SOBRE OS LEOPARDOS QUE QUEREM BEM SERVIR BRUXELAS – DA FRANÇA, FALEMOS ENTÃO DA POLÍTICA DE HOLLANDE. – A SUBMISSÃO AO PATRONATO FRANCÊS, MEDEF, NÃO É UMA SOLUÇÃO, A FRANÇA TEM NECESSIDADE DE UMA MUDANÇA DE DIRECÇÃO. – LES ÉCONOMISTES ATTERRÉS

 

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 Selecção e tradução por Júlio Marques Mota

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15. A submissão ao patronato francês, MEDEF, não é uma solução, a França tem necessidade de uma mudança de direcção.

Leopardo - XXX

Les Économistes Atterrés, Setembro de 2014

Em meados de 2014, a economia francesa está numa inclinação muito perigosa. O crescimento, nulo desde há um ano, acompanha-se de um aumento sem fim do desemprego, de uma desaceleração dos preços, numa palavra, está perante um risco crescente de deflação. Em vez tomar consciência destes resultados catastróficos e do malogro da via seguida, François Hollande escolheu acelerar na mesma direcção, sujeitando-se cada vez mais às exigências do Medef.

Desde há dois anos, o Medef lançou-se numa campanha agressiva para obter a co-gestão do Estado. Os temas desta campanha são martelados directamente pelo seu porta-voz e por numerosos meios de comunicação social que controla ou que influencia. O principal da mensagem com que nos martelam é simples: só as empresas privadas são produtivas; só os dirigentes das empresas criam emprego; só as empresas sabem o que é necessário produzir; só as empresas competitivas, entendidas como que têm salários e impostos baixos, o podem fazer. É delas que depende o nosso futuro e tudo deve ser colocado ao seu serviço. Como se os assalariados do sector  público: os professores, os enfermeiros, os empregados de EDF ou RATP não tenham nenhuma utilidade nem nenhuma produtividade. Como se com as empresas, não são também  os assalariados que produzem. Como se não sejam numerosas as empresas que organizam a deslocalização dos seus empregos fora da França. Como se muitas empresas não estejam estreitamente dependentes dos mercados, as quais são asfixiadas pelas políticas de austeridade ou de competitividade. Como se o poder público não tenha a sua palavra a dizer para orientar a produção a fim de, em especial, ter que levar em conta as condicionantes ecológicas.

O Medef reclama uma baixa de 120 mil milhões dos impostos das empresas, o que significaria desmontar e privatizar a Segurança social em proveito  de grupos de companhias de  seguros. O Medef pede que as despesas públicas e sociais diminuem de 100 mil milhões. Mas, ao mesmo tempo, as empresas investem pouco em França, de modo que isto se traduz numa estratégia absurda. Quais serão os mercados para as empresas poderem vender se o consumo estagnar e as despesas públicas caírem?

O trágico seria que esta operação viesse a ser coroada de êxito. Manuel Valls faz-se aplaudir pelo Medef retomando, palavra por palavra, os próprios termos desta campanha. Assim comprometeu-se a satisfazer todas as reivindicações: o trabalho nocturno e o dominical, alterar também a lei das 35 horas, baixar as contribuições sociais, aumentar os limiares sociais. O todo através de determinações governamentais a proibir assim todo e qualquer debate no Parlamento.

Com o motivo deque a sua taxa de margem de lucro  se reduziu (o que é habitual em período de crise), o governo já prometeu 40 mil milhões às empresas sem compromisso ou sem  uma verdadeira contrapartida. Esta gigantesca subvenção pública arrisca-se a levar ainda a que aumentem  os dividendos dos accionistas das empresas de CAC 40, já em alta de 30% sobre um ano (no segundo trimestre 2014) enquanto que o investimento permanece, ele, desesperadamente, invariável.

Não, a empresa não deve ser organizada sobre um modelo feudal, com um proprietário todo poderoso, puncionando os benefícios em proveito dos accionistas. É necessário pelo contrário aumentar as capacidades de intervenção dos assalariados e dos cidadãos nas empresas. Será necessário exclamar “vivam as empresas” e ao mesmo tempo renunciar em pôr em causa a maneira como a finança as gere hoje?

O programa do novo governo fará apenas agravar os problemas da economia francesa. A questão não é a de uma suposta insuficiência da capacidade “de oferta”. A questão é a austeridade na  qual a nossa economia, a exemplo da maior parte das economias europeias, está hoje envolvida. Tínhamos já sublinhado, desde a sua elaboração que o Pacto de Estabilidade da zona euro, é mortífero para todos os países da zona euro, condenados a reduzir a sua procura interna (reduzindo os salários e as despesas públicas e sociais) e a baterem-se uns contra os outros para ganharem quotas de mercado .

Hoje, o BCE, como o FMI (boas-vindas aos últimos achegar !), reconhecem-no: as políticas de austeridade, longe de serem uma solução, são o coração do problema europeu. Devem cessar e imediatamente. Em vez se terem como objectivo a redução das suas despesas públicas ou o seu défice de 4% do PIB (que não é excessivo tendo em conta o seu nível de investimento público e a sua situação conjuntural), a França deveria constituir uma frente na Europa para promover uma nova estratégia, [ uma estratégia para o crescimento ]. Esta passa por uma política de expansão concertada e centrada nos investimentos maciços para a transição ecológica, numa luta sem quartel virada contra a evasão e a optimização fiscal, em medidas fortes para reorientar a actividade bancária e para reduzir a dominação da finança e a especulação, bem como uma redução dos presentes inúteis concedidos às grandes empresas.

Sim, a França, (e a Europa) tem necessidade de reformas estruturais ambiciosas. Mas estas devem atacar as verdadeiras raízes  da crise, em vez de as estar a agravar, pondo em causa o modelo social europeu. Não, não é necessário considerar como objectivo a redução dos serviços públicos ou o poder de compra dos salários e as prestações sociais, que apoiam igualmente a procura . O objectivo, pelo contrário, deve ser o de reduzir os dividendos exorbitantes e a punção que o capitalismo financeiro exerce sobre as empresas.

É urgente empenharmo-nos numa grande viragem para uma sociedade mais democrática, mais séria, mais ecológica, mais igualitária, onde o poder dos cidadãos e dos assalariados seja acrescido . É somente assim que poderão ser postas em prática as transformações essenciais de que a nossa sociedade e as empresas têm necessidade.

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Ver o original em:

http://www.atterres.org/article/la-soumission-au-medef-n%E2%80%99est-pas-une-solution-la-france-besoin-dun-changement-de-cap

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