foram avaliadas e, por isso, não devem ser utilizadas para orientar a prática clínica.”-. De acordo com o estudo, 31 países (marcados a azul no gráfico acima) tiveram acesso regular à Ivermectina. Os outros não o tiveram ou não o fizeram. Uma diferença dramática. A começar pelas mortes diárias/100k. Eis os resultados apresentados:

Os resultados da oncocercose endémica de 31 países (grupo Ivermectin) e dos 22 países não endémicos (grupo não Ivermectin) são apresentados no quadro abaixo. A morbilidade e a mortalidade foram estatisticamente menos significativas no grupo da ivermectina. A população, a taxa de recuperação e a taxa de mortalidade não foram diferenças estatisticamente significativas entre eles. A esperança média de vida foi estatisticamente significativamente elevada no grupo não-Ivermectina”.

Dizem-nos estes autores em jeito de conclusão:

É importante verificar o efeito das intervenções de ivermectina sobre as variações de morbilidade e mortalidade e a letalidade viral associada. A ivermectina é um medicamento antiparasitário aprovado que é utilizado para tratar várias doenças tropicais negligenciadas, incluindo oncocercose, helmintose e sarna. Para estas indicações, a ivermectina tem sido amplamente utilizada e tem demonstrado um excelente perfil de segurança.

Este estudo epidemiológico em África revela que a morbilidade e mortalidade nos países endémicos da oncocercose (grupo Ivermectina) são estatisticamente inferiores aos dos países não endémicos (grupo não Ivermectina). (…)

Alguns investigadores dizem que a curta esperança de vida e o facto de 3% da população ter mais de 65 anos pode ser uma razão para a COVID-19 não explodir em infeções em África. A idade média da esperança de vida nos países epidémicos é de 60,7 anos e de 66,4 anos nos países não epidémicos. Contudo, os países com uma esperança média de vida mais curta têm circunstâncias médicas piores do que os países com uma esperança média de vida mais longa. Como resultado, os países epidémicos têm uma mortalidade infantil mais elevada e uma esperança média de vida mais baixa. E mais, se esta diferença for um dos fatores do impacto, então o facto de não haver estatisticamente nenhuma diferença na taxa de recuperação e na taxa de mortalidade entre os dois grupos mostra uma discrepância. Tendo isto em conta, a mortalidade é menor nos países tratados com ivermectina do que nos países não tratados. A taxa de recuperação e a taxa de mortalidade podem ser melhoradas de acordo com o número de testes COVID-19. Estes resultados implicam que a ivermectina atuará sobre a SRA-CoV-2, e evitará a deterioração dos doentes. Os nossos resultados irão apoiar os do estudo de Mohammad et al. [original aqui]. (Nota de tradutor: este estudo de Mohammad et al. é de 2 de Dezembro de 2020)

Por outro lado, a Autoridade Reguladora dos Produtos de Saúde da África do Sul (SAHPRA) deu luz verde para o uso controlado de Ivermectina para seres humanos em 27 de Janeiro de 2021 [12]. Desde então, o número de novas infeções por COVID-19 na África do Sul tem vindo a diminuir.

Em conclusão, nos países onde a ivermectina é distribuída e utilizada por todas as áreas, sugere levar a uma redução da mortalidade, para acelerar a recuperação dos doentes e, para evitar a morte. E este estudo analítico irá sugerir que o tratamento precoce com ivermectina pode acelerar a recuperação e prevenir o agravamento dos sintomas em doentes com doença ligeira. Estes resultados podem ser eficazmente traduzidos em terapias para a SARS-CoV-2 (COVID-19).” Fim de citação.

 

De nada disto se terá ouvido falar em Portugal. Sobre a disponibilidade de Ivermectina faça ainda uma experiência, arranje uma receita médica e procure uma farmácia para a “aviar”. Ficará espantado com o período longo para fazer o preparado. Alternativamente procure apenas saber o preço, retenha-o na memória e faça a mesma pergunta um mês depois. Confronte os dois preços. Verificará que o preço sobe, sobe. E se a minha hipótese se confirmar, resta a pergunta: sobe porquê? Pense-se nisso.

Tudo isto leva-nos a perguntar:_ se a Ivermectina passou a ser tema “proibido” em Portugal e não havendo censura, sendo nós um país livre, de onde vem então a causa deste silêncio em torno da Ivermectina?. Da comunidade científica de certeza que não é, não, a sua guerra é outra, é a de encontrar remédios não convencionais para o tratamento à Covid 19 mas a pergunta mantém-se de pé: quem impõe então o silêncio em torno da Ivermectina. Possivelmente este silêncio resulta das múltiplas ligações da BIG PHARMA. Não vejo outra explicação.

