Brasília (DF) 26/04/2023 Presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco, fez a leitura do requerimento que pede a instalação da CPI mista para investigar as invasões ocorridas em 8 de janeiro Foto Lula Marques/ Agência Brasil.
28 de Abril de 2023
Olá, o terceiro turno ganha forças com novas CPIs e resta a Lula governar de fora para dentro.
.Ninguém sabe como termina. Se o objetivo da CNN com o vazamento dos vídeos do dia 8 de janeiro era fazer a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) sair do papel, o plano deu certo. A aposta da oposição é arrastar o governo para o olho do furacão, apresentando evidências do envolvimento de pessoas de confiança de Lula com os invasores da Esplanada. Com isso, o bolsonarismo almeja fazer o governo compartilhar a responsabilidade pelos atos golpistas e, de lambuja, trazer numa bandeja a cabeça de mais um ministro, de preferência Flávio Dino. Nesse cenário, o esforço do novo ministro do GSI, Ricardo Cappelli, em defender a conduta do general Gonçalves Dias só joga mais água no moinho da direita. Mas a política brasileira costuma escrever certo por linhas tortas. Com os vídeos vazados, o bolsonarismo conseguiu alavancar audiência nas redes sociais, mas não foi capaz de furar sua bolha. Além do mais, é muito improvável discutir o 8 de janeiro sem tocar no nome de Jair Messias. O voo de galinha terminou com uma semana desfavorável para a família Bolsonaro, com o depoimento do capitão na PF, culpando a morfina por seus devaneios golpistas, e as novas revelações do envolvimento de Michelle no esquema das joias sauditas, além da constatação do MPF que houve crime no episódio. O que lembra a oposição que, apesar da CPMI, os inquéritos da PF e a ação do STF são um contraponto permanente a qualquer tentativa de isentar o bolsonarismo das responsabilidades pelo 8 de janeiro. A base governista no Congresso também entendeu que quem deve temer as investigações são os golpistas e ajudou a aprovar a instalação da CPMI com folga na última quarta (26). Com isso, é provável que o partido de Bolsonaro fique escanteado e o governo obtenha maioria dentro da Comissão, o que não evitará que a CPMI vire um circo e atrapalhe a aprovação de matérias importantes no Congresso. Mas há um outro fator decisivo: quem também tem a perder são as forças armadas, envolvidas até o pescoço no ensaio de 8 de janeiro. E se o governo até agora poupou alguns oficiais e até deve manter o GSI sob comando dos militares, pode ser que a guerra dentro do Congresso altere este quadro, a começar por trazer para a roda o nome do general Heleno.
.A volta do malandro. Se até aqui, o ritmo da conjuntura política era dado pelo STF e pelo Planalto, as últimas duas semanas colocaram o Congresso de volta ao tabuleiro e, principalmente, trouxeram Arthur Lira para o centro dos holofotes e das tramas. Com uma mão, o coronel alagoano agradou o governo e recolocou a urgência da PL das Fake News, mas com a outra obrigou o governo a recuar nas mudanças do Marco do Saneamento e ainda colocou em pauta uma CPI do MST, claramente para dar palco para os ruralistas, além de outra para as Lojas Americanas, que pode ser um balcão de negócios para extorquir empresários. Com a bola debaixo do braço, Lira sabe que as CPIs podem reduzir o ritmo dos projetos estratégicos do governo e mira nos cargos ainda não nomeados do segundo escalão para baixo no Planalto, além de marcar pontos na sua disputa pessoal contra Renan Calheiros. Mas, pior: um modelo de análise da Quaest demonstrou que Lira, de fato, entrega o que promete e, sem ele, o governo arrancaria bem menos votos na Câmara. A dependência da capacidade de articulação de Lira pode se agravar quando o tema do arcabouço fiscal for ao plenário, afinal, além dos sinais da oposição de que pode mudar a proposta, até deputados do PT preparam emendas ao projeto. E, enquanto as CPIs ganham a cena, pouco se fala da luta da equipe econômica para dobrar a intransigência sem fim de Campos Neto e reduzir a taxa básica de juros.
.Procurando o tom. Lula está convicto que a reconstrução do país passa pela reinserção no sistema internacional. Em quatro meses de governo, foram dezesseis dias no exterior e sete países visitados. As pautas combinam acordos bilaterais, uma aproximação inédita do bloco sino-russo e o ativismo em torno da paz. A ideia é que cada viagem seja uma visita de trabalho, com o acompanhamento de ministros que negociam os termos da cooperação em diferentes áreas. No caso de Portugal, a visita rendeu treze acordos, e na Espanha, mais três, abrangendo áreas como migração, ciência e tecnologia, turismo, comunicação, saúde, trabalho e educação. Até aqui a estratégia do governo parece bem-sucedida, com destaque para a “economia verde”, que obrigou os Estados Unidos a investirem no Fundo Amazônia, e com os avanços na discussão com empresários europeus para investimentos em hidrogênio verde. Mas, se os resultados da política bilateral serão sentidos a médio e longo prazo, o que fica em primeiro plano são os comentários de Lula sobre a guerra na Ucrânia. Neste quesito, o imbróglio continua sendo achar o tom certo para tratar do tema. O presidente tem adotado um tom pragmático, falando em paz e priorizando as negociações para solucionar o conflito sem entrar no mérito de discutir responsáveis ou culpados. E a estratégia do Brasil ganhou corpo com a entrada da China nas negociações de paz e a já agendada visita do assessor especial do governo brasileiro, Celso Amorim, à Ucrânia. O problema é que, num cenário internacional polarizado, a manobra não agrada a todos, ainda mais quando Lula alfineta os Estados Unidos e sua hegemonia financeira internacional ao apostar no Banco dos Brics. Por fim, mesmo concentrado no oriente e na Europa, o discurso de paz do Brasil também colhe frutos na América Latina agora que Juan Guaidó saiu fugido para Miami e as relações entre Colômbia e Venezuela se tornaram mais amigáveis.
.Ponto Final: nossas recomendações.
.Extração de lítio: dá para ser sustentável? Vídeo da agência DW discute os efeitos ambientais e sociais do novo “ouro”, o lítio usado em baterias de smartphones e carros.
.Noites em porões, almoço na caridade. No Repórter Brasil, as violações trabalhistas aumentaram depois da reforma de Michel Temer e, mesmo depois das denúncias, seguem ocorrendo na serra gaúcha.
.Três vezes suspeito, três vezes inocentado. Na Piauí, a luta de um educador negro preso e acusado apenas com base em uma foto.
.Como se constrói um ministro do STF. Na Agência Pública, os bastidores da escolha de um ministro do STF.
.A política radical de Nina Simone. A Jacobin lembra os vinte anos da morte de Nina Simone, recuperando sua militância socialista.
.Minha perna, minha classe. Documentário conta a trajetória do líder sindical e camponês Manoel da Conceição, perseguido pela ditadura e fundador da CUT e do PT. Disponível integralmente no Youtube.
. O Recôncavo é um quilombo. O escritor Itamar Vieira Junior fala de seu novo livro para o podcast da revista QuatroCincoUm.
Ponto é editado por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.
Edição: Rodrigo Durão Coelho