Selecção e tradução por Júlio Marques Mota
O escândalo da taxa manipulada pelo banco Barclay’s mostrou uma vez mais um mundo onde homens e mulheres com muito pouca formação e nenhuma moral se podem tornar rapidamente muito ricos.
O patrão do Barclays Bob Diamond. Photograph: Dylan Martinez/Reuters
O banco de investimento é um embuste organizado que está a ser disfarçado como sendo um banco de negócios. Este é caracterizado por endémicos conflitos de interesses, por um comportamento amoral sistémico e por uma ganância extrema. Muitas das suas figuras principais devem ser punidas com penas de prisão ou devem cair em desgraça – e assim teria sido se os reguladores britânicos não tivessem sido dominados desde há bastante tempo pela doutrina da regulação mínima “light touch” e se não tivesse havido um grave corte no orçamento do Serious Fraud Office’s ordenado pelo ministro Osborne. Trata-se de um imposto sobre a criação de riqueza e de um inimigo contra o comportamento honesto – e é a besta que esta a devorar o capitalismo britânico.
Os 290 milhões de penalização aplicados ao Barclays pela sua manipulação na determinação das taxas de juro no mercado interbancário, a Libor, é um momento decisivo. Não apenas para o Barclays, mas para todos os bancos com os quais ele também conspirara. O Barclays teve a sagacidade de ser o primeiro a aceitar tornar claro – o primeiro de muitos bancos a sofrer o opróbrio político e moral por ilicitamente aumentar os seus lucros. Ele também estava a tentar proteger-se do “prejuízo de má reputação” – não querendo que a avaliação feita pelos outros bancos sobre a sua própria credibilidade se tornasse pública.
Tendo em conta o que nós agora sabemos isto bem parece ridículo. Mas, entre o Outono de 2007 e a Primavera de 2009, o Barclays estava a lutar pela sua sobrevivência como um banco independente. Tinha a informação de que os outros bancos tinham muitas dúvidas sobre a sua posição de crédito, O banco Barclays podia ter acabado por ser propriedade do contribuinte britânico, tal como o RBS e o Lloyds.
Como consta dos relatórios da FSA, no Barclays, os departamento de economia e de negócios com as grandes empresas estavam profundamente conscientes desses riscos e estavam ansiosamente a fazer para que estes riscos fossem evitados. É inacreditável que o topo do Barclays não soubesse que medidas tomar para o salvar . Eles tinham que mentir sobre as taxas que o Barclays estava a pagar no mercado interbancário para poder pedir dinheiro emprestado.
Isto fazia-se facilmente e esta prática até se tornou muito habitual. A taxa de juro do mercado interbancário, a Libor, é definida diariamente pelas 11 horas da manhã em todas as principais moedas de Londres em que aí se empresta e se levanta dinheiro. Cada grande banco informa qual é a taxa de juros que está disposto a pagar, informação enviada à British Bankers’ Association e a média destas taxas torna-se a taxa de referência para a maioria dos empréstimos e contratos financeiros em todo o mundo. Por exemplo, haverá qualquer coisa como 554 milhões de milhões em contratos sobre produtos derivados cuja taxa de juro está ligada à Libor – trata-se de produtos fabricados, cuja suposta finalidade seria a de protegerem estes produtos contra o risco de alterações inesperadas na taxa de juro, num mundo de taxas de câmbio flutuantes e de livre circulação de capitais.
Na verdade, não há nenhuma maneira de conseguir que estes instrumentos possam estar segurados contra os largos movimentos do sistema. Alguns bancos tem estado a perder muito tornando-se então o elo mais fraco no sistema que, numa situação extrema, têm que ser socorridos pelo contribuinte. Os produtos derivados devem ser considerados economicamente como uma criação sem qualquer utilidade e cuja facilidade de manipulação nos mercados opacos torna os bancos de investimento ricos – enquanto para nós trata-se de uma questão de sorte .
Durante os últimos anos, mais e mais luz tem sido lançada sobre como é que os bancos lucram quando estão a tomar posições a descoberto por conta própria, no chamado “proprietary trading” – tomada de posições sobre produtos derivados , enquanto outros departamentos do banco tomam posição como compradores e vendedores desses mesmos produtos. Em primeiro lugar, eles podem tomar posições em grande escala porque são enormes bancos com os seus depósitos efectivamente garantidos pelo contribuinte. Em seguida, eles manipulam a taxa de juro de referência em que se baseia o preço de muitos derivados, o que se tornou mais fácil ainda, porque são muitos os produtos derivados feitos sob medida, negociados portanto fora da bolsa. Isto significa que os mercados que sejam profunda e seguramente não-manipuláveis são difíceis de construir; também é mais fácil para os produtos derivados serem um instrumento nos mecanismos de evasão fiscal. E por fim, como o “Fabulous” Fabrice Tourre do banco Goldman Sachs revelou, os bancos manipulam activamente quer os compradores quer os vendedores. Então, eles conhecem a trajectória da evolução e as mudanças que se irão verificar nos preços hora a hora.
Os directores têm poucos incentivos para gerir adequadamente uma actividade como esta porque os seus próprio bónus extravagantes dependem do seu sucesso, do seu volume de actividade. Mesmo se eles estivessem interessados em insistir na prática de um comportamento adequado, de tal modo que uma grande parte da acção se realiza até mesmo durante horas– assim eles têm que dar uma brutal discrição para as equipes que trabalham nas salas de mercados. Os dirigentes possivelmente não podem monitorizar as suas posições em tempo real ou em seguida não podem adivinhar as razões porque foram tomadas – a razão pela qual os traders desonestos dos bancos podem perder milhares de milhões como aconteceu recentemente no JP Morgan em Londres.