Tudo isto representa lenha a alimentar o negacionismo relativamente às vacinas e a única forma de o combater é uma política ativa de esclarecimento público e não uma posição semelhante mas de sentido simétrico à de Robert Malone, composta não de explicações mas de simples afirmações e constantemente modificadas sem qualquer explicação. Racionalmente apresentada. Curiosamente num processo que envolveu a FDA contra uma associação de médicos independentes e relativamente à publicação dos dados da vacina Pfizer, que foi agora decidido e em que a FDA perdeu, diz-nos Mark T. Pittman, juiz de Northern District of Texas Fort Worth Division, em 6 de Janeiro de 2021:

Um Governo transparente é uma questão fundamentalmente para os americanos” – não é uma questão republicana nem democrata. Como escreveu James Madison, “[um] Governo popular, sem informação popular, ou sem os meios de a adquirir, não passa de um Prólogo a uma Farsa ou a uma Tragédia; ou, talvez, de ambas as coisas. O conhecimento dominará sempre a ignorância: e um povo que pretende ser o seu próprio Governador, deve armar-se com o poder que lhe confere o conhecimento ” John F. Kennedy reconheceu igualmente que “uma nação que tem medo de deixar o seu povo julgar o que é verdade e o que é falso num mercado aberto é uma nação que tem medo do seu povo”. E é particularmente apropriada neste caso, a posição de John McCain que corretamente observou que ” o excessivo sigilo administrativo… alimenta teorias de conspiração e reduz a confiança do público no governo“. Fim de citação. (Original aqui )

Uma lição que todos devemos ter bem presente se não quisermos que os negacionismos e os trumpismos, de direita ou de esquerda, campeiem nesta crise pandémica, com todos os perigosos efeitos civilizacionais que os seus comportamentos nos podem criar, a todos nós. Pense-se nisto.

 

3. A desonestidade à solta no mundo da Grande Indústria Farmacêutica [1]

Dir-me-ão que a análise até aqui feita não pode sustentar a afirmação de desonestidade da BIG PHARMA, ou seja, não pode servir de base. Admitamos que tem mais a ver com as autoridades políticas dos países utilizadores de vacinas do que propriamente com a BIG Pharma, tem mais a ver com a ausência de transparência das autoridades de saúde pública dos países no que se refere à saúde pública. Isso é verdade, mas a essa ausência de política de saúde publica está ligada a ganância da BIG Parma. Aceitemos então esta crítica como bem fundada e aceitemo-la com toda a franqueza, com a melhor das intenções. Mas para falar da ganância e desonestidade da BIG Farma, a história está cheia de exemplos. O último é dado pela justiça americana que aplicou em junho de 2021 multas à BIG PHARMA na casa dos 26 mil milhões de dólares [2], penalizações estas ligadas à crise os opiáceos em que a BIG PHARMA se envolveu, número este que poderá ainda crescer com outros processos em curso [3]. Quanto à crise dos opiáceos diz-nos o governo americano:

O que é a Epidemia de Opiáceos dos EUA? (original aqui)

ENCONTRAR O TRATAMENTO

– No final dos anos 90, as empresas farmacêuticas asseguraram à comunidade médica que os pacientes não se viciariam em analgésicos opiáceos e os prestadores de cuidados de saúde começaram a prescrevê-los a um ritmo mais elevado.

– O aumento da prescrição de medicamentos opiáceos levou a uma má utilização generalizada tanto de opiáceos com ou sem receita médica, antes de se tornar claro que estes medicamentos poderiam de facto ser altamente viciantes.

– Em 2017 o HHS declarou uma emergência de saúde pública e anunciou uma estratégia de 5 pontos para combater a crise dos opiáceos.

Compreender a Crise dos Opiáceos

Crise de Opiáceos

As consequências devastadoras da epidemia de opiáceos incluem o aumento do uso indevido de opiáceos e a verificação de overdoses relacionadas com essa utilização, bem como o aumento da incidência de recém-nascidos com síndrome de abstinência devido ao uso e uso indevido de opiáceos durante a gravidez.

Overdose de opiáceos

As overdoses de opiáceos foram responsáveis por mais de 42.000 mortes em 2016, mais do que em qualquer ano anterior registado. Estima-se que 40% das mortes por overdose de opiáceos envolveram um opiáceo receitado.

(…)

Conteúdo revisto pela última vez em 27 de Outubro de 2021.” Fim de citação

Em 30 julho de 2019, sobre esta matéria escrevia Zachary Siegel no The New Republic um artigo intitulado “A crise dos opiáceos envolve mais do que ganância empresarial” (original aqui) onde se fala exatamente da desonestidade da BIG PHARMA:

“Novos documentos mostram que a Big Pharma não é a única culpada quando se trata de agarrar as pessoas a drogas viciantes.

Spencer Platt/Getty Images

 

“Continuam a comer tal como se fossem Doritos. Vamos fazer mais”.

“É como se estas pessoas estejam adictas a estas coisas ou a coisas semelhantes. Oh, espera, as pessoas são…”

Estas linhas são de e-mails enviados entre fabricantes e distribuidores de opiáceos, recentemente analisadas por procuradores-gerais que processaram a Big Pharma pelo seu papel na criação de uma enorme onda de mortes por overdose. (…) estes e-mails parecem mostrar que a Big Pharma sabia que uma parte significativa do seu produto aterrava na rua, alimentando o vício. No entanto, continuavam a enviar quantidades obscenas para cidades rurais em toda a América, criando ainda mais procura.

(…)

O que a crise dos opiáceos ilustra não é que são poucas as maçãs podres na indústria farmacêutica, mas que todo o sistema de saúde do país é impulsionado pelo lucro à custa da saúde pública e da segurança pública. Os fabricantes de medicamentos, cadeias de farmácias, distribuidores de medicamentos e companhias de seguros enriqueceram enquanto as pessoas, especialmente as que desceram a escada do rendimento, sofriam – e a DEA, por negligência ou incompetência ou por uma mistura de ambas as coisas, viu tudo isto a acontecer.

[Ora] os opiáceos, […] são, teoricamente, substâncias rigorosamente controladas que passam por um conjunto vertiginoso de atores e reguladores.

(…)

Enquanto os políticos têm estado a alimentar a ganância desmesurada e a imprudência da Big Pharma e a tirar partido disso, tem-se dado muito pouca atenção à DEA [Drug Enforcement Administration]. Os Procuradores-gerais que processaram recentemente a Big Pharma desenterraram uma base de dados que tanto as grandes empresas como o governo – cada um pelos seus próprios interesses – procuraram manter selada, chamada Sistema de Automatização de Relatórios e Ordens Consolidadas (ARCOS). Trata-se de um mamute em termos de tamanho e granular em termos de detalhes, a ARCOS rastreia as remessas de cada substância controlada, desde a empresa que a fabricou, à empresa que a expediu, até à farmácia que a recebeu. É o atlas mundial de como a crise dos opiáceos começou.

(…)

Penso que esta [base de dados] nos mostra à luz do dia o que todos nós já sabíamos”, diz Corey Davis, advogado e especialista em saúde pública da Rede de Direito de Saúde Pública. “Isto não foi apenas incompetência por parte da DEA e do Departamento de Justiça, foi um fracasso consciente e intencional naquilo que a maioria das pessoas pensa ser o seu trabalho“. Fim de citação.

Creio pois estarmos conversados no que diz respeito à honestidade em geral da BIG PHARMA, o que não exclui a existência de casos particulares de dedicação ao bem público. Simplesmente é nestes grandes operadores que os Estados modernos delegam a resolução dos problemas de saúde pública, entre os quais está o problema das vacinas.

Mas a questão é mais geral, pois toda esta dependência dos mercados acompanhada pelo desmantelamento de muitas das estruturas estatais tem por detrás, ou é mesmo a expressão de um problema de falência das sociedades modernas, um problema civilizacional, um problema que se tem vindo a aprofundar desde o final dos anos 70 com o modelo neoliberal seguido quase à escala mundial. Uma dinâmica social bem exemplificada pela situação americana das últimas décadas, onde democratas e republicanos se têm confundido nas políticas económicas e sociais praticadas. Talvez se distingam nos lóbis onde dominam, uma espécie de divisão de interesses e de ganhos, o lóbi das armas para uns, o lóbi das drogas para outros. É assim que um amigo meu de longa data e bom conhecedor da realidade americana caracteriza a sociedade americana. E esta falência da sociedade como um todo é bem ilustrada pela crise dos opiáceos nos Estados Unidos, tanto na forma como a crise foi criada neste país como pela forma em que este país se mostra incapaz de responder à resolução dos problemas criados e não é só por uma questão de dinheiro, é muito mais do que isso.

As sociedades modernas têm-se mostrado desarmadas em termos de respostas públicas tanto face à crise económica e social que eclodiu e atravessa as sociedades evoluídas desde 2008 como quando se mostram aos ziguezagues face à pandemia. Diremos que é naturalmente assim quando se tem defendido o Estado mínimo, e ainda agora, embora mal se ouçam, mas já se vislumbram os arautos da austeridade a quererem cobrar-se das despesas feitas com a crise pandémica, assinalando ainda ao longe e de novo com a bandeira da austeridade com que sacrificaram a Europa desde 2010.

E o que aqui dizemos pode facilmente ser exemplificado com a crise dos opiáceos num Estado moderno, os Estados Unidos, onde não se sabe ainda como vai ser aplicado o dinheiro a ser pago pelas empresas da indústria farmacêutica como compensação da tragédia que fortemente ajudaram a criar e de que os números acima são bem ilustrativos. O que temos pela frente são os Estados modernos desarmados perante a ganância dos grandes impérios empresariais. A crise pandémica mostra-o à evidência e a crise dos opiáceos mostra-o até ao nível da repugnância. E para exemplificar o que se afirma no presente texto tomaremos como referência a tragédia da crise dos opiáceos, e desta falar-nos-ão os 4 textos que iremos a seguir publicar.

Rastrear a crise dos opiáceos nos EUA até às suas raízes, por Sarah DeWeerdt (Setembro de 2019)

Distribuidores de drogas e J.&J. têm de pagar $26 mil milhões para pôr fim a processos judiciais aobre opiáceos, por Jan Hoffman (Julho de 2021)

Será que o dinheiro do Acordo sobre Opiáceos ajudará realmente as pessoas que precisam dele, por Molly Osberg (Janeiro de 2022)

O caso de uma opção pública para a indústria farmacêutica, por Dana Brown e Isaiah Poole (Setembro de 2019)


 

Notas

[1] A título ilustrativo deste tema veja-se a série Dopesick . Dizem-nos que “Dopesick” é uma nova série que conta a história real da crise dos opiáceos na América, crise esta de que aqui falamos resumidamente e que a conta ponto por ponto.

[2] Sobre o recente acordo envolvendo apenas algumas entidades da BIG PHARNM diz-nos um relatório oficial: “ Na quarta-feira, 21 de Julho de 2021, National Prescription Opiate Litigation MDL Plaintiffs’ Executive Committee,, vários Procuradores-Gerais dos estados  e quatro grandes arguidos anunciaram um acordo sobre os termos dos acordos propostos a nível nacional para resolver todos os litígios de Opiáceos apresentados pelos estados e subdivisões políticas locais contra os três maiores distribuidores farmacêuticos: McKesson, Cardinal Health e AmerisourceBergen (“Distribuidores”), e o fabricante Janssen Pharmaceuticals, Inc. e a sua empresa-mãe Johnson & Johnson (colectivamente, “J&J”).  Estes acordos, se aceites e executados, fornecerão fundos substanciais aos estados e subdivisões para a redução da epidemia de Opiáceos em todo o país e imporão mudanças transformadoras na forma como os réus conduzem as suas atividades farmacêuticas”. (original aqui)

[3] Sobre o acordo referido na nota anterior, diz-nos a empresa Johnson & Johnson:

“Reconhecemos que a crise dos opiáceos é uma questão de saúde pública tremendamente complexa, e temos uma profunda simpatia por todos os afetados. Este acordo apoiará diretamente os esforços estatais e locais para fazer progressos significativos na abordagem da crise dos opiáceos nos Estados Unidos”, disse Michael Ullmann, Vice-Presidente Executivo, Conselheiro Geral, Johnson & Johnson.

As ações da Empresa relacionadas com a comercialização e promoção de medicamentos opiáceos de prescrição importante foram apropriadas e responsáveis. DURAGESIC®, NUCYNTA® e NUCYNTA® ER representaram menos de um por cento do total de receitas de opiáceos nos Estados Unidos desde o seu lançamento. Este acordo de acordo nacional foi concebido para resolver a grande maioria das reclamações baseadas em litígios relativos às vendas anteriores de medicamentos opiáceos receitados pela Companhia. Não se trata de uma admissão de qualquer responsabilidade ou ato ilícito e a Empresa continuará a defender-se contra qualquer litígio que o acordo final não resolver. A Empresa já não vende medicamentos opiáceos sujeitos a receita médica nos Estados Unidos, como parte dos nossos esforços contínuos para nos concentrarmos na inovação transformacional e em servir as necessidades não satisfeitas dos pacientes” .Fim de citação.(original aqui) .

 

 

 

 

 

 

 

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